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II SÉRIE — NÚMERO 79

igualmente os futuros pais e muito especialmente a criança que vai nascer: trata-se de legislar sobre o acompanhamento da grávida em trabalho de parto.

í — A situação actuai

Nas maternidades dos hospitais do Estado do nosso país não é possível a parturiente entrar acompanhada. Despede-se, à porta, da família e entra num mundo desconhecido e agressivo, onde as caras nada lhe dizem, as enfermeiras são desconhecidas, o médico ou médicos que a assistiram na gravidez não são nenhuns daqueles com quem vai agora deparar, as palavras que ouve são hospitalares, são do campo da patologia, e não de processos normais fisiológicos. Ela é a doente, e não a grávida, e, se quiser falar com alguém, restam-lhe as outras grávidas da enfermaria, tão sozinhas e tão ansiosas ou mais do que ela.

Até andar lhe é geralmente proibido. Para ali vai ficando abandonada, separada de quem mais precisava naquelas horas, tão fundamentais para os dois, e separada do futuro pai da criança que vai nascer.

Poucas ou nenhumas informações sobre o decorrer do trabalho lhe são prestadas, na ideia, ainda tão vulgarizada, de que «não ganhava nada em se explicar, também não percebia [...]».

Não' sabe se falta muito ou pouco tempo, se está tudo a correr bem ou se há qualquer complicação, e as horas vão passando numa grande solidão, que mais não faz do que aumentar a ansiedade e com ela a duração do trabalho de parto.

A sua gravidez, que já lhe acarretou profundas alterações a nível corporal; hormonal, psíquico e social, vai terminar da forma emocional mais negativa.

Ela, a quem, muito provavelmente, salvo raras excepções, nada foi ensinado sobre o seu corpo, sobre o processo de gravidez e parto, vai sentir-se incapaz de participar e vai principalmente sentir-se sozinha.

A agressão e a falta do futuro pai vai destruir-lhe a alegria que devia ser o seu parto, e o primeiro contacto com o filho dos 2 vai ser empobrecido. Falta realmente alguém!

Não é por acaso que muitas mulheres referem, em relação ao seu parto: «o que mais me custou foi deixarem-me para ali sozinha [...]».

2— Consequências da solidão

Investigações feitas ultimamente, entre elas as realizadas em Detroit (Estados Unidos da América) e em Gotemburgo (Suécia) e muito especialmente na Guatemala pelo célebre médico pediatra Dr. John Kennel (do Rainbow Babies and Childrens Hospital, de Cleveland, Oaio, Estados Unidos da América), demonstram a importância da presença do futuro pai junto à grávida em trabalho de parto.

Essas investigações apontam para uma maior incidência de trabalhos prolongados nas grávidas sozinhas, e a investigação sugere uma correlação entre a ansiedade aguda e a paragem secundária do trabalho de parto ou o aparecimento do sofrimento fetal, muito provavelmente devido ao aumento do nível de cateco-laminas, o que diminui a contractibilidade do músculo uterino.

As experiências do Dr. John Kennel, que incidiu sobre 417 casos, teve os seguintes resultados:

A — 168 grávidas estiveram acompanhadas pelo futuro pai e delas 45 tiveram complicações obstétricas;

B — 249 grávidas estiveram sozinhas e 147 tiveram complicações.

A média de cesarianas foi de 6 % no grupo A e de 12,5 % no grupo B.

A duração total do trabalho de parto foi de 50 % mais longo no grupo B, ou seja, o das grávidas sozinhas, em relação às acompanhadas.

Foi, aliás, o próprio Dr. John Kennel quem, no Simpósio Internacional Nascer... e Depois?, realizado na Fundação Gulbenkian em Abril de 1983, afirmou: «é provável que a década que estamos a atravessar vá dar grande ênfase ao acompanhamento da grávida em trabalho de parto».

Já entre nós o pediatra português, do Hospital de Santa Maria, Dr. Gomes Pedro, na sua dissertação de doutoramento, em Dezembro de 1982, dissera: «a função do pai como moderador da ansiedade materna assume características que importa desenvolver nos novos contextos sociológicos de formação e motivação familiares».

3 — Vantagens do acompanhamento

Actualmente estão já demonstradas as vantagens para a grávida e para o recém-nascido do acompanhamento.

A correlação entre a não ansiedade, o desaparecimento da tensão e do medo, a desdramatização da situação pela presença do companheiro (tanto mais evidente quando tiverem ambos feito preparação para o parto) e a produção de endorfinas cerebrais cora efito analgésico é uma das hipóteses mais prováveis para explicar a diferença entre estas e os trabalhos de parto «da solidão».

Gs actuais conhecimentos levam a que se considere como altamente provável que a confiança, o ambiente calmo e o não estar sozinha tenham efietos não só analgésicos sobre a percepção da contracção uterina, como, inibindo determinados neurónios, expliquem o efeito positivo na produção de ocitocina e, assim, os trabalhos de parto mais rápidos, mais eficientes e com menos complicações obstétricas.

Aliás, já em 1981, em Coimbra, o Prof. Calderon Barcia ligava a importância do acompanhamento da grávida à maior produção de ocitocina, e com ela aos partos eutócicos, afirmando que a melhor maneira que conhecia de evitar fórceps e cesarianas era a presença do futuro pai durante o trabalho de parto ...

4 — A nassa praposSa

A proposta do PCP implica prioritariamente como acompanhante o futuro pai: não temos dúvidas de que é a solução ideal. Mas não se quis deixar de abrir excepção para as grávidas que desejem expressamente outra companhia.

Pensamos concretamente nas mães solteiras ou mesmo nas mães adolescentes (que, em recente trabalho do Dr. Miguel Oliveira da Silva, indicaram querer a própria mãe como acompanhante em mais de 40 % dos casos).