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15 DE ABRIL DE 1999

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poderá considerar que a Constituição de 1976 e as leis de enquadramento orçamental que se lhe seguiram tenham procedido a uma completa reforma do direito orçamental português, sem embargo das profundas alterações que introduziram neste domínio. Na verdade, basta recordar que nesta, como noutras áreas do direito financeiro uma grande parte da legislação que permaneceu, e ainda permanece, em vigor— aplicando-se em casos contados e não se aplicando, por razões várias, na esmagadora maioria das situações — foi herdada do Estado Novo.

Não obstante a diversidade das orientações que presidiram às várias reformas orçamentais realizadas em Portugal, desde o século passado, todas elas tiveram um fundamento e um sentido comuns: tratou-se sempre de adequar um sector do ordenamento jurídico tão importante e significativo como é o do direito orçamental aos princípios e aos valores característicos de cada um dos regimes político-constitucio-nais em que essas reformas ocorreram. Ora, é justamente essa adequação que, em boa medida, ainda se enconua por fazer no actual regime democrático.

6 — A Constituição de 1976, as suas sucessivas revisões e as diversas versões da lei de enquadramento do Orçamento do Estado

I — Em matéria orçamental, a versão originária da Constituição de 1976 consagrou as regras orçamentais clássicas, acolheu, embora em novos moldes, a esuutura dualista de aprovação do Orçamento do Estado, herdada da Constituição de 1933, e auibuiu à Assembleia da República o poder de aprovação da Conta Geral do Estado. A estes aspectos mais uadicionais, juntou, no entanto, um conjunto significativo de inovações: institucionalizou o orçamento da segurança social, deu dignidade constitucional à classificação funcional das despesas e esboçou um modelo de articulação enue o Plano e o Orçamento.

A primeira revisão constitucional introduziu uma relevante modificação na distribuição do poder orçamental entre a Assembleia da República e o Governo, substituindo a estrutura dualista de aprovação orçamental por um modelo mo-nista, de acordo com o qual a aprovação do Orçamento do Estado compete apenas à Assembleia, limitando-se o Governo à preparação e à execução do mesmo. E, na mesma linha do reforço dos poderes orçamentais da Assembleia, esta deixou de aprovar apenas as «linhas fundamentais de organização do orçamento da segurança social», para passar a aprovar este mesmo orçamento.

Por seu turno, a revisão constitucional de 1989 introduziu novas regras quanto ao conteúdo e à estrutura do orçamento. Reforçou os princípios da plenitude e da especificação orçamental, determinando a discriminação, no Orçamento do Estado, das receitas e das despesas dos serviços e fundos autônomos; contemplou a possibilidade de o orçamento se estruturar por programas; clarificou o valor reforçado da lei de enquadramento orçamental; determinou que esta deveria incluir «o regime atinente à elaboração e execução dos orçamentos dos fundos e serviços autónomos» e fixou um acervo de relatórios informativos anexos à proposta de lei de orçamento.

Por fim, para além de alguns aperfeiçoamentos de carácter formal, na última revisão constitucional (1997), foi novamente objecto de alteração a matéria relativa ao relacionamento entre o Orçamento e o Plano. Em consequência das modificações introduzidas no regime dos planos (artigos 90.° e 91° da Constituição da República Portuguesa de 1997), deixou de fazer-se referência ao plano anual enquanto vinculação orçamental, passando apenas a referir-se as grandes

opções em matéria de planeamento (artigo 105.°, n.°2, da Constituição da República Portuguesa de 1997). Não obstante, aproveitou-se a oportunidade para dar consagração constitucional expressa ao princípio da anualidade orçamental, agora prevista no n.° I do artigo 106.°

Para além destas alterações, foram ainda introduzidas ouuas de maior relevo, em termos substanciais, numa linha de acentuação do princípio da legalidade financeira, que tem vindo a reforçar-se ao longo das sucessivas revisões constitucionais. Por um lado, com menor efeito prático — uma vez que se trata de dar dignidade constitucional a uma obrigação já prevista na actual lei de enquadramento —, passou a exigir-se que a proposta de lei do Orçamento fosse acompanhada dè um relatório sobre as transferências de verbas para as autarquias locais [artigo 106.°, n.°3, alínea e)]; e, por ouUo, no que constituirá, porventura, uma das alterações mais importantes, transferiu-se do âmbito da reserva relativa de competência da Assembleia da República para a sua esfera de reserva absoluta de competência a matéria respeitante ao regime geral de elaboração e organização dos orçamentos do Estado, das Regiões Autónomas e das autarquias locais, atribuindo-se-lhe ainda a definição do regime de finanças das Regiões Autónomas [artigo 164.°, alíneas r) e t)].

No que diz respeito à fiscalização orçamental, para além das modificações em sede de organização e funcionamento do Tribunal de Contas (artigo 214.° da Constituição da República Portuguesa de 1997), foi também alterada a regra relativa à articulação enue as actividades de fiscalização política e jurisdicional, deixando de se prever, para efeitos de fiscalização política, a hipótese de o parecer do Tribunal de Contas não estar elaborado [artigo 162.°, alínea d)].

II — Apesar das incidências destas revisões constitucionais no domínio orçamental, muitas delas nunca lograram obter a devida expressão nas diversas versões da lei de enquadramento do Orçamento do Estado. Disso constituem exemplos a disciplina do orçamento da segurança social, a estruturação do Orçamento do Estado por programas, «o regime atinente à elaboração e execução dos orçamentos dos fundos e serviços autónomos» e, mais recentemente, o procedimento e o prazo de apresentação à Assembleia da República do parecer do Tribunal de Contas sobre a Conta Geral do Estado.

Na verdade, nenhuma destas matérias é disciplinada na Lei n.°6/91, de 20 de Fevereiro, com as alterações que lhe foram introduzidas pela Lei n.° 53/93, de 30 de Julho, apesar de, na vigência da Constituição de 1976, aquela lei constituir o terceiro diploma relativo ao enquadramento orçamental, tendo sido precedida pela Lei n.° 40/83, de 13 de Dezembro, e pela Lei n.° 64/77, de 26 de Agosto.

Estas diversas versões da lei de enquadramento do Orçamento do Estado não apresentam diferenças significativas ou substanciais entre si. Com efeito, as versões posteriores à Lei n.° 64/77, de 26 de Agosto, limitaram-se a inUoduzir no texto original desta lei as modificações imprescindíveis para o adequarem minimamente às alterações sofridas pelos preceitos da Constituição relativos ao Orçamento do Estado por ocasião das revisões constitucionais de 1982 e 1989.

Os resultados das opções legislativas subjacentes à feitura das últimas versões da lei de enquadramento do Orçamento do Estado estão bem patentes na actual Lei n.°6/91, de 20 de Fevereiro: por um lado, esta perdeu o grau de congruência e de consistência internas que, apesar de tudo, assistia à Lei n.° 64/77, de 26 de Agosto; por outro, duas décadas após a aprovação desta última lei, a disciplina orçamental nela consagrada — e que, no essencial, continua a ser a que se enconua vertida na actual lei de enquadramento