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2546 I SÉRIE -NÚMERO 77

Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, Sr. Provedor de Justiça: Faço votos de que o relatório do próximo ano possa ter, além do carácter de uma resenha, a nota de optimismo de que as directrizes aqui traçadas poderão ser cumpridas, porque para isso existiram meios. Vontade há, mas isso já nós sabemos!

Aplausos do PS e do deputado independente Jorge Lemos.

A Sr.ª Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, Sr. Provedor de Justiça: Não obstante ter aplaudido já a homenagem do Plenário ao actual Provedor de Justiça, não quero deixar de fazê-lo, individualmente, porque sou um velho amigo de Coimbra, como se costuma dizer, tendo acompanhado sempre, com muita amizade e afecto, toda a carreira, quer de advogado que foi eleito bastonário da Ordem, quer de político, seja como deputado, como ministro, ou, agora, como Provedor de Justiça, do Dr. Mário Raposo. Por isso, não podia deixar de invocar este sentimento de admiração e amizade que, desde há muito, nutro por ele, e o grande respeito que lhe tenho pela sua actuação em todos os campos onde ele tem intervindo.
Julgo que o relatório do Provedor de Justiça mereceria um debate muito mais amplo do que o que estamos a fazer, uma forma resumida e apressada porque cada grupo parlamentar dispõe apenas de 10 minutos, o que não permite a análise dos problemas que o próprio Provedor de Justiça levantou na nota introdutória do seu relatório, que está desdobrado em dois volumes.
Julgo que são cinco os grandes problemas que o Sr. Provedor de Justiça gostaria de ver aqui profundamente debatidos. O primeiro é o de saber se - pelo menos, é esta a interpretação que dou - a Provedoria de Justiça é a longa manus do Parlamento ou se é um poder autónomo, um contrapoder, como até aqui se dizia. Isto é, se o Provedor de Justiça é uma emanação, se retira a sua legitimação e funciona como a longa manus do Parlamento, naturalmente, fica prejudicada a tese de considerar o Provedor de Justiça como um contrapoder, dado que o Parlamento nunca pode ser um contrapoder de qualquer outro órgão de soberania, mas, sim, um órgão de colaboração e coadjuvante nas tarefas do Estado.
Entendemos que esta interpretação, que parece decorrer do relatório do Sr. Provedor, é a que está mais de acordo com a personalidade do Dr. Mário Raposo, actual titular do cargo, e também com a sua intervenção no sentido de ajudar a resolver os problemas dos cidadãos e, não, a contrapor o cidadão à Administração ou aos poderes públicos. O caso dos professores, dos trabalhadores despedidos da RTP, dos pensionistas da Segurança Social, etc., e tudo quanto o actual Provedor de Justiça tem feito não é como contrapoder ou função contrária aos poderes estabelecidos, mas é em colaboração com os órgãos do Estado ou entes públicos para que estes obtenham a devida resposta às suas reivindicações.
O segundo problema diz respeito ao Provedor como promotor de modelação do Estado de direito. O Provedor, como modelador do Estado de direito, não pode ler a sua competência restringida à mera definição legal, como tem sido até aqui. É esse carácter, de modelador do Estado de Direito, que lhe tem dado a verdadeira liberdade para intervir em casos que até aqui pareciam vedados ao Provedor e que, com êxito, têm sido resolvidos, com o aplauso da sociedade civil.
O terceiro problema relaciona-se com os provedores sectoriais. Várias vezes foi aqui colocado este problema - uma delas foi, por exemplo, aquando do debate do projecto de lei para o provedor do ambiente. Mas esta questão pode ainda voltar a surgir para o provedor de delitos económicos ou para outras formas de provedoria, pelo que nos parece de apoiar a opinião sustentada na nota introdutória do relatório, de que a falta de uma metodologia coerente neste campo suscitaria a dispersão dos provedores sectoriais, com a consequente dispersão de meios. Por isso mesmo seria aconselhável não avançar com novos projectos de lei sobre diferentes provedores sectoriais.
O quarto problema, que já aqui foi tratado pelo Sr. Deputado José Magalhães, sobre o projecto ombudsman europeu, consiste em saber em que termos o Provedor de Justiça pode ser eclipsado ou «curto-circuitado», ou, pelo menos, diminuído nas suas funções pela existência e pela jurisdição do ombudsman europeu. É um problema extremamente importante e que não se compadece com meros afloramentos e pinceladas aqui neste debate.
Temos de tomar este problema nas mãos, debatê-lo exaustivamente nesta Câmara, para que fixemos uma doutrina clara, para bem dos negociadores portugueses, para que eles saibam exactamente qual é a situação e a orientação do País e não apenas do Governo e do partido do Governo nesta matéria. Por isso mesmo, só o Parlamento, através de um debate sério e esclarecido, poderá naturalmente dar esta indicação.
O último ponto é o da extensão dos actuais poderes dos provedores de justiça para a tutela dos chamados direitos difusos ou dos interesses colectivos e do «direito de participação nos destinos da comunidade».
O direito de participação nos destinos da comunidade é sugerido no relatório para o campo da comunicação social eslatizada. Entendemos que esta entrada é bem-vinda, é urgente, na medida em que os sinais de governamentalização, os sinais de degeneração do monopólio estatal, a inclinação para a clara dependência, por exemplo, do maior meio de comunicação social, que é a RTP, aos interesses partidários e, principalmente, a promoção despudorada do chamado poder pessoal do Primeiro--Ministro, são hoje evidentes e têm servido como um dos esteios da campanha eleitoral do actual governo.
Esta breve imagem e perfil de função do Provedor de Justiça em garantir a isenção, a independência e o rigor na informação estatizada é urgente e só o actual Provedor de Justiça, com o seu prestígio, com o seu saber, com as provas dadas no exercício de cargos públicos é que poderá levá-la a bom termo. É neste sentido que eu, independentemente do debate que devia ser aqui feito sobre esta questão, peço ao actual Provedor que não descure este aspecto e que, já que estamos quase em campanha eleitoral, tenha bem presente a sua própria experiência pessoal e política para intervir no sentido da garantia da isenção, da independência e do rigor da RTP e dos órgãos audiovisuais estatizados.
Finalmente, esta Câmara, em vez de repetir aquilo que o Sr. Provedor de Justiça fez, devia analisar a sua jurisprudência e fazer-lhe recomendações para o futuro.