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2 DE NOVEMBRO DE 1989 259

Para terminar, e só para cumprir o Regimento, pergunto se não concorda que este é, fundamentalmente, o espírito com o qual devemos encarar este problema, evitando todo e qualquer carácter partidarizante em relação a tão momentoso assunto.

A Sr.ª Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães:

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado Adriano Moreira: Creio que as considerações que fez são sobremaneira sensatas e não procurei, na intervenção que apresentei em - nome da bancada comunista, senão traçar os limites da pesquisa que havemos de fazer em torno de temas que são compatíveis com uma pluralidade de visões, desde logo, e que têm uma larga margem de incertezas.
Quis sublinhar isso e também um outro aspecto, que não tem a ver com a relatividade, que é o de sabermos definir, em cada momento, o direito possível face às conquistas da revolução genética. Isto porque o preço a pagar pela inexistência desse direito é a anomia e a possibilidade de livre prática de alguns actos, incluindo o de comércio, que distorcem profundamente aquilo que são valores fundamentais da dignidade da pessoa humana e que, beneficiando alguns, prejudicam seriamente eminentes valores em que constitucionalmente nos reconheceremos todos, mas que exigem protecção legal adequada.
O que nos preocupa neste momento, acima de tudo, é a falta de uma malha legal que dê respostas muito precisas a questões que se colocam no nosso quotidiano. Nesta sociedade concreta em que vivemos há casais estéreis que buscam a fertilização in vitro. Qual é a resposta do legislador, proscrita ou permitida? Isto tem de ter uma resposta absolutamente inequívoca, por todas as razões, quanto mais não seja por uma razão de respeito pela justa expectativa, pela igualdade e por essa possibilidade que alguns têm de ir a Espanha, a Inglaterra ou a outro país qualquer praticar a fertilização in vitro e esses outros que aqui, em Portugal, junto de clínicos competentes, o podem fazer, enquanto a grande massa de cidadãos, desejando o mesmo que os outros, não pode ver realizado esse direito.
O primeiro aspecto que queria realçar é a necessidade de clareza. A incerteza não significa silêncio do legislador!
O segundo aspecto diz respeito à diferença que, obviamente, existe e que nos separa na apreciação das questões.
Por que é que uma comissão, composta por médicos, sociólogos, juristas, homens pertencentes a famílias políticas ou tributários de credos muito diferentes, pôde concluir o seu trabalho, mas não ver transformado em lei o fruto desse mesmo trabalho? Porque o poder político e os poderes públicos, concretamente o Governo, recearam tomar decisões e assumir as que eram propostas. Aliás, devo dizer que, provavelmente, a minha família política discordaria de muitas das decisões propostas por essa comissão que estudou a questão das novas tecnologias. Nós discordaríamos, por exemplo, de soluções que proibissem à mulher não casada a inseminação só pelo facto de não ser casada; discordaríamos de outras soluções como, por exemplo, a proibição da inseminação intratubária e ainda de muitos aspectos, mas concordaríamos com outros. Seria, pois, necessário que em torno do quadro legal se fizesse transparência, que é o que tem faltado.
Como é evidente, associo-me, de pleno, ao maior mérito, que o Sr. Deputado reconheceu, do projecto de lei do PS, que é o de dar voz ao silêncio. E que nesta matéria o silêncio é corripletamente inexplicável; há à nossa volta os bebés-proveta, e a maior interrogação que todos nos podemos fazer é a de saber o que será o homem do século XXI, esse tal homem que pode nascer in vitro e morrer desligando numa máquina e que pode ser concebido fora do útero, talvez com ectogenese. Esse, cujo ideário è cuja psique será totalmente diferente da nossa mas que será homem como nós, será, talvez, para nós - e uso uma palavra que é cara a alguns -, irmão. Ora isto terá consequências e características que não somos ainda capazes de divisar.
Deste modo, o apelo que V. Ex.ª faz será, por parte dá nossa bancada, certamente correspondido.
Não quereríamos, de forma alguma, partidarizar, no mau sentido, esta comissão, mas também não quereríamos que ela fosse expressão da visão de um só partido, da mundividência de uma só família política.

A Sr.ª Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Barbosa da Costa.

O Sr. Barbosa da Costa (PRD): -Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: O homem, ao longo da história, tem desenvolvido enormes esforços no sentido de desvendar os mistérios da Natureza, de resolver questões que se lhe afiguravam absolutamente intangíveis.
Todos nos congratulamos com os progressos das ciências e das técnicas, que penosa e dolorosamente vão contribuindo para um melhor bem-estar da humanidade, para uma melhor, qualidade de vida, para um prolongamento da esperança de vida do homem, enfim, um enorme salto qualitativo que todos, saudamos.
São, naturalmente, bem-vindos os benefícios das revoluções terapêuticas e biológicas. São evidentes e significativas as descobertas que reduziram ao mínimo doenças que fizeram o terror dos nossos antepassados, designadamente a tuberculose e a sífilis, entre outras.
Sobretudo a mortalidade infantil tem sofrido, na Europa Ocidental e na América
do Norte, uma diminuição radical, a que não é alheia a melhor qualidade dos cuidados primários, a generalização das vacinas e as acções preventivas ajustadas.
Infelizmente, razões de ordem vária não têm levado esses efeitos a, outras áreas, onde persistem ainda condições que não prenunciam a mudança de situação para os tempos mais próximos.
Por outro lado, a definição de códigos genéticos, isto é, as leis que presidem à formação da vida, constitui uma dimensão ímpar da revolução biológica, que passa a possibilitar ao homem poderes no domínio da procriação, da hereditariedade e da esterilização.
Não são, contudo, pacíficas as implicações das autênticas revoluções que o processo científico provoca. Resultam consequências de vária ordem, nomeadamente de carácter económico, que não são as mais importantes para a questão que estamos a tratar.
Mais significativos e relevantes são os efeitos sociais e morais daí advenientes. Questões delicadas, como a gestão do óvulo humano em laboratório, fora do corpo materno, contribuem para a transformação do destino das sociedades humanas.