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13 DE NOVEMBRO DE 1985

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da lei do aumento geral das rendas, a Lei n.° 48/85, de 20 de Setembro.

Perante a monstruosidade das soluções engendradas na proposta do governo PS/PSD e depois, na Assembleia, nos agravamentos ainda introduzidos pelos grupos parlamentares do PS, PSD e CDS, a lei das rendas é absolutamente inaproveitável, não havendo nenhuma solução válida que não seja a sua pura e simples revogação.

A lei introduziu em centenas de milhares de famílias portuguesas o espectro de maiores e muitas vezes insuportáveis dificuldades, num quadro em que desce o valor real dos salários, aumentam brutalmente os preços, grassa o desemprego, alastra a praga dos salários em atraso.

A exigência popular da revogação da lei é justa, e impõe-se, como necessário e urgente, dar-lhe cumprimento.

2 — Recordando sumariamente o conteúdo da lei, importa acentuar que ela:

Prevê aumentos gerais das rendas todos os anos, a valores próximos dos da inflação, para todo o tipo de rendas e seja qual for a data do contrato;

Estabelece uma chamada «correcção extraordinária», que atingiria todas as rendas anteriores a 1981, em condições tais que a generalidade das rendas aumentaria, em poucos anos, de forma brutal;

Estabelece, para além dos dois sistemas de aumento anteriormente definidos, uma terceira via de aumento, resultante da realização de obras de beneficiação;

Define um regime permissivo de valorização de obras, de que decorre que na esmagadora maioria dos casos não haveria alternativa para o inquilino que não fosse realizá-las e custeá--las ele mesmo;

Estabelece a possibilidade de contratos de arrendamento a prazo (findo o qual o inquilino pode ser despejado sem invocação de qualquer motivo), abrindo caminho para ser posto termo ao princípio da renovação automática dos contratos de arrendamento, princípio historicamente conquistado e consagrado e que constitui uma garantia básica de estabilidade para os inquilinos.

3 — Para além dos dramáticos efeitos sociais que iria produzir, o simples enunciado das principais soluções contidas na lei evidencia que esta não serve nem conduz à resolução dos gravíssimos problemas da habitação. Nem era isso que o governo PS/PSD pretendia, como o debate parlamentar o demonstrou.

A lei não promove, nem directa nem indirectamente, a construção da habitação, já que, estabelecendo como preferencial o regime de renda livre, os valores da renda continuarão a ser inacessíveis, com a agravante de aumentarem todos os anos.

A lei não promove, nem directa nem indirectamente, a recuperação do parque habitacional, já que o regime de obras é permissivo e não obriga o senhorio a realizá-las.

A lei não atende à situação dos senhorios pobres, proprietários de poucos fogos com rendas baixas, já

que não é com os aumentos da renda que poderão realizar as obras que os inquilinos lhes vão reclamar, nem é por essa via que se resolve a situação social desses senhorios. Os objectivos da lei situam-se em plano bem diferente. O que ela efectivamente visa é dar satisfação aos grandes construtores civis, interessados em fazer da habitação um mero negócio, empenhados na onda de despejos que a lei provocaria nas zonas centrais das cidades e que eles rapidamente transformariam em escritórios, centros comerciais e habitações de luxo, beneficiários do regime do contrato a prazo que lhes põe os inquilinos na mão.

Vítimas seriam as famílias, nelas incluídas muitas das camadas intermédias.

Vítimas seriam os trabalhadores de baixos salários, os reformados e pensionistas, a quem o magro subsídio prometido não impediria de se verem incapazes de fazer face às novas rendas e assim obrigados a retirarem-se para a periferia e mesmo para as barracas.

Desumana, inoportuna e injusta, a lei não é uma peça de uma política de habitação. Ê uma peça, sim, da política de submissão ao grande capital e à sua ganância do máximo lucro, sejam quais forem as consequências sociais.

Ê uma lei contra a Constituição de Abril, contra uma política democrática de habitação que sirva os portugueses.

4 — Essa política de habitação é possível e urgente e impõ-se acentuar os seus traços fundamentais.

A situação da habitação em Portugal caracteriza-se fundamentalmente pela existência de um elevado défice (calculado em cerca de 600 000 fogos), pelo número significativo de fogos devolutos (que rondará os 300 000), pela degradação do parque habitacional existente, pelo número elevadíssimo de habitações sem as condições mínimas, pelo elevado preço de construção das habitações novas, pelo custo insuportável do crédito para habitação própria, pela especulação na fixação de rendas nas novas habitações.

Trata-se de uma situação de degradação e carência generalizadas, que atinge todas as camadas da população, mas que tem particular acuidade nas camadas mais jovens (impossibilitadas de ter acesso à habitação) e nas camadas (em geral mais idosas) que habitam fogos mais antigos, carecidos de infra-estruturas fundamentais e das obras necessárias.

Ao mesmo tempo, campeia a especulação de terrenos e a especulação com as zonas centrais dos núcleos urbanos, onde se assiste à destruição das zonas habitacionais tradicionais e a sua substituição por edifícios de escritórios, centros comerciais e, eventualmente, habitações de luxo a preços totalmente inacessíveis.

Uma situação como esta não pode ser resolvida sem intervenção pública, sem planeamento público, sem financiamento público. Não se trata de subestimar os diferentes agentes da actividade económica (designadamente as empresas privadas e o sector cooperativo, de tantas tradições na área da habitação). Trata-se, tão-só, de encarar com realismo a dimensão do problema, para dela concluir que se tornam necessárias medidas de emergência que, incentivando a cooperação de todos (empresas privadas, cooperativas, autarquias, comissões de moradores, particulares em geral), tenham por ponto vultosos meios financeiros, técnicos