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30 DE MARÇO DE 1990 2063

de informação e de participação apenas sejam condicionadas em medida necessária, e proporcionada, a salvaguarda daqueles núcleos essenciais de restrição, tomando sempre como centro e ponto de referência os direitos do cidadão e a sua individualidade.
O projecto de lei do Partido Socialista agora em discussão, como solução normativa mediadora do texto constitucional e não obstante este ser de aplicação directa, procura incorporar a reflexão disponível sobre este domínio já ensaiada entre nós e reter soluções legais do direito comparado, encaminhando-se ou aproximando-se das soluções testadas em organizações administrativas cuja filosofia e modelo genético esteja próximo do nosso. Destas, destaca-se a experiência francesa, ensaiada a partir da Lei de 17 de Julho de 1978, que constitui, pela proximidade institucional do modelo centralizado de Administração, uma referência privilegiada a reter nas soluções a adoptar e que também serviu de matriz aos projectos do PCP e do PSD.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A transparência administrativa representa não só uma exigência de controlo da Administração mas ainda num instrumento de diálogo, que permite ao cidadão o exercício adequado do direito de crítica e de contestação e implica uni processo de alterações estruturais e uma mudança nas mentalidades, na formação e nas rotinas dos agentes do serviço público, sejam estes da administração central ou local.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sem dúvida!

O Orador: - Se o conhecimento empírico que cada um de nós tem destas questões não bastasse - e estou certo que basta -, uma pequena recolha de elementos sobre o exercício dos direitos de informação e documentação dos deputados era, só por si, esmagadora.

O Sr. Carlos Luís (PS): - É verdade!

O Orador: - Assim e reportando-nos apenas a esta V Legislatura, dos 1596 requerimentos apresentados pelos deputados e enviados quer à administração central quer local (respectivamente, 1525 e 71), na 1.ª sessão legislativa de 1596 só 951 foram respondidos;...

O Sr. Carlos Luís (PS): - É uma vergonha!

O Orador: -... na 2.ª sessão legislativa, dos 1401 enviados só 758 foram respondidos (717 pela administração central, 39, pela administração local e 2, dos 5 enviados, pelas regiões autónomas).
Por certo que não será abusivo admitir que todos estes requerimentos suscitam, pelo menos, o envio de documento ou ofício de resposta da Administração. E tudo isto se passa quando existe a consagração constitucional e legal do dever de cooperação, cujo incumprimento é susceptível até, no limite, de procedimento criminal.

O Sr. Carlos Luís (PS): - É uma vergonha!

O Orador: - A liberdade de acesso aos documentos e registos administrativos compreende o direito à informação sobre o conteúdo dos documentos e a possibilidade da sua reprodução material; um autêntico direito de «resposta» que se consubstancia no direito de correcção das informações inexactas e no suprimento de omissões; e um direito a «publicidade» dos documentos produzidos pela Administração ou, no mínimo, referência à sua existência.
Para o exercício deste direito, nas propostas citadas e particularmente na nossa, é relativamente irrelevante o lugar do seu exercício, mas já não a qualidade do emissor do documento, a qual define a natureza de documento administrativo: o ter sido produzido pela Administração do Estado, das regiões autónomas, das autarquias, de um instituto público, empresa pública, pessoas colectivas de direito público e pessoas de direito privado que exercem poderes públicos.
Também a qualidade do cidadão requerente é decisiva para a amplitude do seu direito. A regra geral é a do acesso livre de todos, sem necessidade de fundamentação, aos documentos não nominativos, enquanto os documentos «personalizados» só são acessíveis ao próprio ou, excepcionalmente, a terceiros a quem o documento respeite e após apreciação prévia do seu interesse pessoal e legítimo.
O acesso aos documentos e registos não colide, porém, com a chamada «reserva da intimidade administrativa» no que respeita aos processos e momentos preparatórios de elaboração de uma decisão. Não sendo abrangido o acesso às notas, dados, esboços e apontamentos pessoais, é garantida a possibilidade de aceder aos documentos preparatórios de uma decisão, a partir do momento em que tem lugar a referida decisão.
O exercício do direito de acesso está subordinado, no nosso diploma, à apresentação de um pedido de acesso escrito, o qual deve ser suficientemente preciso e referenciar-se a documentos existentes, o que corresponde ao direito normal do cidadão a receber uma informação que lhe é útil.
A recusa de acesso aos documentos só pode verificar-se se a classificação do documento o autorizar, em função da sua natureza. A Administração deverá, em qualquer circunstância, informar o requerente em prazos adequados.
Os deveres da Administração no âmbito da lei do processo administrativo continuam a manter-se, sendo, por sua vez, objecto de legislação própria as matérias respeitantes ao acesso ao registo civil, comercial e predial, aos arquivos históricos e ainda ao tratamento automatizado de dados com recurso a informática.
A comissão de acesso aos documentos e registos administrativos que agora se cria tem, neste quadro, um particular papel institucional, sendo simultaneamente um orgão de aconselhamento e de reflexão. É uma autêntica magistratura de influência, capa/de gerar uma deontologia do acesso aos documentos e de relacionamento com a Administração. Cabe-lhe citar pelo cumprimento das disposições legais; apreciar as queixas sobre recusas ou dificuldades no acesso, sobre a rectificação de dados, sobre a utilização de informações inexactas, sobre o acesso de terceiros a documentos nominativos, dar parecer obrigatório na classificação de documentos e pronunciar-se sobre soluções legislativas e regulamentares necessárias ao acesso, elaborando ainda um relatório que dê conta da actividade administrativa e suscite o necessário debate público.

O Sr. Carlos Luís (PS): - Muito bem!

O Orador: - A função pública da comissão de acesso aos documentos e registos administrativos e a sua composição projectam-se como entidade pública independente, capaz de estabelecer uma acção diversa do modelo jurisdicional ou administrativo, de recurso à norma ou a decisão, isto é, propondo-se, como seu objecto central, a recomendação ou a opinião esclarecida.