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16 DE MARÇO DE 2021

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Estruturantes de Estado de Direito, Almedina, Coimbra, 2019 [reimpr.], p. 267).

Exige-se, assim, ao legislador, e apenas do legislador, que forneça aos intervenientes no procedimento

administrativo que culmina com a emissão do parecer da CVA critérios com um grau de precisão e

determinabilidade tal, que viabilize a adoção de decisões fundamentadas, congruentes e sindicáveis. O grau

de precisão e de determinabilidade é tanto mais importante quanto se trata de normas que, estabelecendo

critérios ou pressupostos (elementos de previsão da norma) a montante das condutas (futuras, subsequentes

à sua previsão) dos seus destinatários, se destinam a orientar as mesmas no exercício da competência que

lhes é cometida, num quadro procedimental instituído pelo Decreto n.º 109/XIV, sejam destinatários com

natureza pública ou destinatários do sector privado ou social que atuam no quadro de normas jurídico-

públicas.

40. O n.º 1 do artigo 2.º do Decreto em análise contempla diversos pressupostos (elementos de previsão da

norma) cuja formulação não suscita dúvidas – decisão daprópria pessoa; maior; vontade atual, reiterada,

séria, livre e esclarecida; praticada ou ajudada por profissionais de saúde. Mas remete para o médico

orientador, para o médico especialista e para os demais intervenientes no procedimento, com particular

destaque para a CVA, a verificação em concreto do preenchimento dos requisitos de situação de sofrimento

intolerável; lesão definitiva de gravidade extrema de acordo com o consenso científico e doença incurável e

fatal – pressupostos que, afinal, e na ótica do próprio legislador, são fundamentais para que se justifique, à luz

do dever de proteção da vida humana, a não intervenção punitiva do Estado.

O legislador estabelece uma conexão entre estes elementos através do recurso sequencial à preposição

com, seguida da conjunção disjuntiva ou, tornando claro que o sofrimento intolerável é um pressuposto

fundamental, mas apenas quando conjugado com um dos pressupostos seguidamente enunciados, seja a

lesão definitiva de gravidade extrema de acordo com o consenso científico, seja a doença incurável e fatal.

Aliás, a generalidade dos projetos de lei apresentados – ainda que com variações quanto aos conceitos

adotados – optou por uma articulação de dois pressupostos, associando um diagnóstico a um estado, o que

consiste já num primeiro patamar de densificação da previsão normativa [cfr. os projetos de lei do Bloco de

Esquerda (artigo 1.º), do PAN (artigo 3.º), do Partido Socialista (artigo 2.º, n.º 1), do PEV (artigo 3.º) e da IL

(artigo 1.º)].

Noutras disposições, ainda que de índole procedimental, é possível encontrar referência a outros

elementos, que os especialistas intervenientes no procedimento deverão ter em conta na elaboração e

fundamentação dos respetivos pareceres, reveladores dos juízos que destes são esperados. Assim, por

exemplo, no n.º 3 do artigo 3.º, refere-se que o médico orientador se encontra obrigado a consultar e assumir o

historial clínico do doente como «elemento essencial do seu parecer»; no n.º 1 do artigo 4.º, refere-se que ao

doente deve ser prestada informação sobre o prognóstico relativo à situação clínica que afeta o requerente (e

que essa informação deve constar do RCE, nos termos do n.º 2 do artigo 4.º); no n.º 1 do artigo 5.º,

estabelece-se que o médico especialista deve confirmar o diagnóstico e prognóstico da situação clínica; e no

artigo 6.º, admite-se a possibilidade de intervirem outros médicos especialistas (psiquiatras) e psicólogos aptos

a avaliarem a condição psicológica do doente.

Embora não constando do n.º 1 do artigo 2.º, e servindo um propósito primacialmente procedimental, estas

disposições não deixam de assegurar que algumas informações, relevantes para a verificação do

preenchimento em concreto dos pressupostos constantes da previsão daquele preceito, seguramente constam

do processo: entre estas destacam-se, pela sua relevância, o historial clínico do doente e o juízo de prognose

sobre a expectável evolução da sua condição física.

Apesar de impor, como etapa procedimental insuperável, exercícios de retrospeção e de prognose que se

encontram ao serviço de uma análise dinâmica do historial clínico do doente e da densificação de

qualificações como definitiva, incurável e fatal, o Decreto n.º 109/XIV abstém-se de fazer constar do regime um

elenco de definições (análogo, v.g., ao que consta da base II da Lei de Bases dos Cuidados Paliativos – Lei n.º

52/2012, de 5 de setembro – ou semelhante ao que é previsto no artigo 3.º da proposicion de Ley orgánica de

regulación de la eutanasia recentemente aprovada em Espanha). Ademais, aquele Decreto diverge de opções

adotadas em outros países, ao não fazer constar da norma exigências como o «carácter duradouro, constante,

permanente ou insuscetível de ser aliviado» do sofrimento sentido (presente na legislação belga e

luxemburguesa, por exemplo) ou a «ausência de perspetivas de melhoria» (presente, v.g., na legislação