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4 DE MAIO DE 1989 3525

Entendemos que a proposta de alteração do CDS é vaga e comporta riscos de intolerância que não são compatíveis com a filosofia constitucional que pretendemos verter na revisão a rever.
De facto, o n.º 4 do artigo 46.º proposto pelo CDS continha uma ideia de fidelidade à Constituição, que impunha níveis de identidade excessivamente altos e que poderiam levar àquilo que aconteceu na Alemanha nos anos 50 e 60, em que a argumentação jurídico-constitucional se cifrava, de certa maneira, em opiniões de intolerância, como fosse, por exemplo, o caso da proibição de os radicais virem a exercer funções públicas, como a docência.
Este nível de fidelidade, excessivamente alto, à Constituição, vertido no n.º 4 do artigo 46.º com a fórmula vaga que lhe corresponde, levaria, de certo modo, a uma estrutura de democracia defensiva ou combativa, que não parece compatível com uma ideia de ordem constitucional de valores aberta e, por outro lado, não parece compatível com uma ideia de estrutura de lealdade própria do regime democrático, na acepção plena do seu sentido.
Não faz sentido, portanto, este regime de exigência excessiva de fidelidade à Constituição.
Entendemos também que a proposta do Sr. Deputado Sottomayor Cárdia correspondia a uma visão mais desdramatizada da democracia e da sua relação com os seus potenciais inimigos. Apesar de não termos proposto a retirada da expressão que se referia ao não consentimento de organizações que perfilhassem a ideologia fascista, entendemos que era uma proposta desdramatizada. E faço já, de caminho, uma consideração àquela que o Sr. Deputado Nogueira de Brito acaba de fazer da parte da bancada do CDS: trata-se de uma proposta com uma crença mais tranquila no regime democrático e na sua capacidade de impedir o êxito das lutas encetadas pelos seus próprios inimigos.
Concluindo, o resumo é este: houve um percurso na posição do PSD em relação à proposta do CDS, cuja explicitação está feita e é desnecessário desenvolver, dada até a retirada da própria proposta. Esse percurso assenta na ideia de que a fórmula do CDS, ainda que sendo uma alternativa ao esquema da fórmula actual da Constituição, é excessivamente ampla e exigente, em termos democráticos, para ser aceite.
Nesse sentido, o PSD, tal como fez no âmbito da CERC, começa por situar-se a favor de uma proposta de eliminação do que já se contém na Constituição, sem, contudo poder reflectir sobre a vantagem de manter o inciso que aí se contém, dado o sentido, de certo modo, contraproducente apontado pela bancada do PS, de que, se a expressão já cá está, poderá ser mal interpretado que saia. O que é claro e inequívoco, desde já, é que, se não fosse retirada, a proposta do CDS - diferentemente da opinião que apontámos na CERC - não seria aceite pela bancada do PSD.

A Sr.ª Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Raul Castro.

O Sr. Raul Castro (Indep): - Penso que a situação que, neste momento, se está a viver, que é a retirada da proposta do CDS e a assumpção por parte do CDS da proposta do deputado Sottomayor Cárdia, não vem alterar fundamentalmente aquilo que estava em discussão. Isto porque já na CERC foi discutida a proposta do deputado Sottomayor Cárdia, que, no fundo, se baseia nos mesmos pressupostos que aqui foram defendidos pelo deputado Adriano Moreira, relativamente à proposta do CDS. Ou seja, baseia-se naquela ideia bastante esquisita - que alguns teóricos têm vindo a sustentar - de que não teria sequer existido fascismo em Portugal.
Na realidade, só se atreveria a dizer tal coisa àqueles muitos milhares de portugueses que passaram pelas prisões da PIDE, que foram torturados, presos, perseguidos, impedidos, mesmo, de trabalhar, quem não viveu esse período... Só assim é que se pode hoje desvalorizar o que foram 48 anos de regime fascista no nosso país!
O CDS, pelo menos, quer ao defender a sua proposta quer ao perfilhar (permita-se-me que o diga) aquilo que considero uma insólita proposta do Sr. Deputado Sottomayor Cárdia, teve o mérito de nos dizer claramente o que é que pretende. E o que pretende é, efectivamente, apagar os vestígios do fascismo que constam da Constituição.
Consideramos que essa é uma atitude altamente ofensiva, não só para quem viveu esses 48 anos, mas para os constituintes e para todos aqueles que não perderam a memória do fascismo e que foram vitimas dele.
A eliminação desta fórmula da Constituição significaria, tal como foi salientado pela bancada do PS, que se tratava de um fenómeno hoje já sem relevância, portanto passível de ser eliminado. Mas o fenómeno teve, tem e terá sempre relevância, excepto, naturalmente, para aqueles que querem convencer-nos de que em Portugal nunca houve fascismo.
No entanto, para aqueles que sabem o que ele significa, como repressão violenta, como domínio violento, através de meios repressivos, dos círculos mais conservadores do grande capital monopolista, isto tem sentido, pois liga-se com a vertente antimonopolista que também consta da Constituição. Esses nunca poderão, de forma alguma, admitir que se possa retirar da Constituição aquilo que é uma referência fundamental.
Na realidade, sem o movimento glorioso do 25 de Abril, nem sequer nós, hoje, poderíamos estar aqui a discutir a revisão da Constituição nem ser sequer deputados que pudessem exprimir o diverso leque político que está presente nesta Assembleia. Era então o tempo do partido único, não era o tempo da liberdade, como todos nós nos recordamos.
Por isso, Sr. Presidente e Srs. Deputados, penso que se trata de um problema grave, que não pode ser desligado das suas raízes históricas nem das próprias raízes do regime em que vivemos. Ora, como a proposta do Sr. Deputado Sottomayor Cárdia não altera os dados do problema, isso levar-nos-á necessariamente a votar contra tal proposta.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Sr.ª Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Pedi a palavra antes da intervenção do Sr. Deputado Raul Castro, no sentido de obter...

A Sr.ª Presidente: - Sr. Deputado Nogueira de Brito, peço muita desculpa de o interromper, mas devo dizer-lhe que o Sr. Deputado Raul Castro pediu a palavra enquanto V. Ex.ª interpelava a Mesa.