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31 DE JANEIRO DE 1981

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9 — No que concerne à transferência para as entidades às quais incumbe o pagamento de retribuições (em sentido lato) e rendimentos do dever «temporário» de reter essas retribuições e de fiscalizar, indirectamente, a obrigatoriedade de indicação (comprovação) do número fiscal pelo contribuinte, poderá, à primeira vista, admitir-se uma violação da alínea a) do artigo 53.° da Constituição:

À retribuição do trabalho, segundo a quantidade, natureza e qualidade, observando-se o princípio de que para trabalho igual salário igual, de forma a garantir uma existência condigna.

Cumprida que foi por parte do trabalhador a prestação de trabalho na qual se traduz a relação jurídico-laboral, segue-se a contraprestação da entidade patronal, face ao trabalho efectivamente realizado pelo trabalhador ou à disponibilidade da força de trabalho.

Não há dúvida de que se constata um desvio ao carácter sinalagmático do contrato de trabalho na hipótese contemplada no n.° 1 do artigo 11.° (retenção das retribuições pela entidade pagadora) que se aproxima do que se verifica quando o trabalhador é suspenso preventivamente para efeitos disciplinares, situação também transitória.

Pensamos, porém, que tal desvio, e outros haverá para além dos indicados, não assume, melhor, não merece qualificação de inconstitucional. Em primeiro lugar, pelo seu carácter necessariamente transitório.

Com efeito, a comprovação do número fiscal acabará resultando, na inércia do contribuinte (trabalhador), da iniciativa que a própria lei impõe às próprias entidades pagadoras, com base nos elementos constantes dos bilhetes de identidade, cartão de eleitor ou qualquer documento comprovativo dos dados declarados, como resulta do n.° 2 do artigo 11.° Daí o carácter transitório da falada suspensão de pagamentos de retribuições ou rendimentos, face ao mecanismo de substituição que a própria lei estabelece no preenchimento e entrega das fichas de modelo n.° 1.

Por outras palavras, a lei (artigo 5.° e n.° 2 do artigo 11.° do Decreto-Lei n.° 463/79) transfere, subsidiariamente, esse dever jurídico de preenchimento e entrega de fichas — que visa a atribuição do número fiscal do contribuinte — para as entidades pagadoras. E com tal transferência não se opera, contrariamente ao que tem sido ventilado, uma fiscalização na cobrança de impostos pelas empresas (à margem dos serviços de administração fiscal), mas tão-somente a colaboração das empresas ou entidades pagadoras no cumprimento de um dever fiscal acessório, o do preenchimento e entrega das fichas de modelo n.° 1; a «fiscalização» resultará da institucionalização do número fiscal, que não do preenchimento das fichas pelos contribuintes ou pelas entidades pagadoras. Estas colaborarão com a administração fiscal na recolha de elementos destinados à atribuição do número fis-

cal através do preenchimento e remessa das fichas às diversas repartições e serviços da Direc-ção-Geral das Contribuições e Impostos.

10 — E não se n<" afigura haver uma grave distorção dos princ.^.os enformadores do nosso sistema fiscal (artigos 106.° e 107." da Constituição) quando o Estado impõe, a título provisório (necessariamente), às entidades pagadoras (nas quais se englobam quer as públicas, quer as privadas) esse dever de colaboração, que se traduz, como referimos, num mecanismo próximo da «substituição fiscal». E dizemos próximo, porquanto, no caso das operações destinadas à atribuição do número fiscal do contribuinte, a actuação das diferentes entidades pagadoras estará, por imperativo dos fins visados, limitada no tempo. Tal já não sucede com o processo de substituição fiscal, que se verifica no pagamento de impostos através dos sistemas de retenção na fonte, como é óbvio. Nem tão-pouco poderá argumentar-se, face ao dever de se substituir ao contribuinte no preenchimento da ficha que impende sobre as entidades pagadoras, que se estão a impor, pelo fenómeno jurídico-financeiro da substituição, pesados encargos às entidades pagadoras, já que o carácter transitório do dever de preenchimento de fichas não envolve sequer a criação e manutenção de serviços dispendiosos.

Também não descortinamos alguma violação da lei constitucional no que toca à segunda questão aflorada no n.° 1 do artigo 11.°, ou seja a da imposição de um dever (subsidiário) às entidades pagadoras de colaborarem no preenchimento e remessa das fichas de modelo n.° 1 (').

11 — Para além das contribuições de ordem metodológica que se verificaram na aprovação do Decreto-Lei n.° 463/79, cremos não poderem ser postas em causa, por inquinadas de inconstitucionalidade, as normas do citado diploma que não só impõem às entidades pagadoras o dever de suspenderem pagamentos dos rendimentos do trabalho e outros (sujeitos ao regime de retenção na fonte), como também o de se substituírem ao contribuinte (trabalhador) no preenchimento das fichas destinadas à atribuição do número fiscal do contribuinte. Nem os preceitos relativos aos direitos dos trabalhadores (artigo 53.°) nem os respeitantes aos princípios norteadores da reformulação do nosso sistema fiscal (artigos 106.° e 107.°) resultam, por algum modo, desrespeitados, por forma a afirmar-se a existência de inconstitucionalidade material.

Aliás, a numeração fiscal funcionará como um meio para a criação do imposto único sobre o rendimento que possa levar efectivamente em conta as necessidades e rendimentos dos agregados familiares e corrigir as desigualdades, mediante repartição igualitária da riqueza e dos

(1) Anote-se que, do ponto de vista prático, a substituição das entidades pagadoras aos trabalhadores eventualmente faltosos com base nos elementos indicados no n.° 2 do artigo 11.° acaba por minorar a «gravidade» que a opinião pública vem emprestando à suspensão de pagamentos de retribuições.