I SÉRIE — NÚMERO 48
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O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sim, Sr.ª Presidente.
Portanto, é natural que essa quebra se tenha refletido nos valores globais. Por isso, aliás, é que devemos
ser muito cuidadosos no desconfinamento, para evitar outra lógica de para-arranca, porque isso contribuirá
novamente para que a economia não possa levantar-se.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — É agora a vez do Grupo Parlamentar do Partido Socialista. Para o efeito,
tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Pisco.
O Sr. Paulo Pisco (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, Sr.as e Srs. Secretários de Estado, nós vivemos um
tempo de pandemia, mas o PSD parece que ficou cristalizado no tempo, ainda em janeiro de 2020. Tal significa,
em primeiro lugar, que parece que está fora da realidade não só em relação às políticas para as comunidades,
que são, claramente, uma das nossas prioridades, mas também em relação a todas as outras matérias.
Sr. Ministro, Portugal assume a presidência do Conselho da União Europeia precisamente no momento de
viragem nas relações internacionais, o que é uma excelente oportunidade para, mais uma vez, podermos deixar
uma marca própria, como aconteceu nas presidências anteriores, com a Estratégia de Lisboa e também com o
Tratado de Lisboa. Podemos fazê-lo dando o nosso contributo para a reforma das organizações multilaterais e
para a convergência com os Estados Unidos, na defesa dos valores da democracia, dos direitos humanos e de
um mundo em que os autocratas já não podem fazer o que lhes apetece.
A União está mais assertiva na defesa dos valores, mais determinada a encontrar o seu lugar no mundo e
em fazer ouvir a sua voz. Por isso, é um excelente sinal a recente aprovação do novo mecanismo de sanções
por violação dos direitos humanos e da determinação em avançar para a reforma das organizações multilaterais,
a começar pelas Nações Unidas e pelas suas agências.
O mundo precisa de instituições multilaterais operantes para proteger as pessoas das guerras, das injustiças,
da pobreza, das doenças e da degradação ambiental. Precisa de um Conselho de Segurança com mais
membros, sem que o direito de veto esteja transformado num instrumento para eternizar conflitos dramáticos,
de que a Síria é um dos tristes exemplos.
Depois deste período de deriva e de distanciamento da Administração Trump, percebemos hoje melhor que,
sozinha, a União Europeia não tem capacidade para projetar os seus valores, precisando, para isso, de aliados
fortes. Esses aliados não são nem a China, nem a Rússia, nem a Índia, nem a Turquia, com quem temos outro
tipo de vínculos, porventura até bastante importantes, mas não aqueles que são constitutivos da nossa
identidade assente nos valores humanistas e na defesa das liberdades.
Sr. Ministro, até onde pode ir a União Europeia na defesa dos seus valores e na reforma das organizações
multilaterais? Estará à altura de ser um igual na relação com os Estados Unidos? Terá capacidade para procurar
o justo equilíbrio entre o diálogo, a cooperação e a necessidade de firmeza, quando os nossos interesses e
valores estão em jogo? Terá condições para enfrentar eficazmente desafios como o da ascensão da China ou
o das provocações da Rússia?
É precisamente neste contexto de transformação que o Eng.º António Guterres apresenta a sua candidatura
a um segundo mandato nas Nações Unidas, ele mesmo a expressão da nossa vocação universalista, como o
são as comunidades portuguesas no mundo — um dos nossos mais preciosos ativos — e o esforço muito
importante de expansão da nossa língua e cultura por todos os continentes, do ensino básico às universidades,
como, de resto, o Sr. Ministro também referiu.
Esta é, claramente, uma candidatura que une o País, que nos enche de orgulho e que dá, mais uma vez, a
oportunidade à nossa diplomacia para mostrar a sua desenvoltura.
De todas as vezes que se apresentou a um lugar nas Nações Unidas, António Guterres conquistou-o por
mérito próprio, pelo seu humanismo inquebrável e pela sua experiência política ao serviço dos povos.
António Guterres tem sido perentório na defesa das vacinas como um bem público global, acessível e
económico para todos, em todo o lado, e não como alguns países têm feito, utilizando-as como um instrumento
perverso da geopolítica, para troca de favores ou ganhos de influência.