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11 DE ABRIL DE 1980

568-(207)

da República, deixou de reproduzir a disposição daquele decreto-lei, que excluía da competência de intervenção do Provedor as forças armadas.

Ora, esta supressão daquela disposição proibitiva expressa não pode deixar de significar que hoje o Provedor pode e deve intervir iia averiguação e apreciação de queixas que lhç sejam dirigidas por cidadãos, ainda que militares, contra actos administrativos das forças armadas, pois até se assim não fosse se violaria o preceito do artigo 24.° da Constituição, que faculta aos cidadãos — todos eles — o direito de se queixar ao Provedor, e o princípio da igualdade de todos perante a lei, criando uma classe à parte de cidadãos, os militares, aos quais aquele direito era retirado.

E violaria frontalmente as disposições do artigo 18.° do Estatuto do Provedor, já que criaria uma exclusão de competência que ele não comporta, pois só os actos políticos dos Órgãos de Soberania estão excluídos da competência do Provedor, o que significa que na sua competência cabem os actos administrativos desses órgãos, sem distinção entre eles.

Por isso, o Provedor intervém nos actos administrativos do Governo, nos actos não jurisdicionais dos tribunais, não se justificando, portanto, que não proceda de igual modo, quanto aos actos administrativos das autoridades militares, até mesmo se forem do Conselho da Revolução.

Logicamente, e no que respeita ao caso concreto desta reclamação, e dado que o chefe do Estado-Maior do Exército é hoje, por força legal, o Ministro do Exército, tendo, pois, funções quando como tal, de parte do Órgão de Soberania que é o Governo, a presente reclamação só não poderia ser apreciada pelo Provedor se atacasse um acto político, e não um acto administrativo.

Ora, não é esse o caso.

Sem nos determos na análise das várias doutrinas que a tal respeito têm sido expostas e defendidas, desde as que procuram definir o acto através do seu móbil ou fim político, passando pelas da causa objectiva do acto, ou o acto administrativo substancialmente imputável à vontade de um órgão do Governo, com base em motivos estranhos à ordem jurídica, ou o que enquadra o acto político na função do Governo, até à de Georges Bordeau, segundo a qual um acto administrativo só se traduz em acto essencialmente político, de exclusiva função governamental e não administrativa, quando visa a definir, a criar, uma orientação de carácter essencialmente político, por isso livre e incondicionada não resultante de exercício de qualquer outra faculdade concedida ou prevista em disposição já existente do direito positivo (esta a doutrina que perfilho e à qual acrescento apenas que a liberdade e incondiciona-lidade de criação de uma orientação tem, todavia, o limite do respeito pela lei constitucional).

Mas, como é evidente, o acto do chefe do Estado-Maior do Exército ao negar autorização ao major Otelo Saraiva de Carvalho para se deslocar ao estrangeiro não é um acto político que caiba nas definições de qualquer daquelas doutrinas, mas um simples acto administrativo, que se con-

funde até com uma medida de segurança.

E não obsta a tal entendimento a circunstância de através desse acto se ter procurado exercer um fim político, não no sentido técnico e próprio de criação de orientação política, mas sim no sentido estrito de obter fins políticos num caso coiicreto e pessoal, o que logo lhe tira o carácter político iio seu sentido próprio ou técnico, porque nele se não contém um critério criado de orientação geral, logo abstracto.

Ê por isso mesmo que actos como este de que nos ocupamos escapam à proibição de recurso contencioso administrativo que se contém no n.° 2 do artigo 16.° do Decreto-Lei u.° 40 768, como entre outros sustentam Marcelo Caetano, no Manual de Direito Administrativo, 7.* edição, 773, e 8.* edição, 8; Furtado dos Santos, no Dicionário Jurídico da Administração Pública, vol. 1.°, p. 129 e 130, Almeida Ferrão, em Questões Prévias e Prejudiciais, do Contencioso Administrativo, p. 200, e está consagrado no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 24 de Junho de 1960 (Colecção 26, p. 659), quando doutrina que «acto essencialmente político não é todo e qualquer acto para cuja prática tenham contribuído, mais ou menos intensamente, preocupações ou objectivos de ordem política, mas apenas os actos pelos quais o Estado exerce a sua função pública, ou sejam, aqueles cujo objecto directo e imediato consiste na conservação da sociedade política ou na definição e prossecução do interesse geral».

Ê por de mais evidente que o acto pelo qual se nega autorização a um militar determinado para se deslocar ao estrangeiro não é um acto que tenha por objecto directo e imediato a conservação da sociedade política ou a definição e prossecução do interesse geral, mediante a livre escolha dos recursos ou das soluções consideradas preferíveis.

Não se trata de um acto definidor de uma orientação política de Governo com vista ao interesse geral, mas tão-só de um acto particular, digamos pessoal, do chefe do Estado-Maior do Exército, na sua qualidade de Ministro do Exército, que. procurando fazer escudo de um diploma legal, pretende impedir um adversário político de realizar uma deslocação ao estrangeiro que não agrada à sua opinião pessoal.

E, pois, e apenas, um acto administrativo, pois representa a conduta voluntária de um órgão da administração militar, no exercício de um poder público que uma disposição legal preexistente lhe atribui, para produzir efeitos jurídicos num caso concreto, que mais não é do que a aplicação de uma medida de segurança ou de uma medida de polícia, se assim se preferir.

Por tudo isto entendo, como o Sr. Assessor e o Sr. Adjunto do Provedor, que a apreciação da queixa cabe na esfera da acção, na competência, do Provedor de Justiça».

Tomada que foi esta posição neste aludido processo, entendi, para uniformização de critérios dentro do Serviço, emitir a seguinte

ORDEM DE SERVIÇO

Assunto: Actuação do SPJ em processos que envolvam autoridades militares.

É dado conhecimento a todos os Srs. Coorde-