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20 DE ABRIL DE 2023

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na preservação das membranas.

Do ponto de vista energético, a desvantagem dos combustíveis fósseis é facilmente ultrapassável com o

emprego de energias renováveis. Mais ainda num País como Portugal, onde as condições climatéricas são muito

favoráveis ao emprego destas energias, pelo que esta possibilidade deve ser encarada no estudo e

desenvolvimento das centrais portuguesas, admitindo que poderá mesmo ser um fator determinante na sua

viabilização. Pode-se admitir também uma fase intermédia em que o gás natural desempenha um papel

complementar em relação às fontes renováveis, que são, por si só, uma fonte altamente competitiva de

eletricidade cujo problema seria, por agora, a sua incapacidade de conferir estabilidade no abastecimento

elétrico das centrais, embora este fator possa vir a mudar num futuro próximo.

Quanto à salmoura, o resíduo é diluído e depois disperso pelo mar, de modo a minimizar o seu impacto

ambiental. O tratamento das salmouras precisará de uma avaliação ambiental cuidadosa que permita a

mitigação dos seus potenciais efeitos negativos e proteja, tanto quanto possível, o mar português. Para isso,

pode tomar-se em conta quatro fatores: primeiro, o oceano Atlântico, tendo uma temperatura e teor de sal

menores que o mar Mediterrâneo, levará a uma produção menor de salmouras em relação a muitas das outras

experiências conhecidas; segundo, o oceano Atlântico, com a sua profundidade e correntes fortes, facilita a

dispersão das salmouras na devolução ao mar, devendo ser assegurado que não se concentram de tal modo a

que possam vir a prejudicar a biodiversidade, como tem ocorrido no caso de sucesso da central de Porto Santo;

terceiro, há ainda a possibilidade, na eventualidade de se construírem unidades mais pequenas, de se integrar

as descargas de salmoura no próprio circuito de gestão de águas residuais; quarto, há já vários usos da salmoura

para fins industriais e projetos em curso, uns mais maduros que outros, que pretendem aproveitar os metais

presentes no próprio sal, como o magnésio, o potássio ou o lítio, introduzindo mais circularidade no circuito da

dessalinização, ou mesmo em aplicações de agricultura, aquicultura e até energia; e quinto, há cada vez melhor

tecnologia, como combinações entre eletrodiálise e tecnologia de ultrassons que mantém as membranas limpas

de uma forma muito mais eficiente.

O tema da dessalinização não é, contudo, novo em Portugal. A ilha de Porto Santo construiu a primeira e

única central de dessalinização do país, a primeira da Europa, inaugurada ainda em 1980, da qual hoje depende

inteiramente para assegurar o seu abastecimento de água. Aquele que foi um enorme caso de sucesso em

Portugal não foi encarado, no entanto, como algo a replicar no território continental até recentemente. Os

primeiros sinais de inversão desta estagnação nas políticas públicas da água em Portugal – apesar do

conhecimento bem sedimentado sobre os desafios que o abastecimento de água enfrenta – estão presentes no

recente Plano Regional de Eficiência Hídrica do Algarve, criado ao abrigo do Despacho n.º 443/2020, de 14 de

janeiro, que já previa, na alínea d) do n.º 1 do mesmo, a «Identificação de soluções estruturais e novas origens

de água que complementem o previsível decréscimo do recurso por via das alterações climáticas». O próprio

Plano adota, ainda assim, uma linguagem incerta acerca da necessidade de uma central dessalinizadora,

remetendo a decisão para um «Estudo prévio para avaliação da viabilidade ambiental e de sustentabilidade

hídrica de aumento da capacidade de armazenamento de água», como detalha a Medida Inf_01_Alg, no âmbito

da qual estão destinados 200 milhões do PRR, ao abrigo da medida RE-C09-i0.

No entanto, este investimento de apenas uma central dessalinizadora no Algarve será manifestamente

insuficiente para sustentar um salto qualitativo na disponibilidade de água nas regiões mais afetadas do País.

De facto, no mesmo dia em que foi publicado o Despacho n.º 443/2020, foi também publicado um outro, o

Despacho n.º 444/2020, prevendo um plano equivalente para a região do Alentejo. O qual, ao contrário do plano

do Algarve, não chegou ainda a ser publicado, não só atrasando toda a base de discussão sobre as opções a

tomar para a região, como inviabilizando a possibilidade de vir a beneficiar de verbas do PRR.

É, por isso, urgente que este plano seja rapidamente delineado, aprovado e publicado. Deste modo, poderá

avançar-se definitivamente com a possibilidade da construção de uma, se não mais, centrais dessalinizadoras

no litoral alentejano, possivelmente por via da abertura de um concurso público internacional, atraindo grandes

investidores para o setor hídrico português, pelo que o emprego de parcerias público-privadas na construção e

na gestão das centrais deve ser uma hipótese, conforme tem sido prática no setor.

As soluções de dessalinização já têm vindo tarde, estando retidas num emaranhado burocrático que contribui

para o adiamento do desenvolvimento deste tipo de soluções em Portugal, cuja necessidade de implementação

já seria previsível há décadas. As hesitações numa aposta estratégica no aumento da oferta de água não são

compreensíveis face às necessidades urgentes da economia portuguesa, que poderia ser mais competitiva nos