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II SÉRIE-A — NÚMERO 186

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PROJETO DE LEI N.º 671/XV/1.ª

CONSAGRA OS CRIMES DE VIOLAÇÃO, DE COAÇÃO SEXUAL E DE ABUSO SEXUAL DE PESSOA

INCAPAZ DE RESISTÊNCIA COMO CRIMES PÚBLICOS

Os crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual estão envoltos num silêncio ensurdecedor e,

segundo a Associação Portuguesa de Apoio à Vítima (APAV), o escasso número de denúncias tem origem na

existência de vários obstáculos à revelação destes casos.

Dentro destes, identificamos entraves culturais como «o facto de estarmos perante um núcleo tão delicado

da intimidade pessoal, o medo de ser desacreditado ou desacreditada pelo sistema judicial, pelas estruturas de

apoio e até pela própria família, a desvalorização social da violência sexual, frequentemente ligada a uma

culpabilização da própria vítima ou desresponsabilização parcial do agressor e o facto de, muitas vezes, o crime

ocorrer no seio de uma relação de intimidade ou proximidade familiar», de acordo com a APAV.

A Iniciativa Liberal reconhece a existência de um problema no que concerne a crimes sexuais e, como tal,

apresentou na Legislatura passada um projeto de lei com a finalidade de qualificar como crime público os crimes

de violação, de coação sexual e de abuso sexual de pessoa incapaz de resistência.

Contudo, a Iniciativa Liberal, a par da intervenção legislativa ora proposta, não deixa de encarar como

necessária a implementação de medidas multidisciplinares, nomeadamente de aumento do apoio psicológico

às vítimas e a sensibilização e formação das forças e serviços de segurança, bem como dos magistrados.

Da discussão do referido projeto de lei foi igualmente reconhecida pelos restantes partidos, mesmo pelos

que rejeitaram as linhas gerais do projeto, a necessidade de se ir mais além na prossecução da justiça e na

proteção das vítimas de crimes sexuais.

Volvido o término da XIV Legislatura sem que fosse aprovada a modificação do Código Penal no sentido

proposto e uma vez verificado que os pressupostos subjacentes à proposta se mantiveram inalterados, a

Iniciativa Liberal retoma agora a apresentação do projeto de lei de igual finalidade, com o objetivo de consagrar

os crimes de violação, coação sexual e abuso sexual de pessoa incapaz de resistência como crimes de natureza

pública e garantir, ao mesmo tempo, à vítima, a faculdade de requerer a suspensão provisória do processo, de

forma livre e informada.

A necessidade de intervenção legislativa sustenta-se nos dados do Relatório Anual de Segurança Interna

relativo ao ano de 2021 que, em comparação com o ano de 2020, regista um aumento de 26 % de participações

do crime de violação. Não podemos esquecer que estes dados são apenas relativos a crimes que são

participados, dada a atual natureza semipública do crime.

Por outro lado, é inegável que a reprovação social deste crime tem vindo a aumentar, sendo prova disso as

107 236 assinaturas da petição que pretende qualificar o crime de violação como crime público, o que é revelador

da importância crescente que a sociedade atribui a esta criminalidade.

Os crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual são crimes onde as relações de poder têm grande

relevância, abstendo-se a vítima frequentemente de denunciar o crime pelo facto de o agressor ser muitas vezes

seu familiar ou conhecido próximo. Tal como nas situações de violência doméstica, estes são casos onde a

proteção dos mais vulneráveis deve ter um peso acrescido, nomeadamente no enquadramento de estratégias

para a melhor investigação destes crimes, para que não fiquem crimes por investigar.

Por estes motivos, a Iniciativa Liberal propõe que os crimes de violação, coação sexual e abuso sexual de

pessoa incapaz de resistência passem a ser de natureza pública, garantindo, ao mesmo tempo, à vítima, a

faculdade de requerer a suspensão provisória do processo, de forma livre e informada.

A atribuição de natureza pública a estes crimes facilitaria o desbloqueio de várias situações e levaria a um

maior número de denúncias, uma vez que não dependeria apenas da vítima a participação destes crimes e o

necessário impulso processual.

Esta alteração da natureza do crime não nega que nestes crimes seja afetada, severa e gravemente, a esfera

de intimidade da vítima, mas, antes, reconhece que é necessário que sejam compatibilizadas a necessidade de

evitar a possível vitimização processual da vítima do crime e a necessidade de assegurar que o processo não é

bloqueado por receio de repercussões ou de falta de apoio por parte da sociedade e, em particular, das

entidades públicas.

Igualmente, propõe-se a revogação dos n.os 4 e 5 do artigo 178.º do Código Penal, relativos à suspensão