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II SÉRIE — NÚMERO 82

Considero incontrovertível que a garantia das nacionalizações implica garantia de tudo o que foi nacionalizado. Ora, o que historicamente foi nacionalizado foram as empresas enquanto tais, na sua totalidade, de modo a torná-las exclusivamente públicas, eliminando de todo em todo o capital privado. Disto só há que ressalvar as participações de capital estrangeiro, que foram preservadas, mas, abstraindo disso, o propósito expresso das nacionalizações foi o de nacionalizar as empresas a 100 %, furtando-as integralmente à lógica do capital privado.

O objecto da nacionalização não foi um determinado montante de capital social, ou um certo volume patrimonial; foi a empresa enquanto tal, independentemente do seu capital e do seu património concreto em certo momento.

O sentido das nacionalizações não foi apenas conferir ao Estado posição dominante no capital das empresas nacionalizadas e na sua gestão. Para isso bastar--lhe-ia nacionalizar uma parte maioritária do capital e, em alguns casos, nem sequer precisaria de ter nacionalizado nada, pois a participação pública em várias empresas nacionalizadas já era dominante antes da nacionalização.

A razão de ser das nacionalizações foi a de subordinar as empresas nacionalizadas a uma lógica exclusivamente pública, sem ter de fazer concessões ao capital privado e aos valores do lucro que este predominantemente implica.

Ora, são estas as nacionalizações concretas que estão constitucionalmente garantidas.

São essas nacionalizações, tal como foram efectuadas, que estão constitucionalmente protegidas.

O artigo 83.° da CRP mais não é do que a consolidação jurídica do status quo em matéria de nacionalizações, uma garantia do adquirido, uma proibição de modificação da situação estabelecida.

2 — Sentido e alcance das nacionalizações

O artigo 83.° não garante as nacionalizações em abstracto. Considera irreversíveis, concretamente, as nacionalizações efectuadas no período revolucionário, naturalmente com o sentido e alcance que tiveram.

A garantia constitucional das nacionalizações abrange, por isso, as nacionalizações tal como foram feitas. O sentido da garantia constitucional é o de que o que foi nacionalizado, nacionalizado está. O que a CRP impede é que deixe de estar nacionalizado, no todo ou em parte, aquilo que foi nacionalizado.

Ora, o que é que foi nacionalizado? Qual foi o objecto das nacionalizações?

É fácil responder.

Uma rápida vista de olhos sobre os diplomas que procederam às nacionalizações mostra superabundan-temente que, salvo nos casos de empresas com participação de capital estrangeiro —em que a nacionalização teve por objecto apenas o capital nacional—, nos demais casos (que são a esmagadora maioria) a nacionalização incidiu sobre a empresa em si mesma (sem cuidar sequer de distinguir o capital que já era público à data da nacionalização).

Vale a pena mencionar alguns exemplos ilustrativos:

Decreto-Lei n.° 132-A/75, de 14 de Março (nacionalização da banca):

Artigo 1.° — 1 — São nacionalizadas todas as instituições de crédito [...}

Decreto-Lei n.° 135-A/75, de 15 de Março (nacionalização dos seguros):

Artigo 1.° — 1 — São nacionalizadas todas as companhias de seguros [...]

Decreto-Lei n.° 221-A/75, de 9 de Maio (nacionalização dos cimentos):

Artigo 1.° — 1 — São declaradas nacionalizadas [...] as sociedades a seguir indicadas [..]

2 — São nacionalizadas as acções da SECIL [...] salvo as pertencentes a indivíduos de nacionalidade estrangeira [...]

Decreto-Lei n.° 205-A/75, de 16 de Abril (nacionalização do sector petrolífero) :

Artigo 1.° — 1 — São declaradas nacionalizadas [... ] as sociedades petrolíferas a seguir indicadas [...]

2 — São nacionalizadas as quotas da [...] SOPONATA pertencentes a sociedades [... j que reúnam os requisitos de nacionalidade portuguesa [...]

Decreto-Lei n.° 205-B/75, de 16 de Abril (nacionalização da CP):

Artigo 1.° — 1 —A Companhia dos Caminhos de Ferro Portugueses é declarada nacionalizada [...]

Decreto-Lei n.° 205-G/75, de 16 de Abril (nacionalização das companhias de electricidade):

Artigo 1.° — 1 — São declaradas nacionalizadas [...] as sociedades exploradoras do serviço público de produção, transporte e distribuição de energia eléctrica a seguir indicadas [...]

Decreto-Lei n.° 434/75, de 14 de Agosto (nacionalização de empresas mineiras):

Artigo 1.° — 1—É declarada nacionalizada [...] a Sociedade Mineira Santiago, S. A. R. L.

2 — São igualmente declaradas nacionalizadas [...] as acções das Pirites Alentejanas, S. A. R. L., salvo as pertencentes a indivíduos de nacionalidade estrangeira [...]

Os exemplos poderiam multiplicar-se. O que neles se mostra inequivocamente é que, salvo no caso de empresas com capital estrangeiro, o que foi nacionalizado foi a empresa em si mesma, a empresa na sua globalidade. Para não restarem nenhumas dúvidas a esse respeito, os diplomas de nacionalização contêm um preceito que reza assim:

A universalidade dos bens, direitos e obrigações que integram o activo e o passivo das sociedades nacionalizadas ou que se encontrem afectos à sua exploração são transferidos para o Estado, integrados no património autónomo das respectivas empresas ou a eles igualmente afectos. [V., por exemplo, o artigo 3.°, n.° 1, do Decreto-Lei n.° 221-A/75, o artigo 3.°, n.° 1, do Decreto--Lei n.° 221-B/75 e o artigo 3.°, n.° 1, do Decreto-Lei n.° 205-A/75, etc.J