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1783 | I Série - Número 44 | 02 de Fevereiro de 2001

 

Constituição e das obrigações perante a Assembleia da República e os que pactuavam com o comportamento do Governo.
Era, todavia, claro para todos que ao Governo competia a decisão da participação nas operações no Kosovo. Ninguém, em qualquer momento, sustentou o contrário.
Mas o Governo, desde o início, enredou-se em silêncios e em evasivas.
À época, o que mais nos espantou foi a demora do Sr. Primeiro-Ministro em vir dar explicações ao Parlamento. Só duas semanas depois da intervenção do contingente militar português, o Sr. Primeiro-Ministro aqui veio e, mesmo assim, recusou-se a responder a perguntas óbvias.
Lembra, e bem, José Manuel Fernandes, director de Público, que «Nem António Guterres nem Jorge Sampaio tiveram a coragem de defender com frontalidade a intervenção a que, como responsáveis políticos, tinham dado luz verde. Tentaram evitar a desconfiança da opinião pública calando-se.»
Curiosamente, quem não teve hesitações em declarar que «(...) se levantam dúvidas sobre a legalidade desta acção, porque não terão sido respeitadas, no processo da correspondente tomada de decisão, as disposições da Constituição Portuguesa.» foi, nessa ocasião, o jurista contestatário Castro Caldas que não é outro senão o actual Ministro Castro Caldas e que estranhamente se mantém como partícula em suspensão.

Risos do PSD, do PCP e do BE.

É, portanto, entre aqueles que são acusados de se calar e o outro que falou em sentido contrário que os últimos acontecimentos se desenrolaram.
Não é de estranhar o resultado.
Ninguém o sintetizaria melhor do que o Deputado Medeiros Ferreira: «A discussão doméstica sobre os circuitos de passagem da informação da NATO entre dois órgãos de soberania distintos, como são o Governo e o Presidente da República, foi patética, confrangedora, deprimente. Um pouco mais de sentido de Estado não teria ficado mal a ninguém.»
Não queremos prolongar esta discussão. Não participámos nela, assistimos incrédulos.
O País ficou a perceber perfeitamente que todos tentaram empurrar entre si a responsabilidade e que o Primeiro-Ministro preferiu calar uma divergência com o Sr. Presidente da República, que já tocava a honorabilidade pessoal, tentando explicar o inexplicável e deixando os seus ministros, sem honra nem glória, pelas ruas da amargura.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Preferimos apreciar as questões substanciais que se levantam.
Do nosso ponto de vista, o Governo insistiu, quer antes, quer durante a intervenção no Kosovo, no secretismo e na negligência. O Governo recebeu informações que não transmitiu. O Governo não esclareceu os perigos a que os militares portugueses estariam sujeitos.
É aqui que a Assembleia da República pode e deve fundamentar o seu capital de queixa, muito especialmente as forças políticas que genericamente apoiaram, apesar de tudo e no quadro do que oficialmente se sabia, a intervenção.
A censura da referência ao perigo, mesmo negligenciável, foi qualquer coisa de incompreensível e de inadmissível. Aqui deve funcionar a regra da transparência. A confiança entre órgãos de soberania exige-o; a boa fé pressupõe-no. E o certo é que a informação tinha sido prestada e em tempo oportuno.
No meio de uma longa entrevista, sobre os erros e os desejos, o Sr. Primeiro-Ministro vem agora reconhecê-lo e assumir culpas: «Há um conjunto de regras e procedimentos em matéria de informação, em relação aos quais estaremos mais atentos. Quando digo mais atentos, isso implica outro critério de rigor e exigência». Exactamente o que não existiu.
Outros países, designadamente a Alemanha, tomaram iniciativas, efectuaram medições de níveis de radiação nos locais sob suspeita ainda em 1999; o Governo português andou à deriva, exibiu a maior desorientação, e só à última hora decidiu remediar os estragos, mais do que evidentes, provocados na opinião pública.
O Sr. Presidente da República, alegadamente desconhecedor dos factos, resolve reunir um Conselho Superior de Defesa Nacional apenas a 8 de Janeiro de 2001.

O Sr. António Capucho (PSD): - Veio tarde!

O Orador: - E só no parecer desse Conselho se encontram referências às cautelas a ter no futuro, designadamente, treino do pessoal, aquisição de equipamentos especiais de protecção e condicionamento da continuidade da missão a estas garantias.
Para corrigir o passado ficou apenas a decisão possível, a única decisão possível, e que decorre de uma obrigação verdadeiramente nacional: a realização de exames médicos a todos os cidadãos portugueses envolvidos e o seu acompanhamento ao longo do tempo.
O Estado é responsável por todas as consequências; o Estado, em nome de quem os cidadãos actuaram, deve responder sem evasivas.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Permanecem na opinião pública as maiores interrogações. Deve a ciência ocupar-se do esclarecimento de todas elas. Qual é a origem das mortes e das enfermidades? É o urânio? É o plutónio? São as radiações? São as partículas? É a ingestão de produtos contaminados? Não se sabe ainda ao certo, mas é urgente o esclarecimento.
A NATO não pode ser diminuída com a permanência destas dúvidas. A força da Aliança reside na sua superioridade moral, na indispensabilidade da obediência a regras de confiança. A NATO que não é um corpo estranho ao qual os governos aliados não têm ligação. A NATO, cujo Conselho Político decide as intervenções e no qual têm assento os Ministros dos Negócios Estrangeiros de cada país-membro ou os seus representantes.
Por isso, a decisão da NATO é a decisão de todos eles. Ninguém fica de longe a ver, participa nela. Por essa mesma razão, não deixa de ser absurdo que um Primeiro-Ministro pergunte ao Secretário-Geral aquilo que o seu Ministro dos Negócios Estrangeiros devia saber responder.
Mais: nestes termos, desconfiar da NATO é desconfiar das posições do seu Ministro dos Negócios Estrangeiros.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!