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II SÉRIE-A — NÚMERO 209

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Mas considerando a prevalência de 11 % do consumo doméstico na procura de água em Portugal – que tem

vindo a crescer nas últimas décadas – nenhum dos cenários atualmente projetados contempla a possibilidade

de falta estrutural de água nas torneiras dos portugueses, caso sejam feitos os investimentos nas infraestruturas

e gestão necessários à cobertura do abastecimento em todo o País.

No entanto, o decrescimento estrutural da oferta de água pode ser entendido não só como um teto sobre o

crescimento económico português, que fica limitado nos seus setores agrícola e turístico, mas como um enorme

desafio para a coesão territorial do País, dada a longa tendência de depressão demográfica e económica de

todo o seu interior, onde a agricultura e o turismo podem fazer derradeiramente a diferença.

A dinamização do interior, senão mesmo a sua integração plena na economia portuguesa, como um território

de oportunidades, que garante qualidade de vida e rendimentos equiparáveis aos que encontramos no litoral,

passa, necessariamente, por uma estratégia de dinamização económica que crie as condições infraestruturais

que a permitam: passando por uma maior abertura ao investimento, pelos transportes, pelo acesso à energia e

pela oferta de água, sem prejuízo de outras questões ainda por resolver, como a da gestão das florestas, cujo

potencial económico permanece por explorar.

Muitas das soluções que têm constado no debate público em torno da água terão um papel fundamental na

resolução do problema em Portugal. A diminuição do desperdício e reutilização de águas residuais para diversos

fins, a recarga de aquíferos, a reutilização de águas cinzentas nas habitações e a melhoria da eficiência hídrica

do setor agrícola, que, na sua maioria, ainda não contabiliza os seus gastos de água, terão um papel importante

na resolução do problema, e a Iniciativa Liberal tem apoiado todas as propostas neste sentido. No entanto, é

necessário um salto qualitativo nas infraestruturas hídricas portuguesas, o que passa por um aumento da oferta

de água que assegure tanto o abastecimento das populações como a competitividade económica.

Uma das principais vias através das quais é possível expandir consideravelmente a oferta de água em

Portugal é a do emprego de tecnologias de dessalinização. A dessalinização consiste no processo de retirar sais

e outros minerais da água salgada, comumente feita por uma de duas vias: ou a da osmose inversa, a mais

habitual, que consiste na passagem de água salgada por membranas que filtram por vários níveis o sal da água,

ou da dessalinização térmica, que ferve, evapora e torna a condensar a água sem o sal. Da água que entra na

central sensivelmente metade, consoante a eficiência tecnológica, transforma-se em água dessalinizada. O

processo serve para gerar água potável e pode também gerar água salobra – nível de salinidade intermédio

entre a da água doce e a da água salgada – que pode ser utilizada, por exemplo, na rega.

A dessalinização representa uma oportunidade de expansão da oferta de água em Portugal enquanto se

evita o esgotamento dos recursos hídricos existentes. A tecnologia tem-se espalhado depressa, sobretudo no

Médio Oriente e na Ásia. Um estudo elaborado pelos investigadores do Instituto para a Água, Meio Ambiente e

Saúde da Universidade das Nações Unidas, em 2019, indicou que no mundo havia cerca de 16 mil unidades de

dessalinização em operação, distribuídas por 177 países.

Aqui ao lado, Espanha é um dos países no mundo que mais cedo começou a investir na dessalinização.

Hoje, é um dos líderes mundiais na exportação de know-how de dessalinização, concentrando em si mais de

metade das centrais da Europa, cujo número ascende às 765 no seu território, produzindo mais de 4,5 milhões

de metros cúbicos de água por dia. Portugal encontra-se na situação oposta: altamente dependente de rios com

a sua nascente em Espanha, sem capacidade própria de aumento da oferta que não pelo aumento da

circularidade, acabando por navegar ao sabor da situação hídrica espanhola e das suas consequências

económicas no país, que depressa pode repercutir-se negativamente sobre a portuguesa.

Um dos casos mais paradigmáticos e bem-documentados é o de Israel, cujos sucessos estão descritos no

Relatório de 2017 do Banco Mundial, «Water Management in Israel», onde uma combinação de fortes

investimentos na circularidade do abastecimento e de dessalinização de água do mediterrâneo permitiram

inverter a situação de um país que, sofrendo outrora com uma das mais graves situações de escassez hídrica

do mundo, não só beneficia agora de um setor agrícola pujante, como é um exportador de água – pelo que

entretanto toda a região do Médio Oriente emprega abundantemente a tecnologia.

A dessalinização não vem sem desvantagens, como é o caso de qualquer tecnologia. Trata-se de um

processo de alta intensidade energética que tradicionalmente beneficiou do uso de combustíveis fósseis,

produzindo também resíduos como a salmoura que podem trazer dificuldades à preservação da biodiversidade.

A salmoura é um resíduo que consiste numa solução de água saturada de sal, resultante do processo de

dessalinização, e pode conter químicos, alguns potencialmente tóxicos, utilizados no pré-tratamento da água ou