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II SÉRIE — NÚMERO 82

Que é assim resulta de que as normas da lei de autorização em causa — como, de resto, de qualquer lei semelhante, seja qual for a matéria sobre que verse — não irão produzir nenhum efeito ao nível do ordenamento juslaboral, isto é, da disciplina jurídica (material e processual) do trabalho e das respectivas relações: de facto, publicada a lei de autorização, tal ordenamento e tal disciplina manter-se-ão (ou manter-se-iam) inalterados até à emissão do decreto-lei autorizado. Só este último, pois, virá (ou viria) a constituir, em direitas e rigorosas contas, «legislação do trabalho».

Quanto propriamente à «lei de autorização», os respectivos efeitos esgotam-se no plano da ordenação e organização do exercício da «função legislativa» — que, por via dela, e quanto à matéria em causa, é como que «transferida» da Assembleia da República para o Governo. O que significa que as correspondentes normas mais não são do que «normas organizatórias» e, concretamente, normas de competência: normas que definem e delimitam, material e temporalmente, uma certa competência legislativa do Governo. Delas se poderá dizer, por conseguinte, que, em razão do objecto, se situam, não já no domínio do «direito do trabalho», mas ainda, e só, no domínio (ou no nível) do «direito constitucional».

O que vem de afirmar-se exprime uma realidade jurídico-estrutural inequívoca e irrefragável — e que não pode, por isso, deixar de determinar, directa e decisivamente, a resposta (negativa) à questão da aplicabilidade, à lei de autorização em causa, do disposto nos artigos 55.°, alínea d), e 57.°, n.° 2, alínea a), da Constituição.

Só não seria assim, porventura, se se demonstrasse que a não audição das associações sindicais e das comissões de trabalhadores na fase de elaboração da própria lei de autorização legislativa, e relativamente a esta, precludiria a possibilidade de exercício útil do direito reconhecido nesses preceitos constitucionais àquelas associações e comissões. Então, ainda se poderia invocar uma razão substantiva ou prático-material para, «contornando» embora o resultado decorrente da simples (mas necessariamente primária e fundamental) consideração dos dados jurídico-estruturais em presença, dever «estender-se» a qualificação «legislação do trabalho» inclusivamente à «lei de autorização». Mas não só não é esse o caso, como semelhante «extensão» conduziria mesmo a consequências incongruentes.

Não é esse o caso, porque a audição das associações sindicais e das comissões de trabalhadores com referência apenas ao decreto-lei autorizado conserva no essencial as suas virtualidades e potencialidades, como modo adequado de «participação» dessas organizações na elaboração da legislação laboral.

De facto, tal «direito de participação» traduz-se fundamentalmente num «direito de audição» (e no correspondente «dever de consulta») das organizações representativas dos trabalhadores, em tais termos que a estas seja dado conhecimento dos projectos de diplomas laborais antes de os mesmos serem definitivamente aprovados e a possibilidade de sobre eles se pronunciarem junto das instâncias legislativas, em ordem a poderem «influenciar» as decisões destas (neste sentido, cf. Acórdão n.° 22/86, Diário da República, 1.» série, de 29 de Abril de 1986, e também Acórdãos n.°5 31/84, Acórdãos do Tribunal Constitucional, 2.° vol., p. 495, e 15/88, Diário da República, 1.* série, de 3 de Fevereiro de 1988).

Ora a verdade é que a audição dos representantes dos trabalhadores simplesmente na fase da elaboração do decreto-lei autorizado preenche plenamente os requisitos ou exigências apontadas: por um lado, e em primeiro lugar, porque vai ainda a tempo de influenciar as decisões da instância legislativa (no caso, o Governo), podendo perfeitamente levá-la a inflectir a seu propósito e orientação inicial e, no limite, inclusivamente a não fazer uso da autorização parlamentar obtida; por outro lado, e depois, porque se trata mesmo de uma audição mais alargada e completa, porquanto é feita já à vista das normas «acabadas» que se pretende fazer inserir no corpus júris laboral (como, de resto, é exigível).

Mas ao facto de se não mostrar «necessária», e muito menos «imprescindível», a audição das organizações representantivas dos trabalhadores relativamente à lei de autorização (recte, à correspondente «proposta»), acresce que semelhante audição levaria inclusivamente, como se disse, a consequências incongruentes, ou, no mínimo, excessivas. É que, então, e publicada a lei de autorização, uma de duas: ou se voltaria a promover uma nova «audição» de tais organizações, agora com referência ao projecto de decreto--lei, e teríamos uma «dupla audição», cuja «obrigatoriedade» não é uma exigência constitucional, e antes se afigura excessiva; ou, em alternativa, não se iria proceder a essa nova audição, e teríamos um resultado claramente contrário à Constituição (pois que o direito de as associações sindicais e comissões de trabalhadores se pronunciarem sobre a «legislação do trabalho» não pode reportar-se simplesmente aos «princípios», «directrizes» e «orientações» gerais informadoras da mesma legislação, mas há-de obviamente abranger, em toda a extensão, o conteúdo concretizado e preciso das respectivas «normas»).

Eis quanto, do nosso ponto de vista, é por si decisivo para concluir que não foi infringido, na hipótese, «o direito de participação» consagrado nos preceitos constitucionais atrás citados.

b) A isto, porém, cumpre acrescentar que nem sequer pode dizer-se que não tenha havido lugar, no processo legislativo em causa, à «participação» — e, consequentemente, à «audição» — das organizações representativas de trabalhadores.

Desta dá conta, nomeadamente, o relatório da proposta de lei n.° 35/V, que esteve justamente na base do Decreto n.° 81/V, da Assembleia da República, em apreciação (v. Diário da Assembleia da República, 2." série, n.° 54, de 9 de Março de 1983). Assim — como aí se refere —, o Governo fez publicar no Boletim do Trabalho e Emprego, de 17 de Dezembro de 1987, o primeiro projecto (anteprojecto) de diploma, sobre a matéria em questão, que se propunha emitir, depois de obtida a necessária autorização legislativa; e, no seguimento de tal publicação, e em consequência da apreciação do diploma que a mesma se destinou a assegurar, foram-lhe enviados (ao Governo) nada menos de 346 contributos críticos por parte de 194 associações sindicais e de 152 comissões de trabalhadores e respectivas comissões coordenadoras. Mas além do que vem de referir-se — e é o essencial em matéria de obrigação constitucional de audição —, sucede que, antes e depois desse período de apreciação pública, «se desenvolveu uma fase de intensas consultas entre o Governo e os parceiros sociais», quer em reuniões isoladas quer em reuniões em sede do Conselho Permanente de