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31 DE OUTUBRO DE 2023

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Sr. Primeiro-Ministro, o Governo não tem o direito de dizer, nem aos profissionais nem ao País, que cabe

aos médicos a responsabilidade de manter as urgências abertas e que, para isso, têm de se sujeitar a uma vida

impossível e a horários de trabalho impossíveis.

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Claro!

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Essa responsabilidade não é dos médicos.

O Governo até pode achar que, à medida que o inverno avança e que as dificuldades no SNS se acumulam,

os médicos irão acabar por aceitar a legalização do abuso do trabalho extraordinário. Nesse caso, tudo ficaria

na mesma e o Governo continuaria a recusar o que é essencial: propostas e condições remuneratórias que

permitam atrair e fixar médicos no SNS.

O Sr. Primeiro-Ministro diz que «não há médicos» e «não inventamos médicos». Pois não, mas, em 2022,

houve mais de 1000 médicos que rescindiram com o SNS porque não aguentaram as condições de trabalho

que estão a ser impostas pelo Governo.

Esta chantagem mal disfarçada que o Governo vai fazendo, e que é uma tentação, baseia-se num equívoco

e Portugal já percebeu que só vai ter SNS no futuro se os médicos continuarem a resistir a esta ideia absurda

que o Governo quer impor. Ninguém compra nem percebe a ideia peregrina de que um trabalhador deve aceitar

trabalhar o seu ano de trabalho e, depois, aceitar mais um, dois, três, quatro meses de trabalho extraordinário

para assegurar um compromisso que foi assumido pelo seu empregador.

É que, neste caso, o empregador dos profissionais de saúde é o Governo e a obrigação de manter o

compromisso é do Governo.

Os portugueses pagam impostos para terem um SNS com profissionais e onde a lei seja cumprida. Os

portugueses pagam impostos para terem um SNS que responda e que respeite os profissionais, não pagam

impostos para verem o Governo atribuir as consequências da sua própria incapacidade aos profissionais de

saúde.

Ainda para mais, Sr. Primeiro-Ministro, enquanto vai arrastando estas negociações e deixando que se instale

esta confusão no SNS, o Governo faz gala — faz gala! — do dinheiro que sobra ao final do ano e até anuncia

que o vai guardar numa espécie de fundo soberano. Um fundo soberano!

Lá fora, os países ricos, aqueles que têm gás e que têm petróleo, constituem fundos soberanos para financiar

serviços públicos futuros. Em Portugal, para financiar o seu fundo, o Governo vai buscar o dinheiro que falta nos

serviços públicos, vai buscar o dinheiro que falta para fazer funcionar o SNS e para fazer funcionar a educação.

Aplausos do BE.

Sr. Primeiro-Ministro, quando o Serviço Nacional de Saúde não tiver cura, não será o seu fundo soberano

que vai conseguir resgatar esse enorme problema democrático com que Portugal vai ficar. Por isso, pergunto-

lhe, de uma forma muito clara, se vai chegar a um acordo com os profissionais de saúde que respeite o seu

tempo de trabalho e a sua capacidade de conciliarem o trabalho com a vida pessoal e familiar ou se vai insistir

nessa ideia de que o excedente não pode ser gasto a salvar o SNS — aquilo a que o Sr. Ministro Fernando

Medina chamava «a reivindicação do momento».

Salvar o SNS é, sim, a reivindicação do momento e é a única que nos protege para o futuro.

Vozes do BE: — Muito bem!

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Queria fazer-lhe uma outra pergunta, muito breve.

Independentemente do valor, a proposta de aumento do IUC é errada. Ela é errada fiscalmente, porque

penaliza segmentos mais desfavorecidos da população, e é errada do ponto de vista ambiental, porque só serve

para virar uma parte da população contra uma transição climática que é urgente e que tem de ter atrás de si, a

suportá-la, uma maioria social.

Se o Governo quer proteger o clima e está interessado nisso, sugiro-lhe que comece pelos resorts de luxo a

serem construídos em zona protegida.