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4574 I SÉRIE - NÚMERO 92

interpelantes, quer pelo fluir normal dos trabalhos da revisão, que ontem nesta Câmara tiveram feliz epílogo.
Como encarar, de qualquer forma, tão inusual quantidade de interpelações, concentrada em tão curto espaço de tempo?
É por demais evidente que tal facto está em relação directa com o calendário eleitoral que se avizinha, e com a consequente necessidade de «mostrar serviço». Honra seja feita ao CDS que, ciente da solidez das suas alternativas, se dispensa galhardamente nesta desenfreada competição interpelativa à boca dos acontecimentos eleitorais.
Seja-nos permitido afirmar, porém, que esperávamos mais autoconfiança da ganha dos interpelantes, em particular do nosso interpelante de hoje. Esperávamos que dessem livre curso ao descontentamento que tem demonstrado e às negríssimas cores com que têm pintado a acção governativa. Deve haver alguma correspondência entre a crítica política e os mecanismos sancionatórios utilizados, pelo que o mínimo que esperávamos dos senhores era que apresentassem uma moção de censura ao Governo.
Houve mesmo por aí um partido menos timorato que, num assomo de fugaz valentia, nos brindou com o anúncio da dita. A moção nasceu inchada de arreganho político. No dia seguinte já só era uma «moçãozita» e dois dias depois, afinal, acabou por desaparecer discretamente, envolta no manto diáfano da política que o PCP tão saborosamente cultiva. E por aí peregrina, qual alma penada, do comité central para o grupo parlamentar, e do grupo parlamentar para o comité central, à espera de melhores dias. Contentemo-nos pois, com as interpelações.
Como encarar politicamente os desígnios do interpelante, para lá do já anunciado objectivo eleitorista?
Há várias explicações possíveis. Primeira explicação: Tratar-se-á do último esforço do Dr. Jorge Sampaio, nosso distinto colega e secretário-geral do PS, para, com esta interpelação, ser ouvido pelo país, porque realmente, parece que o País não o ouve, e, se o ouve, parece que não o compreende. Não é preciso desmaiar de amor pela cor laranja para perceber tal coisa e chegar a esta conclusão. Escreveu-a à dias o colunista político Miguel Sousa Tavares, insuspeitíssimo de qualquer câmbio com o partido do Governo. Cito as suas palavras no último artigo que publicou no jornal «A Capital»: «Alguém terá dito ao Dr. Jorge Sampaio que ele deveria pôr-se em bicos de pés para ser visto, gritar para ser ouvido. A intenção não terá sido má mas o resultado é confrangedor. Ao ver, há dias, na televisão, o Sr. Dr. Jorge Sampaio no alto de um palanque aos gritos o PS está vivo, perante uma escassa dezena de ouvintes de uma qualquer terriola do interior, tive pena do homem, do político e do chefe de família.»
Palavras terríveis, estas, que pronunciaram maus momentos para o Dr. Sampaio, já descortináveis nos murmúrios de alguns espíritos mais irrequietos do seu partido, de que os jornais se têm feito eco. Fazem lembrar, sem dúvida, comentários dirigidos a um outro secretário-geral do PS, que, zangado com autores de murmúrios idênticos, optou já ir embora, avaliar a redondez do mundo.
É assim razoável confirmar que o secretário-geral do PS aceite o bom fundamento destas críticas e tenha decidido inverter o rumo que pode conduzir tão negativa imagem, trocando legitimamente o referido palanque pela nobre Tribuna desta Assembleia, sem dúvida
muito mais propícia ao discurso de Estado que tem faltado ao Partido Socialista.
Se tal é intenção, saudámo-la, porque estamos certos que com ela ganhará o País e beneficiará o Governo, que poderá finalmente ter do maior (não sei se do principal) partido da Oposição a crítica serena e construtiva que tanta falta faz a qualquer Executivo.
Segunda explicação possível: tratar-se-á de uma tentativa do Sr. Jorge Sampaio de fazer passar a imagem socialista, procurada pela curiosidade dos interessados com o mesmo afã com que Diógenes, de candeia na mão, em pleno dia, procurava um homem virtuoso. Porque, segundo rezam as crónicas, também se não achava a mensagem socialista em lado algum. É o mesmo Miguel Sousa Tavares que escreve «seja na televisão, seja no coreto de uma aldeola, com ou sem óculos de pensador,...»

Protestos do PS.

Srs. Deputados socialistas, aqui há umas semanas atrás, o Sr. Deputado Almeida Santos, fez uma intervenção contundente contra o Governo e contra o Sr. Primeiro-Ministro e louvou-se nessa intervenção de largos estratos de um artigo do Dr. Pulido Valente no jornal «Independente». Eu não tenho o direito de utilizar o mesmo procedimento? Naturalmente que tenho.
Portanto, dizia eu sobre o Dr. Jorge Sampaio: «(...) seja na televisão, seja no coreto de uma aldeola, com ou sem óculos de pensador, de casaco apertado ou desapertado, quando chega a hora de fazer passar a mensagem, o Dr. Jorge Sampaio é simplesmente pungente, a ideia que transparece é que ele não tem nada para dizer e o drama é que não tem mesmo. Não se trata apenas de falta de jeito para fazer passar a mensagem. O problema é que o Dr. Jorge Sampaio - e o PS por ele - não tem, aparentemente, qualquer mensagem para fazer passar.»
Ou seja, começa a ser evidente que ate aos espíritos mais esquadrinhadores e irrequietos se vêem em palpos de aranha para descortinar em que se traduz a excitação com que o actual secretário-geral do PS se anunciou há meses ao país. Mesmo os fiéis mais sequiosos da boa-nova aguardam, expectantes, como se esperassem a vinda do Paracleto que tarda em chegar.
O Dr. Sampaio trouxe à política portuguesa a explosão do verbo, mas trouxe-lhe também o mais abissal vazio de soluções dos últimos anos. Dele se pode dizer com propriedade que tem um razoável input mas tem um péssimo output.
Há, no nosso crer, uma terceira explicação possível para esta interpelação: vamos ter, finalmente, em cima da mesa, com inefável clareza, as propostas alternativas do Partido Socialista às políticas do Governo que tão arduamente esconjura. Porque estão esconjuradas as «vontades» e os chavões que apenas reclamam «mais projecto, mais diálogo, mais participação, mais ideias globais, mais coesão social, mais solidariedade, mais modernidade».
O PS tem de dizer com urgência ao país o que lhe oferece como contraponto à políticas do PSD e do seu Governo. Já chega de vacuidade, porque até aqui as suas propostas não têm passado de uma vaga nebulosa, de um inefável mistério que nenhuma esfinge desvendou ainda.