2944 - I SÉRIE - NÚMERO 90
a luta contra a fraude e evasão carece de instrumentos adequados, que o Governo vem procurando reunir, e que passam também pela moralização da própria administração fiscal.
A revelação de um conjunto de situações de criminalidade fiscal demonstra que a cada vez mais acentuada modernização e internacionalização da economia portuguesa, se, fez acompanhar de um progresso das formas de fraude evidenciada pela sofisticação dos meios empregues e pela dimensão da lesão causada aos interesses do Estado.
Havia, pois, que adaptar os meios de reacção contra esses comportamento ilícitas entre os quais se contam as sanções de natureza criminal e contra-orderiacional. Na definição desses meios teve-se em conta que o Direito Penal Tributário tem sido crescentemente penetrado por valores éticos centrados no carácter social da justiça. No Estado de direito, deixou de haver lugar ás formas de tributação arbitrária, protegidas por penas severas aplicadas por governos desrespeitadores das liberdades públicas.
O Sr. Castro Almeida (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Os impostos justos não são uma restrição ignominiosa da propriedade Sem eles, não podem ser prosseguidos as objectivos do Estado moderno, incluindo o>seu ideário de competitividade económica e de justiça social Como é sabido, a aprovação destes impostos é efectuada por assembleias representativas resultantes da vontade popular expressa pelo voto.
Sr Presidente, Srs. Deputados. Fugir aos impostos legitimamente criados não é comportamento digno de aplauso mas, outro assim, a infracção a um dever fundamental de cidadania. Nesse sentido dizemos que os impostos fazem parte da cidadania. O direito penal tributário não é um domínio globalmente destituído de relevância ética e tem sido progressivamente penetrado pelos valores do direito penal comum.
Assim, a reforma fiscal consubstanciada na introdução dos impostos sobre o rendimento das pessoas, singulares e colectivas e do imposto sobre o valor acrescentado criou um sistema tributário mais justo>e adaptado ao modelo constitucional de 1976. Por isso, o RJIFNA criou vário tipos de crimes fiscais destinadas a punir os comportamentos que no domínio fiscal infrinjam valores éticos essenciais da colectividade.
Para punir as infracções fiscais de natureza criminal, o RJIFNA previu exclusivamente a pena de multa; só, sendo aplicáveis medidas coercivas de liberdade em caso de esta não ser paga. A prisão, para o legislador do RJIFNA, constitui uma medida meramente, subsidiaria ou suplente infligi da quando o condenado não cumpra a multa pecuniárias.
Ao facto de a pena de prisão não ter sido consagrada a título principal não foi indiferente a ausência de tradição no nosso país da criminalização das infracções fiscais. O Decreto-Lei n.º 619/76, de, 27 de Julho, que a consagrou, foi de muita escassa aplicação jurisprudencial.
Mas a ponderação da experiência de aplicação do RJIFNA revelou a insuficiência da pena de multa criminal parai a prevenção e repressão das condutas patentemente mais graves. Idênticas condutas, são, aliás, puníveis com prisão efectiva no direito penal comum. A não previsão da mesma pena no direito penal fiscal enfraquece as finalidades da prevenção e repressão, para além de que é hoje possível constatar que uma certa benevolência com que se trata tal tipo de ilícitos já não corresponde ao sentimento generalizado da, sociedade portuguesa.
Neste sentido, para as condutas de desvalor ético excepcional apresente proposta de lei prevê a título principal a pena de prisão, o que é uma das inovações principais. O juiz, no entanto, salvo em casos de fraude fiscal e abuso de, confiança fiscal de muito particular gravidade pela natureza da conduta do agente ou pelo montante das prestações tributárias de que este indevidamente se tenha apropriado, pode aplicar, em vez de pena de prisão efectiva, a pena de multa sempre que esta satisfaça o interesse social de recuperação do infractor e as exigências de prevenção e repressão do crime.
A falta de pagamento da multa deixa, por outro lado, de determinar automaticamente a pena de prisão. Esta não tem lugar se a multa não for paga por motivo de insuficiência económica não imputável ao agente É mais um dos pontos de .aproximação ao direito penal comum.
Todavia, não é proposta a alteração do número de tipos de crime; previstos no, RJIFNA. Eles esgotam, efectivamente, as condutas ilícitas em que se materializam a fraude e evasão fiscais vários tipos foram alterados engordem à sua clarificação e, também, à sua harmonização com tipos congéneres do código penal Manteve-se, pois, a tipificação dos crimes fiscais fora do código penal que resulta da natureza específica das condutas em causa, e da necessidade da sua articulação com o regime das contra-ordenações.
No RJIFNA, o crime de fraude fiscal depende da circunstância de, o agente, visar uma «vantagem patrimonial indevida» O conceito revelou carecer de precisão. A «vantagem patrimonial indevida» passa a ser claramente a não liquidação, entrega ou pagamento de impostos ou a obtenção indevida de benefícios fiscais, reembolsos ou de outras vantagens patrimoniais susceptíveis de causar, diminuição das receitas tributarias. Da alteração do conceito resulta a inclusão, no tipo, a ocultação dolosa de rendimentos não declarados sempre que o valor do imposto for elevado (solução adoptada noutras legislações). Também no tipo, se inclui a sonegação dolosa de bens ou valores ao imposto sucessório, através de falsas declarações na relação de bens que fora discriminalizada pelo artigo 4º do Decreto-Lei n º 20-A/90. A pena para estes crimes é, como propõe o artigo 4 ª, alínea a), prisão ou multa até três anos, salvo se se verificar a acumulação de mais de um dos elementos do tipo previsto na alínea c) do n º l do artigo 3.º, em que a prisão é dei um a cinco anos sem .alternativa de multa.
A moldura penal é idêntica, no limite máximo, à das legislações alemã e belga e inferior à francesa, (onde a pena; de prisão pode ir até 10 anos) ou espanhola (em que o limite máximo da pena de prisão é de seis anos).
O abuso de confiança fiscal é claramente identificado no n.º 2 do artigo 3 º com a apropriação, em proveito próprio pelo substituto tributário das quantias que devia entregar nos cofres do Estado. A pena aplicável prisão até três anos ou multa consta do artigo 4.º e fica harmonizada com a prevista para o crime de abuso de confiança comum previsto no Código Penal a limite máximo pode elevar-se até cinco anos de prisão, sem alternativa de multa, no caso de estarem em causa montantes substancialmente elevados.
Apesar de o tipo de crime de frustração de créditos ter sido eliminado do Código Penal com o Decreto-Lei n.º 132/93, que aprovou o Código dos Processos Especiais de Recuperação de Empresas e, de Falência, por ter sido consumido pelo crime de insolvência dolosa, manteve-se o cri-me de frustração de créditos fiscais que já conservava autonomia perante o crime comum.
Finalmente manteve-se o crime de segredo fiscal mas é também alterada a dosimetria aplicável, punindo mais forte.