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15 DE JANEIRO DE 1983

558-(87)

O Sr. Herberto Goulart (MDP/CDE): — As propostas que foram apresentadas correspondem às duas situações que tínhamos considerado.

A proposta do PS, que é subscrita pela UEDS, é legalmente dispensável. Consideramos, porém, útil que, decidindo-se maioritariamente por esta posição, na lei ficasse bem expressa esta interpretação.

Em relação à ideia de um provedor de justiça para as Forças Armadas, eleito pela Assembleia da República, consideramos que tem vantagens e alguns inconvenientes.

Tem inconvenientes na medida em que as situações de queixa terão a ver com decisões de comando, havendo a tendência para recrutar o provedor de justiça no seio da instituição militar, o que conduz à possibilidade da existência de uma identificação com a decisão da via hierárquica.

Tem vantagens, na medida em que se tratará de uma matéria especializada que pressupõe um conhecimento muito específico da instituição. Poderá ter, ainda, vantagens práticas imediatas na medida em que a sobrecarga dos serviços de provedoria de justiça já é bastante elevado, não se acentuando assim o grande trabalho que sobre eles recai.

Embora o Sr. Presidente tenha manifestado a vontade de passarmos ao artigo seguinte, penso que seria interessante ouvir-se a opinião da Comissão em relação a uma matéria com esta importância, sobre a qual poucos deputados intervieram. Por certo, todos terão a sua opinião e a sua análise ajudará a decidirmos da votação quando for o momento disso. Caso contrário, iremos para a votação na ignorância dos argumentos de uma e outra força.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, não pretendo cercear o direito de intervenção. Fiz apenas um apelo, na medida em que estamos confrontados com um calendário.

Tem a palavra o Sr. Deputado Jaime Gama.

O Sr. Jaime Gama (PS): — Consideramos que do actual ordenamento constitucional se deduz que a actividade do Provedor de Justiça é extensiva às Forças Armadas. Sabemos, por outro lado, que essa tem sido a prática corrente em relação às Forças Armadas. Mal ficaria num diploma desta importância que este aspecto não fosse referido e enunciado. Daí a razão de ser da nossa proposta.

Pensamos que a actividade do Provedor de Justiça em relação às Forças Armadas deve salvaguardar todos os requisitos decorrentes das classificações de segurança. O exercício de direitos por parte dos militares, em relação ao apelo ao Provedor de Justiça não deve envolver aspectos relacionados com a realidade operacional.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Vice-Pri-meiro-Ministro.

O Sr. Vice-Primeiro-Mlnistro e Ministro da Defesa

NscüonsS (Freitas do Amaral): — Sr. Presidente e Srs. Deputados: Receio bem que não consigamos terminar a discussão até à hora do almoço, porque suponho que esta é uma das questões mais delicadas a respeito desta lei.

Devo, desde já, declarar a minha total oposição à ideia, quer de um provedor de justiça para as Forças

Armadas, quer da extensão da actividade do Provedor de Justiça actual às Forças Armadas.

Considero, em primeiro lugar, que é pura e simplesmente inconstitucional. É inconstitucional a proposta do PCP, na medida em que não pode uma lei ordinária criar um provedor de justiça para as Forças Armadas, quando se entender necessário que a existência do Provedor de Justiça em geral seja reconhecida e constitucionalizada no texto da Constituição.

Bem sei que o Provedor de Justiça foi criado antes da Constituição. A verdade é, no entanto, que a existência deste Provedor de Justiça tem hoje a sua sede e o seu fundamento na Constituição. Não é admissível, na minha opinião, que o Provedor de Justiça para a Administração Pública civil tenha a sua sede na Constituição e o Provedor de Justiça para as Forças Armadas a tenha numa lei ordinária.

Quanto à extensão do Provedor de Justiça existente, nos termos do artigo 23.° da Constituição, à actividade das Forças Armadas, penso que é também inconstitucional. O n.° 1 do artigo 23.° diz: «Os cidadãos podem apresentar queixas por acções ou omissões dos poderes públicos ao Provedor de Justiça [...}» As Forças Armadas não são poderes públicos. Talvez o fossem entre 1974 e a revisão constitucional. A partir desta, não são e ainda bem que não podem ser consideradas como tais. As Forças Armadas não são um poder do Estado, mas um serviço público subordinado aos poderes públicos.

Toda a tradição do nosso direito público até agora, e até na própria Constituição, aponta para se considerar que poderes públicos são os órgãos de soberania e, eventualmente, os órgãos das regiões autónomas e do poder local. Os serviços públicos não são poderes públicos. Fazem parte da Administração. Por conseguinte, não estão abrangidos pelo artigo 23.°

Talvez nem sequer os tribunais, apesar de serem órgãos de soberania, se possam considerar como poderes públicos. Daí que a lei da Assembleia da República que delimitou o âmbito do Provedor de Justiça tenha expressamente excluído quer a Assembleia da República — poder legislativo — quer os tribunais — poder judicial— na expressão poderes públicos, o que restringe ainda mais o sentido desta norma.

Se o Provedor de Justiça não pode intrometer-se na actuação do poder legislativo e do poder judicia] — o que me parece bem—, por maioria de razão não pode intervir no âmbito das Forças Armadas.

Não gostaria de me ficar apenas por esta argumentação em sede de constitucionalidade. Pretendo ir ao fundo do problema em termos políticos.

Considero altamente inconveniente e desestabilizador que neste momento se consagre um provedor de justiça para as Forças Armadas ou a extensão do Provedor de Justiça actual às Forças Armadas. Resulta do que já disse, a meu ver, que só em sede de revisão constitucional se poderá fazer essa extensão.

Considero que teria sido errado fazê-lo nesta revisão constitucional e que só depois de uma longa evolução, que vou tentar descrever, será possível equacionar esse problema.

Começo por lembrar que não há Provedor de Justiça para as Forças Armadas nem Provedor de Justiça geral que abranja, no âmbito da sua actuação, as Forças Armadas na maior parte dos países democráticos que conheço. Há em alguns. Reconheço que sim. E não me custa nada a admitir que a evolução nesse sentido seja