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II SÉRIE — NÚMERO 39

Consideramos, em primeiro lugar, importante e necessário que a acção do Provedor de Justiça se estenda às Forças Armadas, por iniciativa dos cidadãos. Tal faculdade não pode ser negada, já que recusá-la seria inconstitucional.

É certo que a acção do Provedor de Justiça se refere apenas a acções ou omissões dos poderes públicos, mas é necessário referir os poderes públicos com autoridade sobre defesa nacional e as Forças Armadas.

O raciocínio do Sr. Vice-Primeiro-Ministro levaria a subtrair da acção do Provedor de Justiça um sector do Governo — que seria representado pelo Ministério da Defesa Nacional e por toda a estrutura que integra, de harmonia com o disposto nesta lei: o Ministério da Defesa Nacional.

Em segundo lugar, parece-nos importante assegurar aos próprios militares o direito de recurso ao Provedor de Justiça.

Naturalmente que esse direito seria facultado para todas as matérias —a própria Constituição o diz—, colocando-se o problema de saber se esse direito deve igualmente tornar-se extensível às acções ou omissões dos poderes públicos com autoridade sobre a defesa nacional e as Forças Armadas.

Pela nossa parte, o entendimento é o de que esse direito é de facto extensível, com duas limitações: a ressalva da matéria operacional e classificada, por um lado, e, por outro lado — e aqui nos parece irmos ao encontro das preocupações da não transformação do instituto do Provedor de Justiça em algo de incompatível com a hierarquia e a disciplina militares —, a aceitação dessa extensão apenas quando e se tiverem sido esgotadas as vias hierárquicas, ou judiciais se for caso disso, de recurso.

Seria inconstitucional e difícil de justificar a não extensão da actividade do Provedor de Justiça às Forças Armadas, quer por parte dos cidadãos, em geral, quer por parte dos próprios cidadãos militares, com a ressalva apontada.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Veiga de Oliveira.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Vice-Primeiro-Ministro, Srs. Deputados: Alguns breves comentários: o Sr. Vice-Primeiro-Ministro, em intervenção desta manhã, tentou demonstrar que não havia lugar à extensão do Serviço do Provedor de Justiça às Forças Armadas e muito menos haveria a hipótese de considerar a existência de um provedor de justiça específico à defesa nacional e às Forças Armadas.

Fê-lo baseado em duas linhas de defesa — chamemos--lhe assim —, já que estamos a tratar matéria de defesa nacional: uma das linhas de defesa pretensamente de direito comparado e uma outra claramente inserida no direito constitucional português.

A linha do direito comparado não colhe, uma vez que o próprio Sr. Vice-Primeiro-Ministro admitiu a existência de provedor de justiça, com funções alargadas ao âmbito das Forças Armadas, em alguns países.

Deixemos, no entanto, proceder tal argumento, mas vejamos a nossa situação particular, isto é, aludamos à linha de defesa baseada em considerações sobre a nossa experiência constitucional: o Sr. Vice-Primeiro-Ministro afirmou, desde logo, não serem as Forças Armadas poderes públicos, mas um serviço público.

Bom, a Direcção-Geral dos Serviços Prisionais é um serviço público, os CTT são um serviço público, e muitos outros serviços públicos poderia enunciar, nos quais o Provedor de Justiça tem a possibilidade de actuar sobre todos os actos administrativos com carácter definitivo e, portanto, susceptíveis de recurso — ou mesmo qualquer outro acto administrativo, acto não necessariamente deste tipo.

O Sr. Vice-Primeiro-Mintstro, homem devidamente formado para o efeito, sabe que qualquer acto administrativo é susceptível, ao abrigo do artigo 23.° da Constituição, de ser sindicado pelo Provedor de Justiça.

Sendo certo que as Forças Armadas são um serviço público —como muito bem o afirmou o Sr. Vice-Primeiro-Ministro —, sendo certo também que nesse serviço público se geram múltiplos actos administrativos susceptíveis de serem sindicados por esta via, perguntaria-. Qual a razão do impedimento da extensão do Serviço do Provedor de Justiça a esses actos? Por que se há-de considerar inconstitucional — usando a terminologia utilizada pelo próprio Sr. Vice-Primeiro-Ministro— a existência de um provedor de justiça específico?

De acordo com o conteúdo do artigo 23.°, qualquer cidadão poderá apresentar queixas por acções ou omissões dos poderes públicos, sendo certo que o Provedor de Justiça, sem poder decisório, as apreciará. De acordo com o conteúdo deste artigo, não é excluída a possibilidade da existência de um serviço de provedor de justiça específico. Aliás temos igualmente presente exemplos, em sede de direito comparado, os quais provam que, mesmo existindo um provedor de justiça genérico, pode existir um tal provedor de justiça específico a certas matérias, sem prejuízo dos poderes genéricos do primeiro.

Falou o Sr. Vice-Primeiro-Ministro, por outro lado, em hierarquia. Urge que se faça, entretanto, uma análise a tal matéria.

Não atacamos a disciplina e a hierarquia em lado algum e muito menos nas Forças Armadas.

Contudo, hierarquia e disciplina correm paralelas contra qualquer prepotência, contra qualquer abuso da autoridade, contra qualquer desvio de poder.

A aplicação do serviço do Provedor de Justiça às Forças Armadas ou a criação da figura de um provedor de justiça específico à defesa nacional e as Forças Armadas não são, de forma alguma, contrárias nem ao principio da hierarquia nem ao princípio da disciplina. Muito pelo contrário, aqueles princípios são os garantes destas figuras.

Não será necessário recorrermos ao direito comparado, porque a nossa própria experiência constitucional nos ensina muito bem que a disciplina e a hierarquia são minadas quando a prepotência se instala.

Dai que não vejamos, tão claramente como o vê o Sr. Vice-Primeiro-Ministro, que a disciplina e a hierarquia sejam incompatíveis, quer com a extensão do Serviço do Provedor de Justiça, quer com a criação de um serviço de provedor de justiça específico das Forças Armadas.

Tenho aqui uma nota da provedoria de justiça, nota publicada no Diário da Assembleia da República, sobre o processo referente a um major do exército português que àquela provedoria reclama de circunstâncias e decisões do Chefe do Estado-Maior do Exército — concretamente a negação da autorização de deslocação ao estrangeiro.