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692 I SÉRIE - NÚMERO 19

mática, não apenas com o exercício, mas igualmente com a própria titularidade da soberania, na medida em que a principal consequência das guerras, particularmente para os derrotados, é a imposição de sanções, que se traduzem, em maxime, na perda de território, que é um dos elementos fundamentais da soberania?); as leis do Orçamento e as consequentes decisões de lançar impostos ou de promover a sua suspensão; a concessão de indultos e amnistias; o poder de emitir moeda; o poder de nomear chefes militares e magistrados (estes últimos detentores do poder de julgar, outro atributo essencial da soberania).
Srs. Deputados, voltamos ao início. Se o problema é um problema de princípio, ou seja, se se deveria referendar o Tratado da União Europeia,, porque está em causa a soberania, porquê referendar num caso e não em todos os outros que acabo de enunciar?

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - A razão é simples: o povo decide, através de um mecanismo de democracia directa, a resolução concreta do problema e não a escolha de quem vai resolver o problema, como é próprio do mecanismo da democracia representativa. Deve, por isso, poder tomar uma decisão racional, fundamentada, o que pressupõe conhecimentos seguros da matéria a decidir e não apenas uma mera opinião sobre ela, que possa ser instrumentalizável com facilidade. Uma opinião que, dada a carga emotiva das matérias atrás referidas, como tradicionalmente excluídas de decisão referendaria, não possa ser de utilização demagógica.
Foi, de resto, a facilidade dessa instrumentalização que sempre conduziu à degenerescência dos regimes democráticos, fenómeno que na história das ideias políticas foi baptizado com o nome de demagogia. E foi igualmente por isso que alguém se lembrou de inventar a democracia representativa que, com todos os seus defeitos, particularmente os dos seus representantes, ainda mostrou ser a melhor forma de lhes dar resposta de forma equilibrada e razoável.
Vão, pois, Sr. Presidente e Srs. Deputados, os Deputados do PSD dar o seu apoio, sem reservas, à ratificação do Tratado da União Europeia.
Alguém referiu há dias - neste momento, já não me lembro bem quem foi - que os dois maiores partidos portugueses, o PSD e o PS, ainda se iriam arrepender por não terem feito um referendo sobre uma matéria que, em sua opinião, pode levantar questões delicadas de soberania. Não estamos, francamente, preocupados com o íntimo e momentoso problema do arrependimento, porque se os homens políticos se deixassem dominar por essa angústia jamais saltariam a fronteira do risco que as grandes decisões sempre comportam.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Quem assim profetizou tais arrependimentos poderia encontrar motivo de maior ânimo e esperança nas palavras que o Sr. Presidente da República, Dr. Mário Soares - ele próprio uma referência política fundamental no processo de adesão à Comunidade Europeia -, proferiu, num momento de rara inspiração e amor europeus, no seu discurso de 10 de Junho de 1990.
Nesse discurso, após um empolgante exórdio sobre a conquista da liberdade pelos povos de Leste, explanava-se S. Ex.ª o Chefe do Estado em arrojados voos quanto ao futuro da Europa Comunitária e às modificações que, inevitavelmente, nela ocorreriam. E explicava-as assim:
No centro de todas estas tão grandes modificações, a Europa volta a ocupar uma posição cimeira e determinante. E na Europa, como motor da nova construção geopolítica, está a Comunidade Europeia, à qual Portugal pertence por direito próprio. Porém, com a unificação das duas Alemanhas, a Comunidade entrou ela própria também e necessariamente numa fase de grandes transformações para poder corresponder aos apelos que, de todos os lados, lhe são dirigidos. '
Não se trata já e tão só da construção do grande Mercado Único, em 1993, criando um imenso espaço interno sem fronteiras. É a própria união política, servida por uma moeda única e por um Banco Central Europeu comum aos Doze, com instituições supranacionais e restrições importantes das soberanias de todos os Estados membros, que está a caminho de se construir, para responder com eficácia aos apelos do Leste e dar à Europa o peso decisivo a que tem jus no conceito mundial.
Portugal, no interior desse turbilhão, não pode ignorar os desafios que lhe são postos, as exigências e sacrifícios que lhe serão requeridos, e também, em contrapartida, as perspectivas que lhe estão a ser abertas. Pela primeira vez, desde a época áurea dos Descobrimentos, Portugal, volta a estar na vanguarda dos países em condições de marcar o futuro da Humanidade. Uma tal oportunidade, com as vantagens dela decorrentes e as consequentes responsabilidades, não pode, repito, ser perdida nem subestimada.
Claro que o Presidente da República pensava nos eurocépticos, nos «velhos do Restelo», para quem ficar é sempre mais fácil do que partir. Antevendo quiçá o argumento com que, em arroubos de nacionalismo, alguns anatemizariam essa Europa em construção, invocando, claro, o argumento já visível da perda de soberania, rematou, a esse propósito, o Sr. Presidente da República:
As transformações em curso, põem-nos problemas nacionais que ninguém deve pensar que serão fáceis de resolver. Não tenho dúvida de que serão resolvidos; digo apenas que não são de fácil resolução. Não se trata já tão-só dos períodos de transição, negociados, aquando da adesão de Portugal, para ajuda ao nosso desenvolvimento [...]. É também o choque da concorrência acrescida, a partir de 1993, com a livre circulação no nosso espaço nacional de pessoas, capitais, mercadorias e serviços de toda a Comunidade.
O poder de decisão, em áreas fundamentais da nossa economia, passará para Bruxelas, através das directivas comunitárias aí decididas. Não só estrangeiros, cada vez em maior número, virão comprar as nossas terras e empresas. Profissionais de outros países comunitários virão concorrer com os nossos, e nós com eles nos países deles. É a regra do jogo, para a qual teremos de estar preparados.
A União Económica e Monetária e a futura União Política, em termos ainda vagos e incertos, que estão a ser discutidos, levarão necessariamente a limitações da nossa soberania e à modificação da própria estrutura do poder - do poder político e do poder