30 DE JANEIRO DE 1999
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gânica e materialmente, a regias do mesmo tipo. Assim, o bilhete de identidade e a sua emissão estão lado a lado com o registo criminal e a emissão do respectivo certificado, com ò registo especial de menores para as decisões judiciais que lhes apliquem medidas de internamente, com o registo de contumazes e a emissão do certificado de contumácia. No plano legislativo e no plano administrativo, tudo se passa como se houvesse continuidade entre as duas especies de identificação.
A proposta de lei n.° 197/VJJ dá, ao contrario e no seguimento di extinção do Centro de Identificação Civil e Criminal (Decreto-Lei n.° 148/93, de 3 de Maio), o passo de separar materialmente a identificação civil da identificação criminal, tratando exclusivamente da primeira (artigos 1.°, n.° l, e 20.°), como já foi dito.
b) O Decreto-Lei n.° 64/76 mandava o Centro de Identificação Civil e Criminal «organizar um arquivo de dados de identificação civil, de modo a facultar a sua consulta rápida» [artigo 65.°, alinea c)].
A proposta de lei revela neste ponto urna grande ambição, ao determinar que os dados pessoais individualizados sejam recolhidos numa base de dados (artigos 20." e seguintes), isto é, num sistema, conforme a definição do artigo 2.° da Lei n.° 10/91, vigente à data da apresentação da proposta de lei, «de dados inter-relacionados, armazenados e estruturados com controlo de redundancia, destinados a servir uma ou mais aplicações informáticas». Por conseguinte, a futura lei mandará integrar as informações recolhidas nos processos individuais de emissão do bilhete de identidade num ficheiro de âmbito nacional de natureza informática.
c) A exposição de motivos anuncia um outro passo significativo. Lê-se aí, com efeito, que «a segurança física do documento (bilhete de identidade) repousa particularmente na impossibilidade de substituição da fotografia, uma vez que esta será digitalizada e inserida no próprio documento. A assinatura será igualmente digitalizada».
Fica-se, assim, a saber que o Governo pretende um bilhete de identidade em consonância com as possibilidades tecnológicas dos nossos dias — na linha, porventura, do que as instituições bancárias já fazem, por muito lado, nos cartões de crédito. Só que o articulado da proposta de lei não dá uma clara forma jurídica a tal intenção. O Governo quer apenas ficar legalmente habilitado a inserir a fotografia e a assinatura digitalizadas no próprio documento quando puder (cum potuerit)? Para tal poderá servir o artigo 17.°, na medida em que define os meios de autenticação do documento através da disjuntiva «aposição do selo branco ou de outros elementos de segurança». No último ramo da alternadva cabe, claro é, a digitalização dos elementos identificadores em apreço.
4 — A ordem comunitária não inclui quaisquer orientações políticas ou normativas relativas à harmonização do bilhete de identidade. Não obstante de quando em quando se levantarem no Parlamento Europeu vozes a solicitar a criação de um bilhete de identidade europeu — um euro bilhete de identidade, como a moeda única? —, a verdade é que a Comissão e o Conselho vêm trilhando vias diferentes e, até, opostas.
d) Assim, a Comissão, em resposta a perguntas de euro-deputados [v. Debates do Parlamento Europeu, de 20 de Janeiro de 1993, pergunta 94, e de 12 de Julho de 1995, pergunta 72, e Jornal Oficial, n.° C 365, de 4 de Dezembro de 1996, pergunta de Claude Desama (PSE)], tem deixado claro que «o conteúdo e a apresentação dos bilhetes de identidade são assuntos de exclusiva responsabilidade dos Estados membros. A Comissão não possui projecto algum que
vise a instituição de um bilhete de identidade europeu comum» (citação de 20 de Janeiro de 1993) e «a Comissão considera, de momento, inoportuna uma harmonização de um modelo de bilhete de identidade, que não abrangeria todos os cidadãos da União», visto não ser ele previsto «por um número significativo de Estados membros» (citação de 12 de Julho de 1995).
Diferentemente já se passam as coisas em relação ao-passaporte. Numa das citadas respostas, a Comissão informa que «os Estados membros decidiram, em 1981, a utilização de um modelo tipo para os passaportes europeus, ¿0 qual constam características comuns, tais como o formato, a cor e as menções apostas» (citação de. 12 de Julho de 1995). Pode falar-se, pois, de um princípio de harmonização desta espécie de documento de identificação.
b) O Conselho, no prazo de cinco anos após a entrada em vigor do Tratado de Amsterdão, deverá adoptar medidas para assegurar a ausência de controlos de pessoas na passagem das fronteiras internas. Mas daqui não se poderá concluir que o bilhete de identidade comum venha a ser o instrumento usado para o efeito.
Pelo menos por agora o Conselho quer incentivar o conhecimento recíproco, por parte dos funcionários dos Estados membros, das diversas técnicas de produção e de controlo dos documentos de identidade praticadas no espaço europeu, a fim de possibilitar um combate mais eficaz à respectiva falsificação. Não Visa a uniformização ou harmonização destas técnicas; visa é que o corpo dps funcionários competentes em cada Estado membro se enriqueça com o conhecimento daquilo que a tal respeito os outros sabem e fazem.
É em tal ideia que se inspira a acção comum de 28 de Outubro de 1996, adoptada pelo Conselho, que institui um programa deformação e intercâmbio e de cooperação no domínio dos documentos de identidade, denominado «Sher-lock» (JO, n.° L 287, de 8 de Novembro de 1996).
c) O que se diz nas duas alíneas anteriores aconselha-nos a interpretar em termos hábeis a referência à Convenção de Aplicação do Acordo de Schengen e à exigência de um bilhete de identidade «dotado das características comuns à generalidade dos países da União Europeia» (cf. exposição de motivos).
Por um lado, essa Convenção nada tem a ver com a identificação civil: se de alguma identificação trata é de identificação criminal—que a proposta de lei exclui do seu âmbito de aplicação. Os dados pessoais a que se refere o ponto 94.° da Convenção dizem respeito às pessoas indicadas para serem incluídas no Sistema de Informação Schengen — contando-se, entre esses dados, por exemplo, a informação de que as pessoas em causa andam armadas ou são violentas...
Por outro lado, os países da União Europeia mantêm as mais diversas tradições em matéria de documentação referente à identidade civil e, como se viu, não há políticas nem normas comunitárias tendentes à harmonização dos bilhetes de identidade emitidos no espaço europeu.
ni — 5 — Entre as alterações do direito vigente visadas pela proposta de lei n.° 197/VII parecem de salientar as relativas à eficácia do bilhete de identidade e ao conteúdo das informações nele contidas.
a) Os bilhetes de identidade cujo prazo de validade tenha sido ultrapassado «são nulos e não poderão ser usados para qualquer efeito», segundo o artigo 260.°, n.° 1, do Decreto-Lei n." 64/76. Em rigor, dir-se-ia que caducam, passando a sofrer de uma ineficácia jurídica absoluta.