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5 DE JANEIRO DE 1990 993

mento do descontentamento popular, no reforço das frentes de luta social contra a política de direita e nas duas derrotas eleitorais do PSD, designadamente nas recentes eleições autárquicas, estuo na base da remodelação do Governo e da tentativa do PSD e de Cavaco Silva de reganharem um novo fôlego, numa operação condenada ao fracasso face à manutenção da política e dos objectivos essenciais que o Governo prossegue. Quão longe, Srs. Deputados, vai o triunfalismo e o «pico» de Julho de 1987, confirmando-se plenamente as previsões do PCP, feitas logo após os conjunturais resultados eleitorais de então.
Mas a remodelação é significativa também pela forma como se processou, pelo ambiente que a rodeou e pelas substituições que foram efectuadas.
Ministros que tem estado no centro de profundas movimentações e contestação social, alvos de inquéritos parlamentares -alguns dos quais encerrados à pressa pelo PSD-, vêem hoje confirmada, com a sua substituição, a razão e a justeza das lutas travadas pelos mais diversos sectores e pelos partidos da oposição, aqui, na Assembleia da República.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Figuras gradas do Governo e do PSD anunciam o seu distanciamento crítico em relação ao Primeiro-Ministro e presidente do PSD.
Dos mais variados quadrantes, incluindo do interior do próprio PSD, converge a opinião de que esta remodelação não é credível, nao é consistente, tem pés de barro e não se destina nem a modificar a política nem a enfrentar de maneira nova os problemas do País.
E por isso, Srs. Deputados, é legítima a afirmação de que esta remodelação nao responde a qualquer problema e de que não é credível um governo que é incapaz, sequer, de apresentar uma cara nova para tentar dar respostas novas e efectivas aos problemas reais do País.

Aplausos do PCP.

A pergunta que, entretanto, se coloca é se isso seria possível. É que o que está posto em causa não é só a política deste sector, não é a personalidade deste ou daquele ministro mal-amado.
O que está posto na praça pública é a política económica e social global do Governo, é a sua surdez e fuga ao diálogo, a sua prepotência e arrogância.
De facto, a incapacidade do Governo para dar resposta aos grandes problemas nacionais e sociais; a sua total inoperacionalidade quando se trata de enfrentar situações de emergência e de catástrofe, como sucedeu agora com os temporais e as cheias do Douro ao vaie do Tejo, do Alentejo ao Algarve; o agravamento das desigualdades e das assimetrias sociais e inter-regionais, com quebra nos rendimentos reais dos Portugueses; a crescente dependência do País em relação a centros de decisão e interesses externos; o desbaratamento de uma conjuntura económica favorável à promoção do desenvolvimento do País; o confronto com os mais diversos sectores e camadas sociais constituem, em síntese, os traços mais significativos da política do Governo e do PSD.
Mas este primeiro biénio do consulado cavaquista ficará também assinalado por uma grave síndroma de miopia e astigmatismo político: o Sr. Primeiro-Ministro, que já nao tinha visto a greve geral, face a situações claras de falta de transparência, de rigor e de corrupção na actuação de órgãos e responsáveis do Estado e do Governo, só vê cabalas e maquiavélicas conspirações internacionais, erige questões pessoais em assuntos de Estado, o Sr. Primeiro-Ministro também só três dias depois deu pela hecatombe do PSD nas eleições autárquicas.
Não é por isso de estranhar que, seguindo-lhe o vezo, o Sr. Ministro da Administração Interna, agora demitido, e o Governo não tenham visto as cheias do vale do Tejo nem a necessidade de declarar o estado de calamidade pública para aquela região.
Tendo-se eclipsado depois das autárquicas, levados pela enxurrada, o Primeiro-Ministro e o PSD, depois de alguns folhetins de fim-de-semana, reapareceram, agora, com este golpe de asa que é a remodelação.

Mas por mais exorcismes a que o PSD se dedique, a verdade não pode ser escamoteada. O PSD e o Governo partem para este ano de 1990 e para este início de década com a sua política condenada pelas movimentações e protestos dos mais variados sectores e condenada pelo voto, apesar de actos de ilusionismo político como o de ter guardado, para serem divulgados só após as eleições autárquicas, o anúncio dos aumentos dos preços de bens essenciais, numa tentativa desesperada para evitar uma derrota maior.
O que foi derrotado, Srs. Deputados, nas últimas eleições foi, de facto, a política global do Governo e, mais especificamente, uma política que afrontou o poder local, que fez tráfico de influências, que parodiou o desenvolvimento regional, que se opôs à regionalização.
Mas, Srs. Deputados, o comportamento do Governo logo a seguir às eleições autárquicas, face à tragédia que se abateu sobre milhares de portugueses em resultado dos temporais e das cheias, demonstra que o Governo, o Primeiro-Ministro e o PSD nao aprenderam nada com o que tem sido apelidado de sucessivos «cartões amarelos» e continuam cegos e surdos face aos problemas nacionais, aos protestos e reivindicações populares e às opiniões das mais altas instâncias do País;

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - É incompreensível e inaceitável a displicência com que o Governo encarou esta gravíssima situação dos temporais, só parecendo ter dado pelas cheias depois de deputados do PCP e de outras forças políticas, bem como o Sr. Presidente da República, terem alertado para o que se estava a passar e terem surgido na televisão a visitar as regiões.
O mínimo que se pode exigir é que o Governo venha a esta Assembleia da República explicar ao País por que razão minimizou os enormes prejuízos havidos, insiste em nao classificar de calamidade pública a situação no vale do Tejo e nas margens do Douro e nao pôs em execução medidas excepcionais de apoio às autarquias e às populações afectadas.
O País e em especial as populações das zonas atingidas apreciaram muito, certamente, a científica e diluviana explicação do Ministro do Planeamento e da Administração do Território e do Secretário de Estado do Ambiente de que as chuvadas que tem assolado o País se devem ao facto «de as nuvens se terem decido manifestar em coluna e na ocasião da precipitação terem caído maciça e concentradamente», confirmando aquele velho adágio popular de que a união faz a força.

Risos do PCP.