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II SÉRIE — NÚMERO 26

tigo 17.°, abrange-se a totalidade do regime dos direitos, liberdades e garantias, incluindo a reserva de competência legislativa da Assembleia da República, com base no conhecido brocardo ubi lex non distinguit [. . .]; O Dr. Jorge Miranda, embora tal não pareça resultar explicitamente das afirmações que produz a fls. 352 e 353 da sua obra A Constituição de 1976, expressou no decorrer de um curso livre sobre direitos fundamentais realizado em 1979 na Faculdade de Direito de Lisboa a opinião de que apenas o regime material está abrangido na expressão «regime dos direitos, liberdades e garantias».

O Sr. Provedor de Justiça, em despacho exarado .no processo n.° 77/DI.6-A-3 e transcrito a fls. 46 e 47 do relatório do Provedor de Justiça do ano de 1978, afirmava:

Nem obsta a este entendimento o facto de o artigo 17.° da Constituição dispor que o regime dos direitos, liberdades e garantias se aplica aos direitos dos trabalhadores, pois que, quanto a mim, tal significa que as disposições dos artigos 18.°, 19.° e 20.° são aplicáveis aos direitos dos trabalhadores, já que são estas que, prescrevendo sobre a força jurídica, a suspensão e a defesa desses direitos, caracterizam o regime dos direitos, liberdades e garantias.

Parece que o Sr. Provedor pensa de forma semelhante à do Dr. Jorge Miranda, pois, omitindo qualquer referência à alinea c) do artigo 167.° da Constituição, exclui da aplicação aos direitos fundamentais dos trabalhadores o regime orgânico dos direitos, liberdades e garantias.

Temos para nós que reserva de competência legislativa da Assembleia da República é um traço essencial do regime dos direitos, liberdades e garantias e ela própria uma importante garantia do cidadão. Não vemos razão para distinguir, à face do texto constitucional, os conceitos de regime material e de regime orgânico. Assim, entendemos que a reserva de competência legislativa da Assembleia da República se aplica aos direitos fundamentais dos trabalhadores.

VI — Passamos à segunda questão: nos estatutos anexos ao Decreto-Lei n.° 33/80 regulam-se duas grandes áreas da vida laboral: as condições de trabalho e a participação dos trabalhadores. Nele se encontram disposições sobre admissão, acesso e carreira, vínculos, aprendizagem, quadros, direitos e deveres dos trabalhadores, horário de trabalho, faltas, férias e licenças, disciplina, segurança social, retribuição e comissões de trabalhadores. Tais matérias são, indiscutivelmente, direitos dos trabalhadores. Mas serão direitos fundamentais destes?

Se aceitarmos a tese dos Drs. Gomes Canoti-lho e Vital Moreira (ob. cit., p. 75), todos os

direitos dos trabalhadores constitucionalmente garantidos são direitos fundamentais (')•

O Sr. Provedor de Justiça, ao falar de «direitos dos trabalhadores», em vez de «direitos fundamentais dos trabalhadores» (v. supra), parece perfilhar a mesma tese.

Diversa e oposta è a posição do Dr. Jorge Miranda (ob. cit., pp. 339 e segs.): dividindo, segundo a estrutura, os direitos dos trabalhadores em direitos análogos a direitos, liberdades e garantias e direitos sociais, este autor apenas considera os primeiros como direitos fundamentais dos trabalhadores. Fundamenta esta sua posição na circunstância de não ser possível aplicar o regime material dos direitos, liberdades e garantias aos direitos dos trabalhadores revestindo a natureza de direitos sociais. De facto, como falar, por exemplo, em aplicação imediata (artigo 18.°) ou em defesa judicial (artigo 20.°) de direitos como os previstos nos artigos 52.°, alíneas a), c) e d), 53.° e 54.°, todos importantes direitos sociais?

Mas já é perfeitamente possível — porque têm estrutura análoga aos direitos, liberdades e garantias — aplicar imediatamente e defender judicialmente direitos com os consignados nos artigos 52.°, alinea 6), 55.°, 56.°, 57.°, 58.°, 59.°, 60.°, 82.°, n.° 2, etc.

É que os direitos sociais dependem, na sua concretização, do estágio da evolução da sociedade civil, pressupondo a execução progressiva dos imperativos constitucionais. É, aliás, por esse motivo que alguns direitos sociais são apresentados como obrigações do Estado (artigos 52.° e 54.°).

Tal não significa, em nosso entender, que os direitos sociais não sejam, ao contrário dos direitos, liberdades e garantias, direitos subjectivos: o mais que se poderá dizer é que só vão adquirindo a natureza de direitos subjectivos à medida que as condições de progresso social vão evoluindo, por forma a permitirem a sua subjectivização.

Do nosso ponto de vista, è a tese do Dr. Jorge Miranda a que melhor explica a realidade. Também para nós só serão direitos fundamentais dos trabalhadores aqueles a que puder aplicar-se o regime dos direitos, liberdades e garantias, ou sejam os que tiverem a estrutura de direitos, liberdades e garantias.

Tendo em conta que no segundo dos estatutos anexos ao Decreto-Lei n.° 33/80 se encontram disposições que se referem a direitos fundamentais dos trabalhadores, com particular realce para o disposto nos artigos 107.° a 109.° (artigos 55.° e 56.° da Constituição), somos da opinião de que o Decreto-Lei n.° 33/80, na parte em que contempla os trabalhadores civis dos estabelecimentos fabris das forças armadas, enferma de inconstitucionalidade orgânica, por

(1) «Assim, por direitos fundamentais dos trabalhadores devem entender-se todos os direitos que a Constituição reconhece especificamente aos trabalhadores (assalariados), quer individualmente, quer ás suas organizações próprias, e desde logo os que se encontram colocados em sede de direitos fundamentais, designadamente no capitulo u do titulo ni (artigos 51.° a 61.°).»