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II SÉRIE-A — NÚMERO 138

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decisões devem ser confrontadas. Os atos voluntários são normalmente ao nível individual, mas são a expressão

de atos de coerção coletiva, de atos de injustiça social coletiva tremenda. A sociedade cria situações em que

uma jovem ou um jovem não tem outra possibilidade de criar um rendimento para si ou para a sua família senão

prostitui-se.»

Importa acrescentar, ainda, que ao contrário do que tinha sido anunciado, a regulamentação da prostituição

não contribuiu para uma maior proteção da mulher na prostituição e para a diminuição da violência e do estigma

associado. Os relatos de sobreviventes prostituídas nesses países dão conta da enorme violência a que foram

sujeitas em bordéis. Mais, estes testemunhos demonstram que a situação das mulheres não só não melhorou

com a regulamentação, como ainda se agravou em determinados casos.

Sabrinna Valisce, uma sobrevivente da prostituição e agora defensora do modelo da igualdade, que esteve

envolvida na campanha para descriminalizar o comércio sexual na Nova Zelândia, testemunhou que «Pensei

que iria dar mais poder e direitos às mulheres, mas depressa me apercebi que o contrário era verdade». De

acordo com o seu relato, Valisce considera que este regime beneficiou os compradores de sexo e proprietários

de bordéis, mas não as mulheres, na medida em que o que costumava ser visto como violência sexual passou

a ser considerado como um risco profissional quando tais crimes são perpetrados por compradores de sexo e

proxenetas em estabelecimentos licenciados74. Sabrinna Valisce, disse, ainda, que ao contrário do que foi

prometido pelo lobby pro-regulamentação, a violência sexual dos compradores de sexo aumentou na Nova

Zelândia após a alteração da lei em 2003, acrescentando que «nunca ninguém lhe disse ‘Eu paguei pelo teu

corpo e posso fazer o que eu quiser’ até à descriminalização»75.

Como bem refere Pedro Vaz Patto76, «a ocorrência de episódios de violência física ou psicológica aumenta

com a legalização da prostituição. Se essa violência é estrutural (e não ocasional), e se a legalização se traduz

no incremento da prostituição, não pode esta deixar de se traduzir no aumento dessa violência».

E tal é comprovado pelos dados disponíveis sobre assassinatos de mulheres na prostituição. Entre 2002 e

2018, pelo menos 91 mulheres prostituídas morreram na Alemanha vítimas de proxenetas ou compradores de

sexo, e 48 sofreram tentativas de homicídio. Nos Países Baixos, até 2013 tinham sido mortas pelo menos 127

mulheres. Na Suécia, que adotou o modelo da igualdade em 1999, regista-se 1 morte que, contudo, foi

perpetrada por um ex-companheiro, e não por um comprador de sexo77.

Ainda, Sabrinna Valisce, ouvida em audiência na Assembleia da República, na Comissão de Assuntos

Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, na Subcomissão para a Igualdade e Não-Discriminação, a

propósito do enquadramento legal da prostituição na Nova Zelândia78, demonstrou claramente as falhas do

modelo da descriminalização.

No que diz respeito à violência e ao estigma, Sabrinna destacou que, ao contrário do que tinha sido

anunciado, os relatórios demonstram que não existe um aumento das queixas de violência, porque normalmente

estas situações são noticiadas e as pessoas não querem ser associadas à prostituição e que o estigma da

prostituição não diminuiu, porque a maior parte das pessoas não quer que a sua mãe, irmã, namorada, melhor

amiga esteja na prostituição. Sabrinna deixa também claro nesta audiência que a legalização ou

descriminalização da prostituição não conduziu a uma maior proteção das mulheres na prostituição, nem a um

reforço dos seus direitos laborais. Refere, assim, que as mulheres na prostituição não são vistas como

trabalhadoras independentes, como deveria ser, mas sim como trabalhadoras subordinadas, não tendo,

contudo, direito a quaisquer benefícios sociais. Dá como exemplo o facto de as mulheres poderem trabalhar até

17 horas, o que para qualquer outra profissão seria ilegal, e não terem direito a pausa para refeição ou descanso.

E a este propósito importa mencionar que, por causa do estigma ou porque encaram a prostituição como algo

meramente temporário, o que se verifica é que as mulheres nestes países não se têm registado para efeitos

fiscais como estando na prostituição, permanecendo na clandestinidade. Dados disponíveis apontam para que

nos Países Baixos apenas 5% das mulheres estão registadas para efeitos fiscais79. Sabrinna menciona,

também, que os proxenetas, para além de ficarem com cerca de 50% dos rendimentos que fazem durante o

turno, ainda cobram taxas de publicidades e multas por infrações, o que retira às mulheres a maior parte do que

74 Cfr. Julie Bindel, The pimping of Prostitucion – Abolishin the sex work myth, 2017. 75 Idem 76 Cfr. Pedro Vaz Patto, O Tratamento jurídico da Prostituição, Brotéria – Cristianismo e Cultura, Outubro de 2008. 77 Pode ser consultado em FACT: Prostitution is inherently violent – Nordic Model Now!. 78 https://canal.parlamento.pt/h264.html?cid=3233&title=audiencia-sobre-o-enquadramento-legal-da-prostituicao-na-nova-zelandia. 79 Cfr. Julie Bindel, The pimping of Prostitucion – Abolishin the sex work myth, 2017.