I SÉRIE — NÚMERO 50
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Segundo exemplo: o novo capítulo destinado a determinar desvios orçamentais significativos e a introduzir
mecanismos de correção — artigos 72.º-B, 72.º-C e 72.º-D. Quem é que o Governo quer colocar a emitir
parecer e a reconhecer a existência de desvios orçamentais significativos? Será que quer ver o Parlamento a
fazer isso? Não! Quer ver a fazer isso o Conselho das Finanças Públicas.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — O que é isso?! Não conheço!
O Sr. Honório Novo (PCP): — O Conselho das Finanças Públicas ou o Conselho da União Europeia é que
reconhecem a existência de desvios orçamentais significativos.
Quem é que o Governo quer que aprecie os planos de correção dos desvios orçamentais? Só poderá ser o
Parlamento! Só o Parlamento deve apreciar os planos de correção — dirão todos os Srs. Deputados. Não,
nada disso! O Governo quer que seja o Conselho das Finanças Públicas. A Dr.ª Teodora Cardoso e os seus
muchachos é que vão apreciar os planos de correção dos desvios orçamentais, enquanto ao Parlamento o
Governo quer entregar apenas os planos de correção, limita-se a entregar os novos planos de austeridade.
Será que o Governo e a União Europeia não querem antes extinguir o Parlamento e substitui-lo pelo
Conselho das Finanças Públicas? Será que o Governo e a União Europeia não querem, se calhar, extinguir a
democracia em Portugal e rasgar a Constituição da República Portuguesa?
Aplausos do PCP.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É uma chatice o Parlamento!… Só estorva!
A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Filipe Soares.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro da Economia, aliás, Sr. Ministro das
Finanças — parece ter a tutela quer da Economia quer das Finanças, afinal, é o braço-direito do Primeiro-
Ministro —, dizia o senhor, em declarações feitas nesta Assembleia no passado, que o crescimento não se
decreta. O crescimento não se decreta, o cumprimento do défice também não se decreta — vejamos, por
exemplo, o cumprimento do défice deste Governo em 2011 e em 2012 —, e bem queria decretá-lo o Governo,
mas só com medidas extraordinárias é que lá chegou. Mas quer o Governo decretar que haja um País
submisso às regras de pagamento da dívida, porque é, nada mais, nada menos, isso que nos traz na proposta
de lei.
O que nos dizem estas alterações à lei de enquadramento orçamental é que a voz de Merkel mandou na
Europa e que a sua palavra chega a Portugal pela voz do Ministro Vítor Gaspar.
Dizia o Sr. Ministro que a democracia se deve submeter ao cumprimento de regras orçamentais de médio
prazo, e não apenas de curto prazo, mas não é disso que falamos. Esta proposta significa submeter a
democracia e o País ao pagamento da dívida, é a política do «pague-se custe o que custar», mesmo que isso
constitua mais desemprego, mais recessão e mais falências.
A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Muito bem!
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — E não existe qualquer regra de maior transparência ou de maior
segurança até de cumprimento de regras orçamentais. Não. Olhamos para o que é a prática deste Governo e
vemos que não é assim. De facto, a dívida aumentou com este Governo para lá do que era previsto e o défice
só foi alcançado com medidas extraordinárias. Por isso, não é decretado, o que há aqui é chantagem, e essa,
sim, será letra de lei com esta proposta que o Governo traz hoje à Assembleia da República.
Sr. Ministro, há um ponto que eu gostava que esclarecesse. Sei que não é apenas um «propagandeador»
das palavras de Ângela Merkel, que não é apenas submisso à austeridade na Europa também na versão
portuguesa — esta é a sua opinião —, mas na proposta de lei que hoje traz a debate, naquelas regras que a
lei implica do ponto de vista da gestão da dívida pública, o Sr. Ministro propõe-se alcançar aquilo que nunca,
desde os anos 70 do século passado, foi alcançado, que é um excedente primário superior a 4% até 2020 e
daí para a frente superior a 3%.