O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

I SÉRIE — NÚMERO 40

24

Estamos perante uma mistura explosiva de obsessão ideológica, incompetência prática e entorses

procedimentais. O Ministro não pode deixar de se explicar aos portugueses.

Mas, Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, este novelo emaranhado em torno da Fundação para a

Ciência e Tecnologia é apenas um sintoma de que algo de profundamente grave se está a passar na ciência

em Portugal.

Nos últimos 15 anos, a conjunção de políticas determinadas com o esforço das empresas permitiu que o

nosso País tenha dado um significativo salto qualitativo nos seus indicadores de inovação e ciência. Nestes

dois domínios, deixámos os últimos lugares do pelotão europeu para nos posicionarmos na média do quadro

da OCDE, quer em termos de investimento, quer em termos de resultados.

Portugal tornou-se o país do Sul da Europa com os melhores indicadores em ciência, tecnologia e

inovação. Ora, o capital humano altamente qualificado de que dispomos constitui o mais forte antídoto

estrutural contra a crise. É com esse capital humano qualificado que podíamos, e ainda podemos

parcialmente, contar para voltar a crescer e voltar a gerar emprego nos setores de ponta e nos setores

tradicionais, para equilibrar as contas públicas, para restabelecer a saúde da economia e para assegurar a

sustentabilidade do modelo social.

Mas, infelizmente, Sr. Deputado Luís Montenegro, não foi essa a escolha do Governo. Com este Governo,

o investimento em ciência em Portugal regrediu 15 anos. Voltámos ao nível de onde partimos para chegar até

aqui. Os senhores estão a destruir um património de valor incomensurável.

Passos Coelho e Nuno Crato, ao mesmo tempo que, impudicamente, se congratulam com os sucessos

científicos e empresariais que o investimento feito no passado tem permitido a Portugal alcançar hoje,

decidiram arrasar orçamentalmente a ciência e a inovação, «convidando» os jovens investigadores e as

empresas inovadoras a emigrarem do nosso território e a criarem valor fora de Portugal.

E o problema, Srs. Deputados, é que uma base científica e tecnológica nacional leva décadas a construir

mas pode ser rapidamente destruída por uma obsessão ideológica distorcida.

A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Muito bem!

O Sr. Carlos Zorrinho (PS): — E é este o risco que corremos, não por devaneio ou incompetência, mas

por escolha ideológica trágica e deliberada.

O modelo de ajustamento económico de que os senhores se vangloriam e que o Governo privilegia não

aposta no conhecimento nem aposta no valor acrescentado. Pelo contrário, aposta no empobrecimento, no

posicionamento da economia portuguesa como replicadora e fornecedora de componentes e não como uma

economia inovadora e posicionada na fronteira tecnológica nalguns setores.

Os senhores escolheram travar a batalha titânica da concorrência no mundo global usando como chamariz

a precaridade e a mão de obra barata, em vez de usarem o investimento que fizemos ao longo de anos na

ciência, na investigação e na inovação.

Os bons resultados que conseguimos no plano científico são fruto de investimentos estratégicos

continuados e persistentes.

O desinvestimento que este Governo está a fazer no ensino superior e no sistema tecnológico e científico

tem, é verdade, um efeito imediato na vida de muitos jovens qualificados que se veem forçados a deixar o seu

País, mas demorará algum tempo a matar a dinâmica científica que conseguimos gerar. Mas quando essa

dinâmica for morta, nessa altura viveremos, como já o disse anteriormente, um «inverno científico», e este

Governo, esteja onde estiver, será responsabilizado por isso. Porém, o problema é que o preço serão todos os

portugueses a pagá-lo. E não será um preço pequeno.

É por isso que a sociedade portuguesa tem de indignar-se. É por isto que o Governo tem de ter — e espero

que a tenha aqui, amanhã — a lucidez de recuar.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Zorrinho (PS): — Tocou o alarme na ciência em Portugal. Temos de contrapor, à cegueira

ideológica como escolha, a lucidez de quem tem uma visão e um desígnio para este País. Precisamos de um

novo rumo para Portugal.