O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

30 DE JANEIRO DE 1991 1199

Esse meu acordo, justamente, é o que suponho que me dá mais autoridade para afirmar que é necessário o debate na Assembleia da República.
Igualmente o considero necessário porque não concordo com a qualificação desta guerra como sendo «fora do tempo». Julgo que esta não é uma «guerra fora do tempo», mas que é o combate de uma longa guerra.
Penso que este combate pertence a uma guerra que pode ter tido o seu início quando Mussadegue tomou o poder. A crise por ele desencadeada vem analisada pelo Xá da Pérsia nas suas memórias, livro ao qual talvez deva ser prestada alguma atenção, dado ter sido escrito quando ele sabia que estava para morrer. Ora, de acordo com a nossa cultura, costumamos admitir que um homem prestes a morrer diz exactamente aquilo que pensa.
Assim, analisando o livro, verificamos que o Xá da Pérsia não deixa de atribuir aos interesses ocidentais ligados ao petróleo toda a trama política que, pelos caminhos inesperados do imprevisto, entregou um excelente exército às mitos do fundamentalismo.
O que fez então o Ocidente? O Ocidente aliou-se ao Iraque para combater o perigo do fundamentalismo, cujos medos não devem ser esquecidos. E o que fizemos? Dominámos o fundamentalismo e transformámos o aliado ocasional num poder militar alarmante, criado, do ponto de vista material, pelos interesses económicos ocidentais e. do ponto de vista político, pelas necessidades de dominar o fundamentalismo do Irão.
E que estamos nós, ocidentais, a fazer agora? Com um instrumento formal ou sem ele, estamos a criar um aliado -que é a Síria -, poder que, historicamente, demanda a hegemonia naquela região.
A este propósito, talvez não devamos esquecer-nos do que aconteceu ao Líbano. Este país, que era chamado de cristãos, deixou de o ser porque estes foram extintos pelo processo rápido da eliminação violenta. E talvez este combate desta longa guerra termine com um poder dominante do aliado deste combate, que venha a exigir, novamente, a tomada de medidas extraordinárias por parte da comunidade internacional.
É por isso que não concordo com a amenização do problema. Não concordo com tornar mais suaves as circunstâncias ou as análises. Parece-me que este é um combate de uma longa guerra.
Atrever-me-ia a ir um pouco mais longe para afirmar que se trata de uma guerra que é um afloramento dramático das que temos tido - e, desde a paz de 194S. todas pareciam fora de tempo. Tivemo-la na Coreia, tivemo-la no Vietnam, tivemo-la no Afeganistão, têmo-la no Médio Oriente. Trata-se de alguma coisa que diz respeito ao sul e ao norte do mundo, tal como dizia Paulo VI, quando nos avisava que um dia haveríamos de ter medo por não termos decidido a tempo o conflito que se desenhava.
Por estas razões, também eu próprio, perante a enormidade da ameaça, condeno todos os entusiasmos intervencionistas e aprovo a ponderação do Governo.
Já tive ocasião de dizer - e repito - que o cavaleiro da triste figura passou à Historia porque confundiu os moinhos de vento com gigantes. É mais grave confundir gigantes com moinhos de vento e suponho que é este o erro em que caem os entusiastas do intervencionismo.
Aquilo a que assistimos neste momento e que considero extremamente preocupante é que os objectivos desta intervenção militar - problema que aqui foi trazido - não são de tranquilidade. Não podemos referir-nos apenas às declarações das Nações Unidas.
Na verdade, já lemos, pelo menos, três declarações de objectivos: lemos a primeira declaração das resoluções do Conselho de Segurança - intervenção para libertar o Kowait; temos a organização da operação que se chama «Escudo do Deserto», quer dizer, defesa contra uma agressão imputada ao Iraque em relação à Arábia Saudita; temos a declaração do Presidente Bush no momento da intervenção, onde ele não foge à responsabilidade de dizer que é preciso «destruir» o poder militar do Iraque.
Isto só demonstra, mais uma vez, que se sabe como as guerras começam mas não se sabe como acabam e que está encetado o trajecto da guerra existencial.
Este trajecto da guerra existencial que está encetado faz--me chamar a atenção para um ponto fundamental. É que, evidentemente, está a ser perdido o controlo da definição da moldura do teatro estratégico. É o que significa toda a agitação que vai pelo mundo árabe.
Por isso mesmo, sendo Portugal um país devotado ao serviço da paz, tendo neste momento uma situação de convergência institucional que fortalece a possibilidade da sua intervenção na cena internacional, julgo que, em face do evidente perigo de descontrolo do teatro de operações e da subida da guerra para o patamar da guerra existencial, aquilo que é necessário ser enfrentado pelos países que não precisam de demonstrar a sua força, exibindo um intervencionismo militar que lhes não cabe, é a contribuição que podem dar para que seja retomado o controlo do sistema internacional. Para isso, são legítimas todas as intervenções das autoridades políticas portuguesas: é legítima a do Presidente da República, é legítima a do Governo, mas também o é a desta Assembleia da República.

O Sr. Sottomayor Cárdia (PS): -Muito bem!

O Orador: -E não há interpretação da Constituição que deva fazer-nos adiar o estudo da oportunidade e de, na qualidade de Assembleia da República, darmos a nossa contribuição para que seja reassumido o controlo do sistema internacional.

E isto a bem da paz!

Aplausos do CDS. do PSD, do PS e dos deputados independentes Jorge Lemos e José Magalhães.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, dou por terminado o período de antes da ordem do dia e solicito aos presidentes dos grupos parlamentares o favor de se reunirem comigo no meu Gabinete, para o que interrompo os trabalhos por 5 minutos.

Está suspensa a sessão.

Eram 17 horas e 10 minutos.

O Sr. Presidente:-Srs. Deputados, está reaberta a

Eram 17 horas e 30 minutos.

ORDEM DO DIA

Srs. Deputados, entrando no período da ordem do dia, o Sr. Secretário vai proceder à leitura da acta do Tribunal Constitucional relativa à eleição de Sua Ex.1 o Presidente da República.