31 | I Série - Número: 035 | 17 de Janeiro de 2008
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Num rasgo de sinceridade, lá deixou escapar que não quis comprometer o acordo assumido entre os dirigentes da União Europeia, à revelia dos povos dos países europeus, que era mais seguro despachar a coisa pela via da ratificação parlamentar! Mas, então, tantas loas e benzeduras ao Tratado e porquê tanto receio da consulta aos povos de cada país? O que faz correr os dirigentes da União Europeia? O que fez mudar o Primeiro-Ministro, José Sócrates? O receio está no conhecimento dos seus conteúdos! No conhecimento de que União Europeia está a ser construída e a quem serve.
Mas, em relação ao método, com aquela crispação que lhe é típica e querendo fugir às suas responsabilidades, critica, designadamente o PCP, porque é a favor do referendo sobre o Tratado e foi contra o referendo sobre a IVG.
Não se limpa, Sr. Primeiro-Ministro! Primeiro, não temos a concepção de que quem é a favor de um referendo tem de ser a favor de todos os referendos!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Segundo, no nosso compromisso eleitoral, defendemos o referendo sobre o Tratado e considerámos que a Assembleia da República tinha condições para aprovar uma lei sobre a IVG sem referendo. Nós não enganámos ninguém, os senhores é que enganaram!
Aplausos do PCP.
Terceiro, o Tratado implica questões de soberania nacional, soberania que a Constituição consagra como una e indivisível residente no povo português. A despenalização da IVG era uma grande causa social.
Quarto, foi o PS que, no seu programa eleitoral e no Programa do Governo, garantiu o referendo sobre a IVG e sobre o Tratado.
Avançou com um, renegou o outro. Isto, apesar de ter promovido uma revisão constitucional para permitir o referendo sobre qualquer tratado europeu.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Com a arrogância de quem não tem razão lá remata que é um europeísta e nós somos contra a Europa.
Um dia, Sr. Primeiro-Ministro, haveremos de discutir a diferença entre ser-se europeu e português e ser-se português e europeu, particularmente um Primeiro-Ministro que foi eleito pelos portugueses e não pelos europeus.
Vozes do PCP: — Muito bem!
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Mas a frase lapidar e propagandística impõe ir ao conteúdo do Tratado entendido como peça e não como fim de um processo de construção de uma União Europeia onde quem decide são os mais poderosos, como uma matriz e orientações neoliberais, federalistas e militaristas.
E, antes disso, sobre a Europa nós defendemos os princípios da independência nacional, do respeito dos direitos do homem, dos direitos dos povos, da igualdade entre Estados, da solução pacífica de conflitos internacionais de não ingerência nos assuntos interno de outros Estados, da cooperação com todos os povos para a emancipação e o progresso da humanidade. Somos contra esta construção desta União Europeia, da flexissegurança, do mercado transformado em «bezerro de ouro». Somos por outra, da que fala a Constituição da República.
Salvo uma intervenção anterior, a questão do método não é, de facto, uma questão pequena, mas quem nos estiver a ouvir conclui que uns querem o referendo, outros não querem, sem saber do que estamos a tratar. De repente, o Tratado é transformado «na coisa»! Com este Tratado, perdemos soberania. Desde logo porque a nova arquitectura do poder na União, a nova distribuição do poder no processo de decisão é realizado em detrimento dos países como Portugal.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — É uma evidência que Portugal perde força e capacidade de defender os seus interesses, enquanto outros reforçam as suas posições e poder de decisão nas instituições supranacionais da União Europeia. Aliás, podemos verificar que quase todos — excepto Portugal, obviamente! — «puxaram a brasa à sua sardinha».