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4 DE MARÇO DE 1999

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PROPOSTA DE LEI N.º 194/VII

(GARANTE UMA MAIOR IGUALDADE DE OPORTUNIDADES NA PARTICIPAÇÃO DE CIDADÃOS DE CADA SEXO, NAS LISTAS DE CANDIDATURA APRESENTADAS NAS ELEIÇÕES PARA A ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA E PARA O PARLAMENTO EUROPEU QUANTO AOS DEPUTADOS A ELEGER POR PORTUGAL)

Relatório e parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias

Relatório

O Governo apresentou à Assembleia da República uma proposta de lei que tem por objecto garantir uma maior igualdade de oportunidades na participação de cidadãos de cada sexo nas listas de candidatura apresentadas nas eleições para a Assembleia da República e para o Parlamento Europeu.

Essa apresentação foi efectuada nos termos da alínea d) do n.° 1 do artigo 197." da Constituição da República Portuguesa e do artigo 130.° do Regimento da Assembleia da República.

A proposta vertente foi aprovada no Conselho de Ministros de 25 de Junho de 1998, tendo baixado às 1." e 12.° Comissões, por despacho de S. Ex.° o Presidente da Assembleia da República, em 6 de Julho de 1998, para emissão dos respectivos relatórios e pareceres.

A discussão, na generalidade, desta iniciativa foi agendada para a reunião plenária de 4 de Março.

I — A questão em debate

25 anos após a revolução de Abril verifica-se, em Portugal, um chocante contraste entre a escassa participação política das mulheres e a evolução global positiva da sua situação, tanto no plano do estatuto jurídico como no quotidiano da vida económica, social e cultural.

Em cada vez mais áreas tem-se vindo a assistir a alterações sensíveis dos desequilíbrios tradicionais na participação. Em poucos anos, a uma velocidade que surpreende muitos observadores da nossa sociedade, a presença feminina tornou-se dominante em sectores de actividade outrora reservados a homens.

Porém, no plano da participação política não só não se verifica tendência similar como persistem antiquíssimas discriminações, sucessivamente renovadas, gerando um défice de representação que afecta a qualidade do sistema político e empobrece a vida pública portuguesa.

Sobre a existência desse défice e os seus malefícios existe hoje um vastíssimo consenso nas instituições e na sociedade.

Nenhuma força política ergue entre nós o ignominioso estandarte da desigualdade e estão desde há muito enterradas as velhas teses do Estado corporativo, que ditavam como «natural» o destino subalterno da mulher e como «desejável» o seu confinamento entre paredes do lar, sob a autoridade firme do «chefe de família», concebido como emanação doméstica do ditador que governava o «Portugal amordaçado».

Mas que medidas devem ser adoptadas para alterar a anómala situação que persiste em matéria de participação política? Em que planos e a que níveis? Em particular, como deve o legislador posicionar-se, na sua esfera de competência própria, com vista a contribuir para a mudança necessária, rumo a uma sociedade liberta de discriminações?

Sobre esta questão não existe consenso e durante muito tempo faltou mesmo uma clara formulação de alternativas susceptíveis de alimentar o debate público.

Portugal tem acompanhado desde há anos, com intensificação gradual na década de 90, o debate internacional sobre o tema. O Estado Português assumiu sucessivos compromissos internacionais no que diz respeito à eliminação de múltiplas formas de discriminação [o Tratado de Amsterdão que a Assembleia da República aprovou, para ratificação, no dia 6 de Janeiro de 1999, veio consagrar a igualdade entre homens e mulheres como princípio fundamental da ordem comunitária. O artigo 2.° dispõe expressamente que a Comunidade tem como missão «promover a igualdade entre homens e mulheres». Para alcançar este fim o artigo 3.° sublinha que na realização de todas as acções a Comunidade terá por objectivo eliminar a desigualdade e promover a igualdade entre homens e mulheres. A igualdade tornou-se, assim, num dos princípios do Tratado e um dos objectivos de acção da União. Este deverá ser capaz de reflectir a igualdade em todas as suas políticas. No título respeitante à política social são igualmente adoptadas disposições precisas para promover a igualdade entre homens e mulheres (artigo 137.°). Verifica-se, assim, que se até à Cimeira de Amsterdão a questão da igualdade estava nos tratados circunscrita à questão salarial e laboral, agora evoluiu-se para um catapultar da igualdade como missão da União. A introdução da igualdade no Tratado é, por isso, de uma enorme importância jurídica e política. A igualdade entre homens e mulheres está agora contemplada numa norma de direito comunitário primário, de um nível jurídico superior às regras comunitárias de direito derivado, pelo que tem de ser respeitada e reflectir-se em todas as demais normas comunitárias. Nos termos do Tratado, os Estados membros terão mesmo o direito de implementar a discriminação positiva nos casos em que os factos revelem claramente que não existe verdadeira igualdade de oportunidades entre homens e mulheres] e criou estruturas encarregadas de velar pela igualdade de oportunidades.

Por outro lado, graças aos esforços de muitas organizações sociais, de forma autónoma ou em conjugação, foi também lançado em Portugal o debate sobre a «democracia paritária», que um meticuloso trabalho de elaboração, no âmbito do Conselho da Europa, permitiu configurar como estádio superior de uma democracia avançada e reinventada (cf. Maria Regina Tavares da Silva, Democracia Paritária, Um Conceito Novo ou Um Novo Olhar sobre a Democracia, colecção Ditos & e Escritos, n.° 6, 1993, edições da Comissão para a Igualdade e para os Direitos das Mulheres, Ministério do Emprego e da Segurança Social, Maria de Lourdes Pintasilgo, «La Démocratie paritaire: une nouvelle intelligence dans les rapports sociaux» in Les enjeux de la Grande Europe — Le Conseil de l'Europe et la Sécurité démocratique, Srasbourg, La Nuée Bleue et le Conseil de l'Europe, 1996).

Todos esses esforços foram, no entanto, insuficientes para modelar e executar com êxito uma estratégia de resposta eficaz à situação de défice participativo diagnosticada.

II — A revisão constitucional e o novo impulso ao combate à discriminação

1 —No processo de revisão constitucional de 1996--1997, o problema foi longamente debatido, tendo conduzido a alterações especificamente destinadas a dar novo impulso ao combate ao défice de participação na vida política.