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II SÉRIE-A —NÚMERO 41
questão de outras questões que existem ou que poderiam existir na sociedade portuguesa.
É que esta, se quisermos, é uma questão constitucional da sociedade. Quer dizer, independentemente de manifestações que possam ocorrer, a verdade é que a generalidade das famílias portuguesas é constituída por homens e por mulheres e os outros órgãos da nossa sociedade tendem a ser constituídos por homens e por mulheres e, portanto, esta é uma questão verdadeiramente estrutural da nossa sociedade. Não quero, digamos, ir agora a precedentes bíblicos, mas, do meu ponto de vista, há uma paridade do homem e da mulher na construção do mundo, se quisermos assim, e na existência do mundo e, por isso, é essa questão fundamental ou é a essa questão que eu aqui gostaria de dirigir-me, independentemente de outras que possam sê-lo.
Agora, devo dizer o seguinte.- à medida que vou envelhecendo, vou, enfim, aumentando a capacidade de análise sobre os problemas da sociedade e há um princípio geral que, cada vez, em mim se enraíza mais: é de que é necessário ter muitas vezes instrumentos aparentemente desiguais para garantir uma igualdade substancial. E esta é uma questão decisiva. A grande questão, que foi muito bem posta pela Sr.° Deputada, é o cuidado de evitar que esses instrumentos surjam como lógicas de anatemização ou de menorização.
Mas, já agora que estamos a falar com muito à-vontade e com muita franqueza, gostaria de dizer, em relação a isto, o que decorre da minha experiência.
Acho que há uma grande resistência das mulheres que triunfaram na política em relação a princípios deste género que, em minha opinião, é uma resistência um pouco perversa e que é a de dizer «se eu triunfei sozinha por que é que outros hão-de ter instrumentos de outra natureza Não queria fazer nenhum paralelo, mas o paralelo que vou fazer é grotesco e aceito que o seja, mas faz-me lembrar alguma manifestação e de maneira nenhuma a quero pôr até porque conheço a Sr.° Deputada e sei que está nos antípodas desse pensamento. Mas, faz-me lembrar uma certa lógica de raciocínio que diz o seguinte: «qualquer filho de uma família pobre tem a oportunidade de triunfar na vida como qualquer filho de uma família rica, desde que trabalhe». Isto ouve-se muito e sabemos que estatisticamente não é assim. É assim, em muitos casos, felizmente, mas estatisticamente não é assim. Há circunstâncias objectivas que tornam mais difícil certas caminhadas. Pronto. Não estou a estabelecer nenhum paralelismo entre as duas situações. Não é o caso. Agora, que há circunstâncias objectivas que tornam mais difíceis certas caminhadas, há. E que às vezes não é fácil remover essas circunstâncias objectivas todas elas de uma só vez e rapidamente, também creio que é verdade. Daí, a utilidade de medidas desta natureza. Agora, reconheço integralmente que isto não é uma questão óbvia e que as dúvidas que levanta são dúvidas perfeitamente legítimas. Isto não é uma questão óbvia nem esta medida é, se quisermos, uma medida inteiramente natural, que decorra, digamos, da normal resposta aos problemas tal como eles se põem na sociedade. Na minha convicção profunda, ela é uma medida, senão necessária, pelo menos extremamente útil para alcançar um objectivo que me parece muito desejável e que vejo, sinceramente, muito difícil de ultrapassar. 2 — Prof. Marcelo Rebelo de Sousa (presidente do PSD): a) Intervenção inicial: Entendo que, por regra, a finalidade das audições de comissões parlamentares é de ter aqui presentes outros que não os líderes partidários, uma vez que, pela lógica das coisas, os partidos têm os seus representantes naturais, que são os Deputados, e para cada lei que é elaborada se, por sistema, se recorre ao convite aos líderes partidários para virem aqui depor, colocam-se os Deputados numa situação um pouco desagradável e os próprios líderes partidários, uma vez que há Deputados eleitos com a missão de desempenharem essa função. Não têm os líderes partidários de vir aqui, numa posição tutelar ou paternal ou patriarcal, dizer o que pensam os partidos, sendo certo que a palavra decisiva pertence aos Srs. Deputados e aos grupos parlamentares. Além de que, para o funcionamento do Parlamento, imagino o que seriam audições destas a propósito de todas as leis e sendo certo que é uma matéria muito importante, há tantas outras matérias importantes em todos os domínios da legislação parlamentar. Dito isto, em qualquer caso, vim na sequência de uma conversa com a St." Presidente, no fim-de-semana, porque podia haver o risco de se entender que a razão por que não vinha era substancial e não procedimental. E, portanto, podia dizer-se que o presidente do PSD fugia a dizer o que pensava enquanto presidente do PSD sobre esta matéria e não estava presente por ter dúvidas sobre a generalização desta metodologia de contacto entre líderes partidários e a Assembleia da República. Dito isto, penso que todos estaremos de acordo —é pelo menos essa a posição do PSD — e estou tanto mais à vontade quanto o grupo parlamentar já deliberou sobre esta matéria, tanto que o que venho aqui dizer venho dizê-lo com o à-vontade de o grupo parlamentar, livremente antes, ter deliberado o que pensava e como votava sobre esta matéria, mas penso que estamos todos de acordo quanto a um problema que existe em Portugal e quanto à necessidade da sua solução. Para o PSD, e penso que para os portugueses em geral, há um problema que é o da injustamente reduzida participação das mulheres na vida política e cívk/à portuguesa. É um facto, é um facto a nível das autarquias, é um facto a nível da vida política nacional em órgãos electivos e não electivos, é infelizmente um facto a nível mesmo da Administração Pública Portuguesa. Mais: é um facto chocante quando comparado com o que se passa noutros aspectos da vida portuguesa. Já não falo no que se passa nas universidades, já não falo no que se passa na vida económica e financeira, já não falo no que se passa na vida social, em tantos aspectos. Está a demorar a chegar à política o relevo do papel da mulher, que já começa a existir ou já existe francamente noutros sectores da vida social. Há qualquer coisa de errado no sistema político, há qualquer coisa de errado na vida dos partidos políticos, há qualquer coisa de errado no funcionamento das instituições. E acabam todos eles por funcionar por um princípio que tem que ver, naturalmente, com o peso decisivo de quem lá está, como instituições e como máquinas e como realidades, pensadas sobretudo para a participação dos homens e com o papel mais acentuado da participação dos homens. A meu ver e na óptica do PSD, isto não se relaciona necessariamente com uma posição sistemática dos políticos