O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

I SÉRIE — NÚMERO 64

48

escravo e de máfias ligadas ao tráfico de seres humanos. Não é coisa pouca o que se passa e ninguém aqui

tem o direito de fechar os olhos.

Este é um problema não apenas de direitos humanos — e, se fosse, já era suficientemente grave —, mas

também ambiental, complicado. Lembro que, em 2011, quando foi feito o Plano de Ordenamento do Parque

Natural do Sudoeste Alentejano e da Costa Vicentina, o Bloco de Esquerda, logo na altura, afirmou que a

política que estava a ser levada a cabo, de acabar com a exploração extensiva, de afastar moradores e

povoação, para dar lugar a uma produção intensiva, iria criar problemas graves, tanto do ponto de vista

ambiental como do ponto de vista social.

Mas, na verdade, PS, PSD e CDS estiveram de acordo em que naquela região devia existir produção

intensiva e fecharam os olhos tanto aos problemas ambientais como aos problemas de direitos humanos.

As estufas foram crescendo e os problemas foram-se agravando. Em 2015, com as associações

ambientais e as associações de imigrantes alertando sistematicamente para todos os problemas e com base

nos relatórios da Polícia Judiciária e do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, o Bloco de Esquerda apresentou

uma proposta no Parlamento sobre o trabalho forçado, para responsabilizar toda a cadeia pelo abuso dos

direitos humanos.

O PS acompanhou-nos, nessa altura, e fizemos uma lei para combater o trabalho forçado. Essa lei, de

2016, tem tido, sabemos, dificuldades de aplicação, desde logo porque, para conseguirmos processar toda a

cadeia que ganha dinheiro à conta da exploração daqueles trabalhadores, precisamos, primeiro, de condenar

a empresa que os colocou naquela circunstância. Porém, aquelas são empresas que se formam na hora,

esfumam-se num minuto e, depois, nunca são condenadas. Por isso, queremos melhorar a lei e queremos

mais fiscalização.

Mas, como digo, aqui, no Parlamento, já se discutia, porque já se sabia, que havia trabalho forçado. Este

continua a aumentar e a fiscalização aumentou muito pouco.

Protestos do Deputado do CDS-PP João Pinho de Almeida.

Em 2018, Capoulas Santos, então Ministro da Agricultura, decide fazer um despacho em que diz que as

estufas podem crescer sem avaliação de impacte ambiental. E as estufas continuaram a crescer. Continuaram

a crescer as estufas e continuou a crescer o número de pessoas a trabalhar sem nenhuma condição.

Em 2019, o Governo faz um despacho para legalizar o facto de as pessoas estarem em contentores. Não

falarei agora do que disse o Bloco de Esquerda na altura, porque também falei sobre isso, mas vou citar

Helena Roseta, Deputada eleita pelo Partido Socialista, que disse o seguinte: «Os contentores são agora

equiparados a estruturas complementares da atividade agrícola, como se a habitação para os trabalhadores

fosse a mesma coisa do que o armazenamento de alfaias agrícolas.» E dizia mais: «Meter 16 pessoas em

quatro quartos viola o mínimo de privacidade individual que a Constituição e a lei impõem.» Acrescentava

mesmo, e com toda a razão, o seguinte: «Estamos a assistir à institucionalização de uma espécie de campo

de refugiados para trabalhadores agrícolas estrangeiros no Alentejo.» Tinha toda a razão!

E a questão é que, se já sabíamos que há um enorme problema ambiental e de direitos humanos no

Parque Natural do Sudoeste Alentejano e da Costa Vicentina com esta produção intensiva, é bom olharmos

para os números, porque, em 2019, no Perímetro de Rega do Mira, já havia 1200 ha em estufas e similares e,

pelo menos, em números conservadores, 6000 a 8000 trabalhadores nestas estufas, só em Odemira.

Ora, se nada for feito, se nada for travado, podem continuar a crescer as estufas e podemos chegar a 4800

ha e mais de 24 000 trabalhadores nestas circunstâncias.

As associações ambientalistas já chamaram a atenção para que isto é também um problema ambiental. A

barragem de Santa Clara tem níveis de água abaixo daquilo que é necessário para que haja rega agrícola, e

continuam a tirar água.

Além disso, o grupo de trabalho que acompanha a situação no perímetro de rega do Mira já veio alertar

para que se estão a fazer ilhas, ou seja, guetos destes trabalhadores que são, do ponto de vista social,

explosivas.

Mas no grupo de trabalho diz-se mais, diz-se que esta situação é tão mais incompreensível quanto estes

trabalhadores, na verdade, não são sazonais, porque trabalhando em culturas diferentes acabam por ter

trabalho todo o ano.