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II SÉRIE-A —NÚMERO 41

ção de mulheres e homens, o chamado limiar de paridade. Definido em 40% de representação mínima para ambos os sexos, considerou-se que este é o limiar a partir do qual a realização da democracia paritária é exequível e preconizou-se uma estratégia de metas quantitativas progressivas até que a paridade passe a constituir um princípio tão estruturante do ordenamento das sociedades democráticas como o sufrágio universal, a separação de poderes e o primado da lei.

Não se trata, portanto, de quotas, ou seja, de medidas especiais temporárias, destinadas a corrigir desequilíbrios circunstanciais ou efémeros ou a promover categorias sociais ou grupos minoritários, mas antes da aplicação de uma medida de forma real e permanente.

Na sequência do debate sobre o aprofundamento da democracia, empreendido pelo Conselho da Europa, e cujas conclusões são um assinalável contributo para o avanço da doutrina, as organizações não governamentais de defesa dos direitos das mulheres tomaram consciência de que a exclusão de mais de metade da população do efectivo exercício da cidadania, sendo uma violação dos direitos humanos, constitui igualmente um grave défice democrático, cujas repercussões atingem não apenas as mulheres, elas próprias, mas a sociedade no seu conjunto e a qualidade de vida das pessoas e da comunidade.

De facto, a disparidade entre o avanço permanente da participação das mulheres em quase todos os domínios da sociedade e a estagnação da sua participação nas instâncias de decisão política é, a todos os títulos e cada vez mais, inaceitável. Dirigindo-se as leis e as políticas a todos sem excepção, poderá legitimamente interrogar-se se a ausência das mulheres nas estruturas de poder não resulta na inadequação da decisão às realidades concretas, no aprofundar do fosso entre eleitos e eleitores e, porventura, no agravar do perigoso descrédito das instituições democráticas junto da opinião pública.

Reafirmando a sua unanimidade em torno do conceito da paridade, tal como é definido pelo Conselho da Europa, as organizações não governamentais de defesa dos direitos das mulheres consideram que a proposta de lei em audição apenas serve parcialmente este conceito. Antes tratando-se de medida paliativa à sub-representação das mulheres, como se o poder político, no seu exercício legislativo, estivesse dividido entre, por um lado, a sua má consciência de actor privilegiado do sistema e, por outro, os preconceitos dominantes.

De facto, a «Exposição de motivos» que sustenta o articulado não só omite os argumentos dos textos de referência sobre esta matéria como enferma de vários equívocos, dos quais o mais grave diz respeito à definição de democracia paritária, sobre a qual levanta uma suspeição inteiramente infundada, baseada em pressupostos absurdos, num verdadeiro processo de intenções tanto mais despropositado quanto nem as organizações não governamentais de defesa dos direitos das mulheres nem as personalidades que advogam a realização de uma democracia paritária jamais se pronunciaram por forma a autorizar a dedução das conclusões apresentadas. Sugere-se a leitura do documento do Conselho da Europa atrás citado que desenvolve o conceito de democracia paritária em termos totalmente opostos aos da proposta de lei.

Sobre esta matéria, as organizações não governamentais defesa dos direitos das mulheres entendem manifestar a sua enorme perplexidade, tanto maior quanto o responsável governamental pelo dossier da lei eleitoral se pronunciou

frequente e publicamente dentro dos mais correctos parâmeuos doutrinários, (v. intervenção do Ministro dos Assuntos Parlamentares na sessão plenária da Assembleia * da República de 14 de Janeiro 1998), e chamam a atenção para o mau serviço que se presta ao debate generalizado na sociedade sobre o aperfeiçoamento da democracia quando se recorre a uma terminologia consagrada, como «democracia paritária», para lhe atribuir uma definição errónea, sobre ela emitir juízos abusivos e dela se deduzirem ilações absolutamente despropositadas.

Uma mais rigorosa fundamentação do articulado da proposta de lei teria, porventura, evitado a polarização de uma polémica em torno da questão das quotas.

Ainda relativamente à proposta de lei, as organizações não governamentais de defesa dos direitos das mulheres entendem qué:

1 — Quanto ao âmbito, não se encontra fundamento para a sua não aplicação às Assembleias Regionais e aos órgãos colectivos do poder local o que poderá vir a conduzir à impugnação das listas apresentadas a estes órgãos por omissão inconstitucional. Acresce que esta exclusão de aplicação vem, afinal, contradizer o discurso político até agora dominante que entendia ser salutar exigir às mulheres o cumprimento de um percurso político que exactamente se iniciaria no poder local. Salutar exigência, à qual, de resto, a maioria dos actuais quadros políticos nacionais foi até agora poupada...

2 — Quanto às metas percentuais preconizadas, há que considerar que, não estando prevista uma obrigação de resultados, a atribuição dos mandatos, decorrentes do escrutínio dos votos validamente expressos, determinará a constituição de órgãos de decisão que, nem mesmo no quadro limite mais favorável de aplicação desta lei, beneficiarão de uma participação feminina a um nível mínimo gerador de massa crítica relevante, ou seja, um terço. Isto é, para a presente proposta de lei, não só o limiar de paridade não constitui um objectivo a prosseguir, como nem em 2007, esgotada a vigência, o nível mínimo de massa crítica estará garantido!

Ao estabelecer um calendário tão distendido no tempo e metas tão tímidas quase se poderia afirmar, sem perigo de incorrer em injustiça, que a geração que actualmente detém o poder não aspira a partilhá-lo no seu horizonte de vida política!

3 — Quanto às disposições visando estender às Deputadas e aos Deputados os direitos já consagrados na lei geral no que respeita à maternidade e paternidade, considera-se correcta a sua extensão; todavia, não se entende:

Alcance do n.° 1. do artigo 3.°, de cuja formulação se podem deduzir aplicações que a lei geral não consagra;

Por que não se recorre ao rigor dos conceitos que a própria lei geral consagra e, ao invés de se referir apenas a maternidade, não se refere maternidade/paternidade.

4 — Por último, ao não estar prevista nesta proposta de lei uma disposição que, finda a sua vigência, garanta a continuidade dos esforços legislativos no sentido da igualdade de oportunidades no acesso aos cargos políticos conforme os comandos constitucionais, esta lei esgota-se num resultado final para o fim da 1." década do próximo milénio, que, a verificar-se — 33,3% nas listas de candidatura, que se traduziriam grosso modo em cerca de 25%