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II SÉRIE — NÚMERO 10

(aliás duramente punido) aquilo que, num sistema escolar democrático, só pode constituir um dever dos professores e uma obrigação fundamental do Estado — quiçá a mais inquestionável, por se prender como se prende com a correcção de desigualdades que, só por si, bastam para cavar ou consagrar um fosso entre os cidadãos, colocando de um lado uns, a quem é assegurado um desenvolvimento harmonioso, e do outro lado todos os restantes, marcados por privações que, à falta de correcção, se acrescentam, sublinham e multiplicam.

Posto perante as consequências óbvias das medidas de que é responsável, o Ministro da Educação não hesitou em reafirmar, em recente colóquio realizado na cidade do Porto, a alegada necessidade das restrições que decretou. Espantados, centenas de professores que assistiam ao colóquio onde as afirmações foram produzidas ouviram traçar um insólito paralelo entre a situação portuguesa, caracterizada por agudas carências, e a de países em que, face à riqueza da dieta corrente das crianças, se revela desaconselhável a distribuição de leite para além do limite máximo inventado pelo Ministro. O espanto cresceu, porém, quando ao dislate se veio somar a acusação infamante. Segundo o Ministro Vítor Crespo, as restrições e ameaças governamentais dever-se-iam ao facto de o ME ter «contestado» haver professores se «apropriam» do leite escolar. A suspeição, não acompanhada de qualquer prova, facto concreto, ou sequer inquérito ou qualquer outra indagação legalmente prevista, atinge toda uma classe sócio-profissional e faz acrescer ao escândalo do ataque a direitos vitais dos alunos uma grosseira afronta à dignidade dos próprios professores.

É situação que não pode prolongar-se, sob pena de uma ainda maior degradação do funcionamento do sistema escolar.

Importa que o suplemento alimentar seja de novo assegurado às crianças e aos jovens, nos termos e de acordo com os objectivos que presidiram à sua instituição e desenvolvimento após o 25 de Abril.

2 — Foi, na verdade, no ano lectivo de 1975-1976 que se assistiu ao lançamento de uma verdadeira política de suplemento alimentar, após experiências localizadas, no ensino primário, abrangendo os distritos de Bragança, Castelo Branco e Lisboa, bem como o concelho de Odemira. O suplemento alimentar completo, difundido a partir de 1975, era composto por 0,25 1 de leite, uma sande contendo elementos proteicos (queijo, fiambre, etc.) e, sempre que possível, uma peça de fruta. Encontrou rapidamente uma significativa receptividade, tendo chegado a abranger 400 000 alunos. Expandiu-se simultaneamente o suplemento alimentar simples (leite simples ou reforçado com produtos proteicos, minerais ou vitamínicos).

Em 1976-1977 manteve-se a política do ano anterior. O ME viria a conceder um subsídio por refeição/aluno de 1S50 para o suplemento simples e 2S50 para p suplemento completo (cf. Instruções sobre Suplemento Alimentar — Ensino Primário e Telescola, Outubro de 1976. p. 7, e Orientações sobre a Acção Social Escolar, Junho de 1976, p. 21).

Em 1977-1978 foi assegurado no início do ano lectivo o apoio financeiro prestado no ano anterior (circular do IASE n.° 65/77, de 14 de Outubro) e chegou a ser encarado um reforço desse apoio para o suplemento alimentar completo (Instruções para 1977-1978, Setembro de

1977. p. 4). No início de 1978, porém, o Governo deliberou fazer depender tal suplemento da «cooperação da comunidade» até que o IASE «possa dispor de novas verbas» (circular do IASE n.° 13/78, ponto 3). Sob a eufemística invocação da necessidade de «cooperação da comunidade» ocultavam-se, evidentemente, drásticas restrições orçamentais, o enjeitamento das responsabilidades públicas na política de acção social escolar, tanto mais graves quanto o País não se encontrava sequer integralmente coberto pelos esquemas até então praticados.

Paralelamente, o IASE, que recorria ao leite em pó reconstituído nas próprias escolas, iniciou a distribuição de leite recombinado e ultrapasteurizado em embalagem própria, por unidades industriais (cooperativas leiteiras). Neste caso, a quantidade diária de leite a distribuir a cada aluno passou a ser de 2 dl (circular do IASE n.° 27/78, de 14 de Março)!

Em 1978-1979 reforçou-se a tendência esboçada no ano anterior: o ME só subsidia as escolas para efeitos de distribuição do chamado suplemento alimentar simples, atribuindo-lhes 2 dl de leite por dia e aluno ou 2$ por dia e aluno, quando ainda utilizassem leite normal de consumo público (circular do IASE n.° 51/78, de 15 de Setembro; Instruções — Ensino Básico e Secundário. Agosto de 1978, pp. 41 e 47). O suplemento alimentar completo continuou a não ser garantido pelo Estado, ficando remetido para a incerta, eventual e desigual cola^ boração das autarquias e comunidades locais, para não referir já as comparticipações das famílias dos alunos em dinheiro ou em géneros (Instruções — Ensino Básico e Secundário. Agosto de 1978, p. 36).

No ano de 1979-1980, manteve-se, com todas as suas consequências, o tipo de acção e esquema de financiamento restritivo praticado em 1978-1979 (circular do IASE n.° 39/79, de 2 de Novembro).

Todas as restrições foram confirmadas em 1980-1981, e agravadas pelo aumento do custo de vida (Instruções — Ensino Básico e Secundário. Outubro de 1980, pp. 59-65). Em Janeiro de 1981 iniciou-se a distribuição de leite com aditivos (circular do IASE n.° 31/80, de 14 de Novembro) e passa-se a conceder um subsídio de 2S20 por dia e aluno às escolas que recorressem ao leite de consumo público (circular do IASE n.° 20/80, de 11 de Setembro).

Finalmente, em 1981-1982, sem qualquer alteração do quadro restritivo vigente, deixa de ser distribuído o leite de consumo público, generalizando-se a distribuição de leite embalado e tratado. Erige-se em objectivo fundamental a distribuição em embalagens individuais de 200 cm3, com palhinha acopulada.

Ao fim destes anos de involução e retrocesso, o programa de suplemento alimentar simplificado (e realmente mutilado e truncado no seu âmbito e objectivos) abrange apenas o ensino primário e preparatório TV, mas mesmo quanto a estes não cobre as escolas públicas de todo o País. Os responsáveis oficiais alegam «a impossibilidade de conseguir-se, a nível local, entidades que assegurem a distribuição de leite pelas escolas, particularmente pelas que se situam em localidades inacessíveis (vias de comunicação difíceis e inexistentes); falta de serventes nos estabelecimentos de ensino para proceder à distribuição do leite e executar outras tarefas inerentes à acção; falta de água potável; inexistência de condições ou de