1458 I SÉRIE-NÚMERO 41
a decorrer, na Sala D. Mana, a eleição de cinco membros para a Alta Autoridade para a Comunicação Social, até às 18 horas. Tem a palavra, Sr. Deputado André Martins.
O Sr. André Martins (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Desde 1988 que o Partido Ecologista Os Verdes, designadamente aqui, na Assembleia da República, tem exigido ao Governo o seu empenhamento na resolução do gravíssimo problema que representa para a segurança de pessoas e bens e para a saúde pública a produção descontrolada e a deposição indiscriminada no meio ambiente dos resíduos toxicoperigosos.
Reivindicámos mesmo que fosse implementado o projecto que, ao tempo, a Direcção-Geral da Qualidade do Ambiente propunha e que se baseava num levantamento feito por estimativa das quantidades produzidas deste tipo de resíduos, suas características e distribuição geográfica.
Esse estudo revelava que em 1987 se produziam em Portugal mais de 1 milhão de toneladas/ano de resíduos toxicoperigosos e se projectava, para 1995, a produção de mais de 2 milhões de toneladas/ano, e propunha, como solução para o problema, a adopção de um sistema centralizado e integrado composto por várias unidades: um incinerador, uma estação de tratamento físico-químico, uma estação de transferência e dois aterros controlados a localizar, um na zona norte e outro na zona sul do País. Tudo isto tendo em conta a quantidade e características dos resíduos produzidos e a sua distribuição geográfica a nível nacional.
Desde 1987 que o Governo conhecia a situação e os riscos que ela representava e representa para a vida das pessoas e para o desenvolvimento do País, mas só em 1990 foi decidido avançar para a implementação do projecto referido, através da abertura de um concurso público com a promessa de que, em 1993, o sistema estaria a funcionar e, em grande parte, os problemas resolvidos.
Face a erros sucessivos na condução do processo, designadamente a tentativa de impor a localização do incinerador em Sines, ainda hoje os resíduos continuam sem tratamento, a ser lançados no meio ambiente, contaminando os solos, os aquíferos, o ar e os nossos rios, situação que, além de agravar os riscos de segurança e saúde dos cidadãos, por força dos efeitos de contaminação está a hipotecar o próprio desenvolvimento do País.
Basta referir que, num estudo publicado em 1990 pela Comunidade Europeia sobre o estado do ambiente, Portugal era identificado com 1800 locais contaminados.
Quando, no início de 1994, o Governo veio reconhecer os erros cometidos no processo anterior de implementação do sistema de tratamento de resíduos e anunciou a sua reformulação com uma nova programação, no seu dizer, mais transparente e participada, parecia que finalmente estávamos no bom caminho. Parecia mas não foi isso que sucedeu.
A promessa de que a decisão sobre novas opções e a localização das unidades do sistema seriam tomadas até final de 1994 mais uma vez não se cumpriu e, quanto ao processo, as razões de crítica aumentaram, generalizaram-se e subiram de tom.
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados, os factos são conhecidos. Ignorá-los ou contribuir para escamotear a realidade é algo que os Deputados da Assembleia da República não podem admitir. Por isso, exige-se reflexão sobre o que está a passar-se, ponderação sobre as razões do que está em causa e tomada de posição clara sobre o que possa afectar o interesse nacional.
Esta é a razão da declaração política do Grupo Parlamentar de Os Verdes e por que deixamos aqui o nosso contributo sério e responsável.
Vejamos alguns factos Dos cerca de 20 locais inicialmente identificados como susceptíveis de virem a ser escolhidos para a localização dos aterros controlados, restam neste momento quatro, dois na zona norte do país e dois a sul. Destes, pelos debates já havidos, constata-se o seguinte: sobre a proposta de aterro em Midões, concelho de Gondomar, um parecer da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto considera que a localização num afluente do rio Sousa contribuirá para o perigo de contaminação da bacia hidrográfica do Douro, dado que no local ocorrem rochas bastante permeáveis e fracturadas, aconselhando-se a realização de estudos melhor fundamentados para as escolhas dos locais. Entretanto, o presidente da câmara afirmou numa reunião pública que, se o aterro se localizasse em Gondomar, ele, Valentim Loureiro, se demitiria do cargo de presidente de câmara.
Em Cardal, concelho de Vagos, a proposta de localização é contestada pela sua proximidade das captações de água que abastecem Vagos, Ílhavo e Aveiro, tendo, em reunião pública, os técnicos da empresa que elaborou os estudos de localização confessado que se guiaram por cartas militares desactualizadas, o que obrigou a recorrer a observações aéreas que oferecem menores garantias de fidedignidade.
Em Barrancão, concelho de Alcácer do Sal, a câmara contesta a localização do aterro, porque afirma não ter havido por parte do Governo estudos sobre o local que permitam dar garantias para contrariar os pareceres que a câmara possui de que, além de se tratar de uma zona que garante o abastecimento de água a uma freguesia do concelho, está sujeito a intensa actividade tectónica deformante, sendo conhecida a existência de brechas e falhas que não dão garantias para a sua impermeabilização.
Em Vale de Madeiros, concelho de Santiago do Cacém, as autarquias contestam sobretudo o facto de esta proposta ter sido apresentada já na fase de divulgação da lista restrita para a localização dos aterros, o que indicia que a sua escolha não obedece a qualquer critério técnico ou outro merecedor de credibilidade.
Este é o quadro de opções que resta de uma escolha inicial de 20 localizações. E verdade que há ainda a dita garantia da avaliação do impacte ambiental mas, Srs. Deputados, os estudos de impacte ambiental só podem optar por um em cada dois já decididos, a norte e a sul. E os pareceres técnicos que se conhecem e a forma pouco credível que levou à escolha daquelas localizações, nas palavras dos próprios técnicos que fizeram a selecção, levarão certamente a uma maior radicalização e generalização de posições contrárias quanto aos locais escolhidos.
Face a tudo isto, como não podia deixar de ser, Os Verdes estão solidários com as populações e farão tudo para demonstrar que os estudos realizados não são suficientemente credíveis e que, por isso, deve ser repensado todo este processo de selecção de locais para os aterros controlados.
Esta falta de credibilidade passa por outros factos incompreensíveis como, por exemplo, a escolha dos locais para as incineradoras. Se os estudos de impacte ambiental foram realizados para quatro localizações (uma em Estarreja e três no distrito de Setúbal), não se compreende por que é que o Ministério do Ambiente já anteriormente tinha decidido que a localização da incineradora seria na zona sul, ou seja, no distrito de Setúbal, como se verifica num documento desse Ministério distribuído num fórum de debate com as autarquias e os técnicos envolvidos.
Porém, Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados, esta intervenção tem ainda a ver com outras razões relativas à opção de um sistema centralizado para os resíduos, como é proposto desde 1988 e por nós apoiado, e à opção de incineração.