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II SÉRIE — NÚMERO 10
O projecto de lei do PCP consagra explicitamente o suplemento alimentar completo como direito de todos os alunos dos ensinos primário, ciclo preparatorio, centros de educação pré-escolar e ensino especial cooperativo, assegurando o seu fornecimento a título gratuito durante o periodo escolar.
Não se visou só conferir protecção legal aos alunos já abrangidos pelos esquemas vigentes: alarga-se aos estudantes do ciclo preparatório o regime até agora só aplicável aos do ciclo TV. E a solução mais adequada. Trata-se, em primeiro lugar, de um grupo etário em fase crucial do seu desenvolvimento, pelo que a sua inclusão nos programas de suplemento oferece inegáveis vantagens pessoais e sociais (melhor alimentação, maior rendimento escolar, diminuição de repetências, economia de gastos de ensino, enriquecimento cultural da população através da possibilidade de frequência de níveis mais elevados de escolaridade frutuosa). Importa não esquecer, por outro lado, que se está perante um grau de ensino obrigatório (tal como o primário, actualmente abrangido). Em terceiro lugar, a distribuição geográfica das escolas origina em muitas zonas a necessidade de deslocação dos jovens do ciclo preparatório de longas distâncias, o que aconselha que o suplemento lhes seja fornecido sob forma de pequeno almoço ou em forma de merenda a meio da manhã...
O projecto de lei procura definir com precisão a composição do suplemento por cujo fornecimento são responsáveis as entidades escolares. Aponta-se para um suplemento alimentar completo (leite + fonte proteica 4- fonte de energia, isto é, leite e sandes de produto cámeo ou ovo) em vez de apenas leite (suplemento alimentar simples). Tomaram-se por base os padrões dietéticos geralmente considerados mais aconselháveis, mas não só se cuida de garantir a sua revisão e actualização periódicas, com intervenção necessária do organismo mais adequado —' o Conselho de Alimentação e Nutrição —. como se assegura desde logo a possibilidade (e o dever) de adequação da distribuição às carências específicas experimentadas a nível individual, "como tal detectadas pelos professores (cuja intervenção responsável é devidamente sublinhada e estimulada). Quando verifiquem situações de carência particular os professores devem proceder à compensação possível, afectando prioritariamente para tal efeito os excedentes de que disponham. Idêntico procedimento deverá ser adoptado perante carências generalizadas, prevendo-se em tal caso uma intervenção qualificada do centro de saúde competente, com vista ao exacto diagnóstico da situação e à emissão de parecer técnico geral ou individual, que viabilize um reforço alimentar adequado à superação da situação verificada.
Subjacente às soluções propostas está visivelmente a ideia de personalização do suplemento alimentar. Não pode ignorar-se, na verdade, que carências médias e, por vezes, profundas de alimentos são menos características de regiões e até de concelhos do que de faixas socialmente características da população, definidas económica e culturalmente. Numa escola pode haver um grupo de alunos que careçam para bom desenvolvimento e bom rendimento escolar de um reforço, ao lado de outros que de tal não precisam. A escola de uma freguesia pode mostrar um padrão alimentar deficiente, enquanto outra escola da mesma freguesia não.
O esforço de adequação pessoal que se preconiza supõe, porém, mecanismos flexíveis de redistribuição dos alimentos. Nem poderia ser de outra forma. A solução
proposta justifica-se precisamente: pelas assimetrias alimentares dentro da mesma escola; por muitos alunos trazerem já hoje de casa uma sande que completa o leite (sendo de acentuar a necessidade de educação alimentar na escola primária e continuada, para que esta prática se generalize); pelas grandes carências de certos alunos (caso em que além de lhes dever ser garantido o suplemento alimentar completo na composição padrão, a distribuição do leite deve ter um efeito compensatório adicional, para além de ser de encarar um reforço, nos casos em que tal se justifique).
Encontra igualmente expressão no projecto de lei a preocupação de ultrapassar alguns obstáculos susceptíveis de dificultar a expansão e eficácia do suplemento alimentar.
É. desde logo, o caso das embalagens. Que as embalagens individuais oferecem vantagens, é uma evidência. Trata-se, porém, de uma solução cuja generalização, nas presentes circunstâncias, é, no mínimo, luxuosamente cara. Em 1980, 200 cm3 em embalagem de litro custavam $69. A embalagem individual de 200 cm3 custava 1S26... O projecto de lei aponta para a economia, sem prejuízo da higiene e segurança.
Outro tanto se dirá dos aditivos. Em 1980, o custo do sabor (chocolate, por exemplo) representava mais 2S por 200 cm3. A generalização dos aditivos contribui, evidentemente, para aumentar a apetência dos alunos, favorecendo um consumo regular e continuado. Mas o crescimento dos encargos, decorrente de tal opção, é tal. que se impõe claramente uma gestão mais ponderada nos aditivos, adequando a sua utilização aos casos em que apetência seja menor (e por isso deva ser estimulada). Simultaneamente, haverá que racionalizar a própria escolha dos aditivos (desejavelmente através da opção por produtos nacionais bem aceites pela generalidade das crianças e dos jovens).
Há que reconhecer corajosamente que entre a azinhaga e a auto-estrada há uma série de soluções intermediárias a adoptar em função das realidades e possibilidades ...
Também se aponta para a ultrapassagem da falsa «questão das temperaturas», que tem ocupado largo espaço nas circulares dos responsáveis pela acção social escolar. Assegurada a obediênica a padrões correntes (e perfeitamente viáveis) de higiene e salubridade, afigura--se absurdo impor terminantemente que o leite seja sempre e em quaisquer circunstâncias servido frio. Em boa razão, deverão ser tidas em conta, sim, as características da época do ano e das regiões, as próprias preferências das crianças, dependendo a eficácia da aplicação deste princípio da política de equipamentos e de educação alimentar (cometendo-se ao Governo a obrigação de adoptar as providências organizativas e financeiras para tal indispensáveis).
O projecto de lei vinca, finalmente, as responsabilidades do Estado na concretização dos objectivos de que constitucionalmente se encontra incumbido neste domínio, sem deixar de estimular a articulação da escola com as autarquias locais, organizações sociais e entidades económicas que exerçam a sua acção na área das unidades escolares.
Nenhuma confusão se estabelece, porém, na distribuição de responsabilidades, deixando-se bem explícito que o Estado não pode demitir-se das suas incumbências, devolvendo a terceiros a realização daquilo que prima: cialmente lhe cabe.
Revogam-se, evidentemente, as disposições contrárias aos princípios e regras que se estabelecem (aliás, sem