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16 DE MARÇO DE 2021

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cidadãos.» (v. ob. cit., pp. 218-219). Poderia, pois, argumentar-se que a determinabilidade das causas de

exclusão da responsabilidade jurídico-penal pode ser – como parece ser na situação em análise – igualmente

relevante quando se trate de estabelecer os pressupostos cuja verificação determina a subtração de

determinada conduta ao universo dos comportamentos puníveis, especialmente em domínio tão sensível como

o que está em causa.

Parte deste pressuposto a argumentação desenvolvida no requerimento, que conflui para a conclusão de

que é ainda o princípio da legalidade criminal que demanda «que o legislador forneça ao médico interveniente

no procedimento um quadro legislativo minimamente seguro que possa guiar a sua atuação» (cfr. o ponto 8.º).

Mas, não se vê que esta exigência possa, sem mais, ser reconduzida ao princípio da legalidade da

intervenção penal do Estado. A indeterminação conceitual, quando aplicada a qualquer condição de exclusão

da responsabilidade jurídico-penal, tende a alargar – e não a restringir – as possibilidades de, em concreto, um

comportamento não ser punido. Nessa medida, agirá, em regra, a favor de uma maior proteção dos cidadãos

contra a atuação punitiva do Estado – ainda que aja em prejuízo da tutela penal dos bens jurídicos em

questão.

Se a indeterminação conceitual criticada pelo requerente deve ser, na verdade, censurada, não na medida

em que desprotege os destinatários da norma incriminadora – isto é, por aquilo em que compromete a

possibilidade de compreensão e controlo pelos potenciais agentes do crime do desvalor que continua a

expressar-se no tipo legal –, mas, primacialmente, os bens jurídicos que nela se tutelam, então o juízo

reclamará a convocação do princípio da determinabilidade das leis – não já (ou, pelo menos, principalmente)

enquanto dimensão do princípio consagrado no artigo 29.º, n.º 1, da Constituição – mas como corolário do

princípio do Estado de direito democrático, e da reserva de lei parlamentar, decorrentes das disposições

conjugadas dos artigos 2.º e 165, n.º 1, alínea b), da Constituição da República Portuguesa, por referência ao

direito à vida consagrado no artigo 24.º do mesmo normativo (interpretado, segundo o requerente, de acordo

com o princípio da dignidade da pessoa humana).

37. Ainda que pretendesse reconduzir-se a exigência de determinabilidade invocada no pedido ao princípio

da legalidade criminal, sempre se imporia indagar se, em face do disposto nos artigos 2.º, n.º 1, e 27.º, ambos

do Decreto n.º 109/XIV, pode realmente afirmar-se que o diploma vota os profissionais de saúde intervenientes

no procedimento ou habilitados a «praticar ou ajudar ao ato de antecipação da morte» (identificados no artigo

17.º, n.º 1, do mesmo Decreto) a uma situação de insuperável incerteza quanto aos pressupostos de que

depende em concreto a punição.

A este respeito, recorde-se que este Tribunal tem reiteradamente afirmado que «[s]em que isso signifique

qualquer espécie de renúncia à função de garantia desempenhada pelo tipo legal […], do princípio da

legalidade não decorre para o legislador penal qualquer ónus de, ao definir o universo das ações e omissões

criminalmente relevantes, se socorrer sempre e só de formulações normativas integralmente descritivas e

fechadas.» (v. o Acórdão n.º 606/2018 – II, 18). Por conseguinte, tem admitido com alguma amplitude a

utilização de conceitos indeterminados (v. o Acórdão n.º 20/2019, n.º 16, e a jurisprudência aí citada) bem

como o recurso à «técnica remissiva subjacente às normas penais em branco [que] apresenta a vantagem de

assegurar a permanente sincronização do direito penal com a evolução registada em áreas específicas de

conhecimento ou atividade, desiderato este não concretizável através de uma preferência por enumerações

descritivas e fechadas, por inerência tendencialmente incompletas e estáticas.» (Acórdão n.º 606/2018, II, 18).

Coerentemente, tem-se considerando que as disposições incriminadoras são conciliáveis com as exigências

do princípio da tipicidade sempre que a sua redação, «ainda que indeterminada e aberta, for materialmente

adequada e suficiente para dar a conhecer quais as ações ou omissões que o cidadão deve evitar» (v. o

Acórdão n.º 76/2016, II, 6) – designadamente quando os conceitos materialmente indeterminados se tornem

determináveis por via da remissão para outras disposições legais, regulamentares ou até para pronúncias

administrativas de diversa ordem, e bem assim por apelo às leges artis ou a regras técnicas que os

destinatários das normas devam conhecer (v. entre muitos outros, os Acórdãos n.os

545/2000, 115/2008,

146/2011, 698/2016).

O Decreto em apreço, como se referiu já, propõe que sejam introduzidos preceitos no Código Penal que

determinem a não punibilidade de condutas, por remissão para as condições estabelecidas na Lei a que viria a

dar origem. Com efeito, a formulação adotada pelo legislador, seja para o n.º 3 do artigo 134.º, seja para o n.º