I SÉRIE — NÚMERO 89
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O que se passa é que esta lei-quadro não defende nem define essa autonomia. Pelo contrário, na
interpretação de um ilustre Deputado da maioria até é o Governo que faz o acompanhamento hierárquico da
entidade reguladora, contra tudo e contra toda a doutrina e prática das entidades reguladoras.
Quais deveriam ser, então, os grandes objetivos? Primeiro, proceder, como disse, a uma constituição das
entidades reguladoras que pudesse conviver com as várias políticas dos diversos Governos no domínio da
macroeconomia. Deste modo, governos com maior ou menor intervenção económica teriam sempre, na lei-
quadro, uma boa convivência, não sendo necessário alterá-la.
Em segundo lugar, como é que se consegue a autonomia e a independência das entidades? Com
autonomia orçamental e ao nível da nomeação dos responsáveis. Não somos contra a nomeação dos
responsáveis por parte do Governo, mas, então, a Assembleia da República não se pode limitar a dar parecer,
tem de dar parecer favorável, porque isto é que garante, obviamente, a autonomia e a independência das
entidades reguladoras.
Depois, em relação à fiscalização, quem é que pode fazer a fiscalização? A Assembleia da República. Não
há nenhuma outra entidade que possa fazer a fiscalização, a não ser a Assembleia da República.
Em relação aos recursos hierárquicos ou graciosos das decisões da entidade reguladora, vamos continuar
a admiti-los, como aconteceu com a Autoridade da Concorrência, quando foi o caso das concentrações, ou,
pelo contrário, vamos eliminá-los, para lhes dar ainda maior autonomia? É uma questão que deve e tem de ser
discutida.
O que o Sr. Secretário de Estado aqui nos veio trazer foi a discussão de estatutos, de estatutos do
regulador, de estatutos do pessoal. É uma lei puramente regulamentar, que espartilha os diversos estatutos
das diversas entidades, não dá autonomia às diversas entidades para, depois, em liberdade, se auto-
organizarem.
Por isso, esta lei, com toda a franqueza, é uma lei em relação à qual nos vamos abster, mas vamos abster-
nos com uma pergunta muito clara ao Governo e à maioria, no sentido de saber se estão disponíveis para, em
sede de especialidade, podermos introduzir as alterações necessárias para mudar o rumo desta lei. É que, se
não fosse esta a expectativa, o voto que esta lei merecia, depois da intervenção do Sr. Secretário de Estado,
era o voto contra. Em função desta espectativa, vamos abster-nos, mas é uma abstenção condicionada à
aceitação de propostas que alterem o essencial desta proposta, que é ineficaz, inaceitável e prejudicial ao
funcionamento da economia.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado
Michael Seufert.
O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado da Administração Pública, em
relação à lei-quadro que aqui nos traz, naturalmente, o quadro regulamentar e a independência das entidades
reguladoras é de alguma fineza legislativa, porque entendemos que não é fácil equilibrar o recrutamento das
pessoas mais capazes, mais conhecedoras e mais bem preparadas numa determinada área com a
necessidade de garantir a independência das entidades e que não haja conflitos de interesses.
Por isso, quando aqui, na lei, se é muito claro em relação a questões como o período de nojo, as
incompatibilidades, as limitações ao exercício de funções, após a saída das entidades reguladoras, parece-me
que há avanços muito importantes, que são transversais a todo o tipo de regulação e não apenas a regulações
setoriais muito concretas.
Mas, por outro lado, também nos parece que é necessário e importante atender às circunstâncias do País e
àquilo que se aplica, noutros contextos, a outros setores de ação do Estado, não necessariamente
reguladores, mas em que também existem problemas de incompatibilidades, de limitações, de conflitos de
interesses, e tudo mais.
Sendo assim, Sr. Secretário de Estado, aquilo que gostaria de perguntar, não obstante, na comissão de
vencimentos que está prevista no artigo 26.º, haver, digamos assim, uma maioria do Governo — numa
comissão de três elementos, dois são indicados por responsáveis do Governo —, era se, face à necessidade
de haver alguma contenção, ao nível daquilo que se pratica no setor empresarial do Estado, por exemplo, e