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15 DE JANEIRO DE 1983

558-(91)

Apôs a argumentação, sem ter sido contestado, pelo menos publicamente, conclui o redactor que nem a Constituição da República nem a lei, expressa ou implicitamente, colocam as Forças Armadas ao abrigo da intervenção da provedoria de justiça; conclui ainda que o Provedor de Justiça pode aceitar reclamações de cidadãos civis ou militares contra actos de administração praticados por autoridades militares; conclui que pode aquele levar a sua intervenção, com vista à modificação ou revogação de tais actos, até ao ponto de dirigir recomendações ao Conselho da Revolução — neste caso não seria ao Conselho da Revolução, seria talvez ao Ministério da Defesa Nacional, ao Governo ou à Assembleia da República, consoante a questão; conclui que nenhuma autoridade militar pode impedir o Provedor de Justiça de usar dos seus poderes de inspecção e fiscalização, poderes determinantes ao apuro de factos relativos a uma ilegalidade ou injustiça por si cometida, através de um acto administrativo; conclui, finalmente, que a circunstância de as Forças Armadas estarem sujeitas à possibilidade de intervenção do Provedor de Justiça em nada ofende o equilíbrio constitucional dos vários órgãos de soberania.

Vem este depoimento reforçar o nosso argumento de que o controle de provedoria não afecta a disciplina e a hierarquia das Forças Armadas.

Não entendemos o calor posto por V. Ex.* na defesa dos princípios da hierarquia e da disciplina, os quais não estão em causa; não entendemos a recusa imediata do reconhecimento legal de poderes válidos do Provedor de Justiça sobre actos administrativos praticados no âmbito das Forças Armadas, isto é, em sede do chamado serviço público das Forças Armadas — opinião defendida nas propostas apresentadas pelo PS e UEDS; não entendemos a recusa à eventualidade da criação, por força desta lei, de um serviço específico de provedoria de justiça, em relação às Forças Armadas.

A criação de uma provedoria de justiça, nos termos em que a propomos, não está de facto prevista na Constituição; contudo, nem tudo o que ali não se encontra previsto é inconstitucional.

Peço ao Sr. Vice-Primeiro-Ministro que, à luz da minha presente intervenção, esclareça melhor os termos em que se exprimiu.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Herberto Goulart.

O Sr. Herberto Goulart (MDP/CDE): — Sr. Presidente, Sr. Vice-Primeiro-Ministro, Srs. Deputados: Algumas considerações à última intervenção do Sr. Vice--Primeiro-Ministro.

Não me debruçarei sobre a acusação de inconstitucionalidade que V. Ex.* fez à extensão do Serviço do Provedor de Justiça à instituição militar e à criação de um provedor de justiça específico.

Segundo o raciocínio do Sr. Vice-Primeiro-Ministro, seríamos levados a crer que a acção da maioria dos provedores de justiça tem caído no espaço da inconstitucionalidade. Isto, porque a maioria das queixas apresentadas e apreciadas se prendem muito com decisões no plano dos serviços públicos, e não directamente no plano dos poderes públicos. Estas queixas referem-se, estou certo, na maioria dos casos, a decisões de direcções-gerais, problemas de promoções, concursos públicos, etc.

Dos relatórios dos provedores de justiça que tenho apreciado, a ideia que me ficou é a de que, de facto, esta é a área principal de intervenção do Provedor de Justiça. Creio que ninguém alegou pisar o Provedor de Justiça, nesta matéria, terrenos inconstitucionais.

O Sr. Vice-Primeiro-Ministro desenvolveu uma argumentação, tentando contrariar esta ideia, argumentação essa baseada no seguinte: por um lado, constituiria ela um grave entorse ao principio da hierarquia; por outro lado, haveria canais mais compatíveis com este princípio da hierarquia, canais que, esses sim, deveriam ser explorados.

Quanto ao primeiro ponto da argumentação, julgo que não se poderá afirmar haver aqui qualquer entorse ao principio da hierarquia, já que precisamente a característica do Provedor de Justiça é o facto de ele não actuar sobre as decisões dessa hierarquia, senão no simples plano das recomendações e, por conseguinte, jamais pondo em causa o próprio princípio da hierarquia, nos seus efeitos concretos e práticos. Naturalmente que as recomendações de um provedor de justiça são referidas de acordo com os critérios de apreciação do receptor das respectivas e mesmas recomendações.

Creio também que, dentro das instituições militares, o princípio da hierarquia está associado à possibilidade de abuso de um poder discricionário. A existência de uma provedoria de justiça, para a qual se poderiam enviar queixas, fora dos recursos gracioso e contencioso, é, a meu ver, um facto moralizador do próprio principio da autoridade, enquanto atenua os riscos de um poder discricionário por vezes imposto.

Depois, o Sr. Vice-Primeiro-Ministro levantou duas questões, pertinentes as duas no plano teórico, mas que considero sem a acuidade que aquele interventor lhes reporta, quando vistas à luz do plano da prática da actividade do actual Provedor de Justiça.

A primeira questão que o Sr. Vice-Primeiro-Ministro colocou foi a de que poderes desta natureza, nas mãos de um provedor de justiça, poderiam ser desestabilizadores da instituição militar.

Creio que, após 5 anos de existência de provedoria de justiça, basicamente para assuntos civis, poderemos concluir que as acções deste se têm desenrolado com grande cuidado e serenidade, permitindo-me inferir não virem a trazer elas qualquer desestabilização à instituição militar.

Quanto ao carácter não vinculativo das recomendações — outra questão levantada—, julgo que a eficácia destas se mede precisamente pela vantagem de não desencadearem acções punitivas que, por algum modo, estão ligadas à função inspectiva, às acções de recurso, etc, enquanto que as recomendações de um provedor de justiça servem essencialmente de alerta e em termos de as próprias decisões poderem ser rectificadas, seja no caso concreto, seja em relação a casos futuros, por quem as tomou, sem quebra do princípio da autoridade.

Estará o princípio da hierarquia, a meu ver, sem qualquer dúvida, melhor defendido com este mecanismo do que com o mecanismo da função inspectiva.

Outra questão levantada pelo Sr. Vice-Primeiro--Ministro foi a da existência de outros canais mais compatíveis com o princípio da hierarquia, pelo que só se deveria explorar a hipótese de um provedor de justiça quando estivessem exploradas todas as potencialidades que estes canais comportam.

Há, julgo, toda a vantagem em melhorar o funcionamento destes canais dentro da instituição militar, mas