1 DE JULHO DE 1993 2931
descaracterização evidente deste instituto. Os números aí estão, em toda a Comunidade Europeia, para comprová-lo: em 1989, no conjunto dos países da Comunidade, 200 000 pessoas requereram asilo; em 1992, esse número subiu para 700 000 pessoas, ou seja, triplicou.
Se repararmos nos países de dimensão semelhante à de Portugal, nomeadamente em número de habitantes, veremos como este salto está a ser dado. A Bélgica, por exemplo, que em 1989 tinha 8000 pedidos de asilo, em 1992 tinha quase 20000; a Holanda, que unha 5000 pedidos em 1989, teve, em 1992, 26 000; a Espanha, que tinha 2800 pedidos em 1989, passou para 14 000 em 1992; e a Alemanha, o país onde este aspecto tem mais gravidade, passou dos cerca de 100 000 pedidos, em 1989, para quase meio milhão, em 1992.
Como é evidente, este problema preocupa toda a Comunidade Europeia e, para tentar solucioná-lo, nela foram construídos, nomeadamente, dois instrumentos, um mais importante que o outro, reconheço-o.
O primeiro é a Convenção de Dublin relativamente à qual temos de fazer um esforço no sentido da sua ratificação, porque esta Convenção pode ser um bom contributo para a luta que a Comunidade leva a cabo nesta matéria. Portugal já o fez, cumpriu a sua obrigação em relação a esta matéria, mas falta ainda que seis países a ratifiquem para que ela possa entrar em vigor. Mas ela é um instrumento decisivo para qualquer país da Comunidade.
Um outro instrumento, que, aliás, foi erigido durante a nossa presidência, no primeiro semestre do ano passado, tem a ver com o Centro de Informação, Reflexão e Intercâmbio em Matéria de Asilo, o denominado CIREA, que está de pé e onde, pela primeira vez, os países comunitários- e, como sabem, trata-se de uma decisão de carácter intergovernamental - decidiram envolver a própria Comissão Europeia, que também tem assento neste grupo, de modo a que, através da acção concertada dos vários países neste Centro, a luta contra este fenómeno grave possa ter alguns resultados. Porém, vários países da Comunidade nem sequer se bastaram com instrumentos de âmbito comunitário; eles próprios, ao longo do tempo e à medida que o problema se ia agravando, procuraram aperfeiçoar as legislações nacionais, de modo a que, através desse esforço nacional, pudessem lutar contra esta quase calamidade, e é, de facto, disso que se trata. Por isso, obviamente no respeito da Convenção de Genebra e do seu Protocolo Adicionai - o Protocolo de Nova York -, tem-se recorrido a conceitos que estão consagrados na Convenção de Dublin, nomeadamente o do «país seguro» e o do «país terceiro de acolhimento», incorporando-os em várias legislações que os Estados membros têm modificado, como é o caso da Bélgica, da França, da Espanha, da Holanda, da Dinamarca e da própria Alemanha, que, como sabem, através da alteração que fez, muito recentemente, ao artigo 16.ª da Constituição, possibilitou, agora, a transformação da sua legislação ordinária, de modo a acolher os mesmos princípios, e, portanto, está a lutar também contra este facto gravoso, que é o da enorme quantidade de pedidos de asilo.
Em Portugal, a situação está a conhecer, de um momento para o outro, um agravamento qualitativo Já iremos falar das causas, mas falemos primeiro dos números.
Pediram asilo político em Portugal, em 1990, 61 pessoas; em 1991, 233 pessoas; em 1992, 535 pessoas; e em 1993, até 24 de Junho - este foi o apuramento que fiz até há uma semana atrás-, 1233 pessoas. Comparando este período de 1993 com o homólogo do ano passado, temos já um crescimento de 630 %, o que não é, porventura, ainda a dimensão exacta do problema, porque estamos a crescer, dia após dia, em progressão geométrica e, portanto, estes 630 % poderão ser, no final do ano, 800 %, 1000 % ou mais. Temos de ter a noção desta realidade.
Mas, para terem uma melhor noção da realidade, dar-lhes-ei um dado muito significativo: há três ou quatro semanas, num só fim de semana, numa sexta-feira e numa segunda-feira, pediram asilo político, em Portugal, mais pessoas do que todas as que o fizeram em dois anos, ou seja, em 1989' e 1990. Só num fim de semana houve mais pedidos do que em 1989 e 1990!
Segundo dado factual relevante nesta discussão: quanto está a custar, a Portugal, este problema? Só a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa - e para termos também a ideia de como os custos vão crescendo geometricamente -, em
1991, portanto, há dois anos atrás, gastou 29.000 contos, em 1992, gastou 300 000 contos e até Maio do corrente ano, até há um mês atrás, já tinha gasto 350 000 contos.
Terceiro dado, já não factual mas, sim, interpretativo: porque é que isto se está a passar agora em Portugal? Srs. Deputados, é por uma razão extremamente simples: não é porque as fronteiras, se abriram, pois isso ainda não aconteceu, porque não temos a Convenção de Dublin, que é aquela que vai permitir identificar qual é o Estado responsável pela análise de um pedido, que será sempre, em relação a cada pedido, só um Estado membro, o que se passa é que temos tido aquilo a que se tem chamado o «turismo do asilo», isto é, pessoas que pedem asilo num país e, depois, estão um ano à espera da resolução, voltam a pedir asilo num outro país e assim vão passando de país para país. Essas pessoas, a que se chama «refugiados em órbita, estão agora a começar a chegar a Portugal, e por isso é que, neste momento, se está a fazer sentir esta enorme pressão sobre as nossas fronteiras.
O futuro, nesta matéria, não nos pode tranquilizar, pois a pressão vai ser muito maior. Basta pensar naquilo que se passa no Leste europeu, basta pensar no Sul e nos seus problemas de crescimento demográfico e de toda a ordem, económicos, sociais etc., para ver que esta pressão continua.
As pessoas hão-de procurar sempre ter melhores condições de vida, hão-de procurar estes espaços, que são a Europa comunitária, os Estados Unidas da América e o Canadá, e hão-de querer emigrar, não tendo outra possibilidade que não seja a de tentar utilizar o instituto do pedido de asilo.
Portanto, em relação as perspectivas não temos de estar descansados, pelo contrario, temos fortíssimas razões para estarmos preocupados.
Quais são os objectivos que temos e a estratégia que devemos de seguir como País? Diná que o objectivo é reconduzir o direito de asilo àquilo que é a sua essência nos termos da Convenção de Genebra. Portugal não pode permitir que se esteja a criar um problema gravíssimo através do desvirtuamento do instituto do asilo, tal como está entendido no seu texto fundamental, que é a Convenção de Genebra. Este é o grande objectivo e para isso propomos, aqui, uma legislação nova e diferente em relação à do antecedente, que data de 1980
É óbvio que Portugal não pode perder de vista que é um País de cultura humanista e de valores humanistas. Isso não está em causa e toda a legislação tem de ter este pressuposto, como é evidente, mas não pode deixar de, nesse pressuposto, prosseguir as objectivos.
Por isso enumeramos claramente as causas de recurso de asilo no artigo 4.º, de acordo com aquilo que é o entendimento do asilo na Convenção de Genebra, com uma