I SÉRIE — NÚMERO 84
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trouxe. Se é verdade que a criação de riqueza recuou 14 anos — tivemos cortes nas pensões, nos salários, no
complemento solidário para idosos, aumentos de tudo e mais alguma coisa —, é igualmente verdade que ao
nível da energia, do gás e da água também tivemos aumentos. Tivemos, desde logo, o aumento do IVA e isso
foi um fator que muito acresceu às dificuldades das famílias.
E nos últimos três meses o Governo voltou a reciclar as promessas, porque nós já vimos este filme. Há
dois anos, o Ministro Álvaro Santos Pereira e o Governo anunciaram a tarifa social da eletricidade e estimaram
os beneficiários em 700 000. E andaram durante mais de dois anos a fazer essa propaganda. Mas, mais uma
vez, a palavra do Governo não condiz com a realidade e a realidade não condiz com a propaganda. Feitas as
contas, depois de muito perguntar, chegámos à conclusão de que existem apenas, e só, 60 000 beneficiários.
Na realidade, dos 700 000 passámos para 60 000 beneficiários da tarifa social da eletricidade.
E o que é que o Governo deveria fazer? Assumir o falhanço da sua promessa? Não o fez! Assumir que
incumpriu aquilo que prometeu? Não o fez! Aquilo que o Governo fez foi reciclar a promessa e, portanto, no
dia 25 de abril, anunciou uma nova promessa: vamos reformular a tarifa social da eletricidade, mas agora
vamos ter 500 000 beneficiários — em termos de agregados, 1 milhão e meio de portugueses, diz o Ministro
Jorge Moreira da Silva. E se falássemos do gás poderíamos ir à mesma promessa, porque só temos cerca de
1500 beneficiários da tarifa social do gás. Por isso, o que temos é um Governo que não cumpre, faz
propaganda e vai recauchutando as suas promessas.
Termino, Sr. Presidente, perguntando ao Deputado Pedro Filipe Soares se tem alguma esperança que se
implemente, de facto, e como deve ser, a tarifa social da eletricidade e se tem alguma explicação para o facto
de o Governo reciclar as suas promessas, quando não faz cumprir aquilo que já está em vigor.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Filipe Soares.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Rui Paulo Figueiredo, agradeço a sua
opinião e as suas perguntas e devo dizer-lhe que, em política, não é muito tradicional o que o Governo fez.
Regra geral, quando toca a propaganda (e ainda para mais com políticos tão experimentados como
aqueles que estão no Governo), tende a ver-se um crescendo. Por isso, seria de esperar que quem, há dois
anos, prometia 700 000 cidadãos a usufruírem da tarifa social da eletricidade — e, dado que quiseram
reapresentar a proposta, não esperávamos um reconhecimento do falhanço — agora pudesse aumentar essa
propaganda e, por isso, até subir esse número. Ora, tivemos o contrário, uma redução: 500 000 cidadãos.
É certo que não esperamos que saia do papel. Bom seria se assim fosse, porque sabemos que os preços
da eletricidade em Portugal são um roubo e toda a gente percebe isso. A EDP não deixa de apresentar lucros
chorudos, ano após ano, e mesmo aqueles que dizem «bem, mas não é só em Portugal que faz o seu
trabalho» sabem que só de Portugal são mais de 500 milhões de euros de lucro, numa atividade em grande
parte regulada, e não vemos uma redução do custo para as famílias, pelo contrário, ou sobe muito ou sobe
menos um bocadinho, mas vai sempre subindo, mesmo na tarifa social da eletricidade.
Depois de se terem apresentado de peito feito ao País no 25 de Abril, dizendo «não, nós temos agora uma
grande medida para responder ao acesso a um bem essencial como a eletricidade», e depois de todas as
acusações que fiz na minha intervenção e que desmontam toda a argumentação deste Governo e dão conta
da inexistência, na realidade, de uma política de apoio às pessoas para o acesso a um bem essencial, vemos
que a maioria calou, porque consentiu.
À acusação de que o Governo não tem uma política para garantir o acesso das pessoas à eletricidade, a
maioria calou, porque consentiu; à acusação de que a maioria permite o abuso da EDP e que esse abuso
retira às pessoas o acesso a um bem essencial e parasita a nossa economia, a maioria calou, porque
consentiu; à acusação de que a maioria não tem como responder a estas pessoas…
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr. Deputado.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — … para acederem a bens essenciais e as deixa ficar para trás, em
pleno século XXI, sem eletricidade, a maioria calou, porque consentiu.