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3244 I SÉRIE - NÚMERO 95

negocial junto da Comissão Europeia, a passagem para o dobro das verbas dos fundos estruturais aplicáveis a Portugal. Mas aqui, na Assembleia da República, interpelado sobre o valor de tal afirmação, vimos o Primeiro-Ministro fugir deliberadamente a todos os problemas postos em torno dos impactes da aplicação do quadro comunitário de apoio em Portugal.
O Primeiro-Ministro - reconheça-se - está a «fazer escola» em Portugal. Faz da política um acto de espectáculo permanente, com total desprezo pela autenticidade do confronto político e numa compungente desvalorização do papel das ideias no domínio da acção política.

O Sr. António Guterres (PS): - Muito bem!

O Orador: - Acredito, todavia, que vale a pena persistir em conduzir a política ao domínio ético da verdade. As realidades nacionais não confirmam os discursos do Primeiro-Ministro. Para quem possa persistir na dúvida, há que encarar tais realidades, e delas aqui se dão notícia.
Em primeiro lugar, a duplicação dos fundos estruturais não é mérito especial deste governo, mas consequência do Acto Único e da decisão de criação do mercado interno comunitário e como medida destinada pela CEE a incrementar de forma acelerada o desenvolvimento económico e social das regiões mais atrasadas da Comunidade.
Em segundo lugar, a aprovação do quadro comunitário de apoio para Portugal, integrando na sua aplicação todo o território nacional, nada teve a ver com uma particular diligência deste governo. Resultou, simplesmente, de uma necessidade indisfarçável em face dos nossos baixos índices de desenvolvimento, comparativamente aos demais países da Comunidade. Só no ano em curso Portugal poderá beneficiar de mais de 250 milhões de contos, pelo menos tanto como o total do investimento público inscrito no Orçamento do Estado. Algum governo no passado usufruiu de tais facilidades?
Em terceiro lugar, se face à Grécia, por exemplo, os índices de distribuição de verbas atribuídas per capita são idênticos, comparativamente à Irlanda, terceiro país em que se regista a aplicação integral de um quadro comunitário de apoio, mas onde os índices de desenvolvimento são inequivocamente superiores aos nossos, Portugal receberá, todavia, em média, menos 50 contos por habitante, o que manifestamente não deixa dourar o Governo dos fartos êxitos negociais de que, a torto e a direito, tanto se tem reivindicado.
Em quarto lugar, tendo a reforma dos fundos estruturais entrado em vigor em Janeiro de 1989 e o quadro comunitário de apoio para Portugal sido aprovado em Outubro do mesmo ano, é politicamente indesculpável que a sua orgânica de funcionamento, exclusivamente dependente do Governo e por sua exclusiva inércia, só tenha entrado em funcionamento nos finais de 1990, contribuindo assim para atrasar drasticamente a execução da maioria dos programas operacionais pensados para um período de cinco anos e na prática já reduzidos a um ciclo de três.
Em quinto lugar, e mais uma vez em nome do rigor, não é admissível que os discursos do Governo continuem a flutuar ao sabor das conveniências, de tal forma que quando o Primeiro-Ministro quer auto-exaltar os méritos da acção governativa diminui o significado das transferências comunitárias, reportando-as à verba de 550 milhões de contos, mas, quando o Governo quer ufanar-se dos êxitos de negociação, fala então, pela boca da Secretária de Estado do Desenvolvimento Regional, em 860 milhões de contos de compromissos já garantidos.
Que significa a discrepância: diferença de saldos líquidos ou graves falhas de execução?
O caso é que, ao afirmar-se que a taxa de execução ronda actualmente os 70 %, em tal percentagem estão a incluir-se os adiantamentos aos projectos aprovados, na ordem dos 40 % do respectivo valor, o que evidentemente significa laxas de execução real a níveis preocupantemente baixos.

O Sr. António Guterres (PS): - Muito bem!

O Orador: - Bem pode, pois, dizer-se que, em face do que o Governo gosta de chamar a sobra feita», o mais que existe é sobretudo obra atrasada e em grande medida por fazer.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Mesmo sem o confessar, o Governo sabe que assim é. Teme as consequências dos falhanços de execução em face de um perigo que espreita: o perigo do corte de verbas nos envelopes financeiros inicialmente estabelecidos.
Por isso - é a sexta observação-, o Governo tenta convencer em Bruxelas os serviços da Comissão (e é caso para dizer, em face das dificuldades em que se meteu, oxalá que o consiga) a considerar que o valor dos adiantamentos efectuados seja desde logo havido como despesa efectiva para efeitos de taxa de execução e, consequentemente, de mobilização de verbas.
A engenharia financeira poderá assim permitir, se o permitir, disfarçar as grandes dificuldades em que vai navegando a concreta utilização dos fundos comunitários. Mas o que não disfarçará é a má gestão do Plano de Desenvolvimento Regional.
Com efeito, é indisfarçável que a versão originária do Plano de Desenvolvimento Regional, de cuja aplicação integral o Governo tanto fez profissão de fé, se encontra largamente subvertida com a mobilização de verbas para efeitos e programas inicialmente não previstos, como o caso dos 90 milhões de contos de comparticipação no projecto Ford/Volkswagen.
O Governo tem o direito de, em cada momento, procurar reequacionar as prioridades do apoio ao investimento, mas não tem o direito de alterar prioridades de investimento em programas e projectos aprovados sem explicar claramente ao País quais as áreas, os critérios e as consequências dos cortes de financiamento que inevitavelmente terão de verificar-se.
Em sétimo lugar, deve o Governo meter mãos na consciência, dar-se conta e dar-nos conta de que a manipulação dos números não pode servir como instrumento permanente de manipulação política.
Que sentido tem, por exemplo quanto ao PEDIP, dizer--se que o programa está a ser aplicado a 100 % quando é certo que os investimentos efectivamente concretizados são menos de metade do valor dos compromissos estabelecidos? Isto porque o Governo não tem - nunca teve! - uma política e uma estratégia de reconversão industrial consequentes e porque as taxas de juro praticadas no mercado, em tantos casos acima dos 25 %, neutralizam frequentemente os virtuais efeitos positivos dos co-financiamentos aprovados, deitando por terra as melhores intenções de investimento por parte dos empresários portugueses.