33 | I Série - Número: 029 | 21 de Dezembro de 2007
a seriedade e o valor do compromisso na vida política. Todos os partidos que hoje se encontram aqui, nesta Câmara, defenderam no seu programa eleitoral a ratificação popular. Não nos esquecemos também que foi este mesmo Parlamento que aprovou uma revisão constitucional, precisamente para permitir referendar o tratado europeu.
Sr.as e Srs. Deputados, recordemos o que está escrito no programa do Partido Socialista: «O Partido Socialista entende que é necessário reforçar a legitimação democrática do processo de construção europeia, pelo que defende que a aprovação e a ratificação do Tratado deva ser precedida de referendo popular».
Ouviram bem: «reforçar a legitimação».
Sr.as e Srs. Deputados, o Kosovo é, por estes dias, um bom exemplo — talvez o melhor exemplo — da diferença que vai entre a proclamação de uma Europa a uma só voz, de uma voz europeia independente e autónoma, e a realidade da política externa da União Europeia. É aqui que melhor se percebem os limites da tão famosa Política Externa e de Segurança Comum, sobretudo sempre que os Estados Unidos entram neste jogo. A independência não será certamente reconhecida na ONU mas Washington não vai esperar sequer 24 horas. E vários governos europeus seguirão e imitarão a Casa Branca. Consumar-se-á um novo facto político na Europa e para Bruxelas vai apenas sobrar a pesada factura dos acontecimentos.
Em termos práticos, nesta matéria, a Presidência portuguesa conseguiu apenas transferir o problema para «o senhor que se segue».
Sr.as e Srs. Deputados: A crise da Europa não é institucional, é política.
A construção europeia tem sido feita contra a própria ideia da Europa. É uma Europa do «menos»: menos protecção social, menos emprego, menos serviços públicos, menos poder de decisão para os cidadãos.
Nós, Bloco de Esquerda, somos europeístas por convicção e é exactamente por isso que estamos contra este Tratado. Acreditamos que, para resolver a crise europeia, só mesmo mais Europa. Uma Europa que tenha políticas transnacionais para a criação de emprego, de protecção social, de transportes públicos ou de defesa do ambiente. É isso que nos separa.
Temos a ambição de uma Europa maior, não uma Europa liberal como esta, que tem sacrificado os direitos sociais da maioria dos europeus ao critério único do lucro máximo para um mínimo de cidadãos.
A Presidência portuguesa decorreu como previsto, de acordo com a encomenda alemã — o Tratado foi assinado e o referendo enterrado. O resto reduziu-se ao festim mediático e às luzes de sucessivas cimeiras.
Quando os europeus não podem discutir a Europa, os governos saem-se sempre com as presidências.
Sr.as e Srs. Deputados, o Primeiro-Ministro assumiu um compromisso perante os portugueses: fazer um referendo. Agora, parece estar disposto a rasgá-lo e a substituí-lo por um outro, assinado com os seus parceiros europeus.
Caso o Partido Socialista abdique da sua palavra e o Governo rejeite o referendo, o Bloco de Esquerda reafirma que apresentará uma moção de censura que condene esta violação grosseira do Programa e dos compromissos do Governo. É o valor da confiança e a seriedade política que estão em causa e que confrontam a consciência de todos e de cada um de nós.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Lopes.
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: A terceira Presidência portuguesa da União Europeia está marcada, muito negativamente, pela assinatura de um Tratado, gravoso para o País e para a Europa.
Um Tratado que consolida o federalismo sob o domínio e comando das grandes potências, o neoliberalismo nas orientações económicas e sociais e o militarismo atrelado à NATO e ao imperialismo norteamericano.
Um Tratado que impõe novas mutilações da soberania nacional, como sucede com o registo da «conservação dos recursos biológicos do mar, no âmbito da Política Comum de Pescas como competência exclusiva da União» (alínea d) do artigo 3.º do Título I do Tratado).
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Ora aí está!
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Um Tratado que significa uma perda acrescida de capacidade institucional nos órgãos da União Europeia — perda de dois Deputados, de um Comissário permanente, de peso nas votações no Conselho Europeu.
Um Tratado que o estardalhaço mediático das «cimeiras», para desviar atenções de problemas internos e tentar passar a imagem de êxitos externos e reconhecimento internacional, não esconde a inaceitável cedência, por parte do Governo PS/Sócrates, aos interesses das grandes potências e grupos económicos.
Assim se ofendeu gravemente o n.º 1 do artigo 7.º da Constituição da República Portuguesa, que afirma que Portugal se rege, nas relações internacionais, pelos «princípios de independência nacional» e da «igualdade entre os Estados».
Mas é notável que sendo o Tratado, para os seus autores e defensores, uma obra-prima cheia de