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1771 | I Série - Número 44 | 02 de Fevereiro de 2001

 

prio e outros políticos, passávamos e passamos, agora já sem Egito Gonçalves (aliás, sem ele já desde há alguns anos), alguns momentos de são convívio e de profunda fraternidade.
Seria bom que a tradição das tertúlias pudesse permanecer em Portugal, pois são espaços de convivência verdadeiramente aceitáveis e que devem ser desenvolvidos.
É, pois, essa figura de um homem interessado, conhecedor e, sobretudo, altruísta, no sentido de que partilhava o seu saber com todos os outros, que hoje recordamos. É que, ao contrário de outros intelectuais mais egoístas, que se voltam para dentro de si próprios, ele não se importava de explicar as coisas do mundo como as via e compreendia, partilhando essa visão connosco. É essa imagem que quero guardar de Egito Gonçalves e é a solidariedade do Grupo Parlamentar do Partido Socialista que, através de mim, aqui apresento.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Neves.

A Sr.ª Helena Neves (BE): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Os poetas devolvem-nos um olhar, um outro olhar sobre a realidade e, nessa devolução, fazem-nos ver o mundo e a nossa vivência nele de outro modo.
Egito Gonçalves concedeu-nos um olhar empenhado. A sua palavra poética foi sempre comprometida com os homens presentes, com o tempo presente, por um outro futuro. Este empenhamento jamais vulnerabilizou a qualidade estética da sua obra. E se esta obra é, em si mesma, um apelo ao combate social, a vida quotidiana de Egito Gonçalves foi combate social. Envolveu-se em pequenas e grandes causas: pela libertação do povo, durante o regime fascista; pelo direito à cidadania; e, sempre, pela cultura como território transversal e fundamental em todo o processo de democratização.
Promoveu e participou num movimento associativo e cultural, sendo o Teatro Experimental do Porto, a Cooperativa Árvore, o Cineclube, a Associação de Jornalistas e Homens de Letras e a Sociedade Portuguesa de Autores exemplos desta plena participação. Não buscava visibilidade nem louros. Procurava apenas este imenso ainda por alcançar: um país em que seja possível toda a felicidade para todos.
O Bloco de Esquerda associa-se plenamente a esta homenagem, certo de que o Porto, que ele tanto amava, o assinalará na cidade como referência patrimonial para o futuro que ele tanto se empenhou a construir.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao longo de uma extensa vida, Egito Gonçalves pôde testemunhar grandes acontecimentos do século XX e mesmo provar o sabor do mel e do fel do século XXI.
Ao longo de toda a sua actividade, tanto no plano intelectual como no do empenhamento político directo, deu notáveis exemplos de capacidade de intervenção e de solidariedade humanista na dimensão em que ele se reconhecia como militante assumido do Partido Comunista Português.
Conheci-o na minha infância, primeiro como tradutor e, mais tarde, como um poeta de enorme ambição e discrição, mas presente nos actos fundamentais, insistente até aos últimos momentos.
Em nome do Governo, gostaria de me associar a este voto de pesar, transmitindo à família enlutada e ao PCP sentidos pêsames.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Rosado Fernandes.

O Sr. Rosado Fernandes (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero recordar aqui a forma como conheci a obra de Egito Gonçalves - foi exactamente depois do último exame de latim que fiz para entrar para a Faculdade de Letras. Tinha como colega um rapaz chamado José Fernandes da Silva, poeticamente mais conhecido por José Terra, muito ligado a uma cooperativa, que naquela altura era uma novidade, chamada Árvore e situada no Porto. Nessa altura, comecei a receber publicações da Árvore e as poesias de Egito Gonçalves - o nome «Egito» dificilmente se esquece!
Sabendo eu que se tratava de uma poesia engajada, como diziam os brasileiros (eu diria «comprometida», para evitar o francesismo), e sendo eu também um partidário da literatura e da arte pela arte - é verdade, sou um reaccionário confessado! -, faço minhas as palavras de Henry Miller. Quando George Orwell lhe disse que ia para as brigadas internacionais, Henry Miller disse-lhe que não fosse parvo, que não fosse, pois a sua função era fazer literatura. Mas Orwell lá foi e escreveu um magnífico livro, Homenagem à Catalunha, em que se refere à destruição do Partido Obrero de Unificación Marxista (POUM) por forças que não interessa referir aqui, pois todos conhecem a história de Espanha.
De qualquer maneira, para mim, Egito Gonçalves era um bom poeta. Conheci as publicações da Árvore e sei que ele estava ligado a esse meu querido amigo José Terra, que, como disse, foi também meu colega na Faculdade de Letras. Pertence, portanto, à «república das letras», mesmo que cometa o pecado de ser muito engajado. Contudo, engajado ou não, era um poeta, um bom poeta, pelo que lhe prestamos aqui a nossa homenagem, pois arte é arte, mesmo se comprometida, mesmo que não seja alegórica. Todos sabemos que Jonathan Swift escreveu contra a Inglaterra com As Viagens de Gulliver, só que é preciso ter o «diabo» da chave para encontrar a alegoria e onde é que está a crítica às forças inglesas.
Em nome da minha bancada, peço ao meu amigo portuense Honório Novo, que esteve comigo na Assembleia de Estrasburgo, que enderece as nossas condolências à família de Egito Gonçalves. Acreditem que é sempre com tristeza que vejo desaparecer um poeta, sobretudo um bom cultor da boa literatura, porque literatura de pacotilha há por aí muita e a dele não o era!

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, também eu penso que a poesia portuguesa perdeu um poeta sensível, mas não perdeu a sua poesia. Não é que a poesia nunca morra, mas, quando é boa, custa muito mais a morrer do que os poetas.
Recordo Egito Gonçalves como um homem da resistência, portanto os resistentes acabam de perder um compa