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258 I SÉRIE-NÚMERO 8

Cruzam-se códigos genéticos em busca de fantásticas combinações.
O poder económico descobriu nas biotecnologias a chave de indústrias e mercados essenciais do século XXI.
A competição, essa não espera porém pelo dia de amanhã. Somos testemunhas por vezes desatentas de uma luta titânica à escala internacional entre as industrias que exploram aplicações das ciências biomédicas e da biotecnologia em domínios como a saúde, a petroquímica, a área agro-alimentar, ou energética. E são muitas e muitas as descobertas que todos os dias se fazem nestes domínios.
Impossível ignorar que os imperativos do comércio acabam por determinar as mais das vezes os campos das pesquisas. Um pequeno número de países desenvolvidos e industrializados concentra hoje os meios de investigação e as unidades industriais. E isso a manter-se agravará as disparidades entre países pobres e ricos e será um factor de perversão dos rumos das pesquisas. Entretanto estas progridem engendrando modificações do ambiente animal e vegetal, alterações somáticas no homem, manipulações em embriões humanos. Entre a luz e as trevas vai nascendo rodeada de mistério a pessoa humana do III milénio.
E em Portugal, Srs. Deputados?
Entre lacunas de uma rota malha legal, a prática singra consumando os seus factos brutos e pesados.
Como refere o bem elaborado relatório da 3.ª Comissão apresentado pelo Sr. Deputado Mário Raposo, comissões de juristas, médicos biólogos, psicólogos e sociólogos nomeados há anos, reuniram dias e meses a fio e produziram volumosos documentos ciosamente arquivados nas gavetas do Sr. Ministro Fernando Nogueira. Depois disso nada.
O Ministro da Justiça nesta matéria transformou-se em ministro do segredo, segredo sobre os projectos preparados em matéria de procriação artificial assistida, segredo em matéria de colheitas, enxertos e transplantações, segredo em matéria de prolongamento artificial da vida, segredo em matéria de limites à experimentação clínica e farmacológica sobre seres humanos, segredo em relação à regulamentação até dos bancos de esperma.

Votes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - As mães de aluguer são proibidas, Sr. Presidente e Srs. Deputados? Silêncio legal! A inseminação tem regras? Mistério profundo! Os bancos de esperma criados na base do Decreto-Lei n.º 319/86 de 25 de Setembro podem funcionar sem ser clandestinamente? Pergunta sem resposta!
A hipocrisia a incoerência e a falta de coragem política, tem impedido sob o segundo Governo do PSD a conversão dos projectos em leis e das leis em realidades. Como consequência - é este o facto - faz-se em Portugal o que se quer, como se quer, quem quer. Sem garantias de cumprimento das recomendações do Conselho da Europa e das regras das Comunidades. Surdamente e sem qualquer transparência.
Os 17 bebés proveta portugueses nasceram e ainda bem que nasceram no berço da mais total obscuridade legal. Aos seus companheiros talvez mais de uma dúzia que este ano ao nascer - e faço votos para que nasçam - espera os quadro similar. As nossas mães hospedeiras são secretas. O Sillicon Valey dos embriões lusitanos pode estar neste momento a ser constituido ali em Paço de Arcos ou no Estoril, que é onde mora o Sr. Ministro da Justiça que S. Ex.ª nem suspeitará.
O projecto do PS vem ajudar a discutir todas estas matérias e só por isso Sr. Presidente e Srs. Deputados mereceria todo mas todo o nosso apreço.
O Grupo Parlamentar Comunista associa-se de pleno aos esforços tendentes à urgente aprovação de uma lei que finalmente institua um conselho nacional de ética para as ciências da vida. Essa lei não obstará a falta de outros instrumentos legais sobre o direito genético, sobre o regime jurídico das transplantações, sobre o conceito legal da morte, sobre o conceito das experimentações em seres humanos, mas será um contributo positivo, colmatará um quadro legal que é uma pouco decente manta de retalhos
A iniciativa é pois oportuna, o debate imprescindível, meritória acima de tudo, a vontade de quebrar o silêncio doentio que em rodeando o tratamento de questões que o projecto do PS suscita e que são sem dúvida decisivas para que desenhemos com segurança os mapas do futuro de todos nós.

Aplausos do PCP

A Sr.ª Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento tem a palavra, o Sr. Deputado Adriano Moreira.

O Sr. Adriano Moreira (CDS): - Sr. Deputado José Magalhães, usando a figura de pedido de esclarecimento, gostaria de acrescentar um comentário e uma pergunta ao discurso - aliás excelente - que acabámos de ouvir sobre estes problemas que procura dar enquadramento legal à feliz e oportuna iniciativa do PS.
Suponho que a nossa geração, a que está a pelo menos uma parte dela no que toca aos tais valores ocidentais que aqui já foram recordados, foi bastante vítima de um enquadramento simultaneamente positivista, relativista e psicanalista. Isso estabeleceu naturalmente uma atmosfera propícia a este desencontro que se verifica dramaticamente entre a ética que se atrasou e a ciência e a técnica que se adiantaram sem limites valorativos.
É justamente a circunstância de provavelmente estarmos num patamar de grande crise da própria humanidade que me leva a fazer um pequeno reparo, um problema desta transcendência e gravidade, não pode ser partidarizado. E não pode ser partidarizado porque - e estou a recordar-me da reunião de Assis que foi convocada pelo Papa João Paulo II onde se reuniram as maiores autoridades espirituais do Mundo - continuamos sem resposta para a maior parte dos problemas aflitivos que os levaram a essa reunião.
Devemos naturalmente queixar-nos de a máquina governativa não andar tão depressa quanto possa, mas sobretudo o que devemos é por em evidência aquilo que a iniciativa do PS em fazer, que é dar voz a problemas que não tem tido uma voz tribunícia porque o nosso saber é muito pouco.
Por isso eu não gostaria que o patrono desta comissão que espero ver instituída - com pormenores em que pode haver divergência de composição - fosse um Jeremias ou um São Paulo. Mas penso que com a unanimidade da Câmara isso não irá acontecer. Vamos constituir essa comissão perfeitamente conscientes da nossa profunda ignorância no que respeita às consequências em que lançámos esta separação da ciência e da técnica em relação à ética e vamos procurar humildemente admitir todos nós que não sabemos e portanto vamos juntar-nos para encontrar alguma resposta para as nossas inquietações.