O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

13 DE SETEMBRO DE 2024

139

sobre o projeto de ampliação da mina do Barroso, levada a cabo em 2023, 879 foram de discordância e

contestação e apenas 15 de concordância. O próprio relatório da consulta pública indica que «os 15 cidadãos

que concordam com a reformulação do projeto não apresentam nenhuma fundamentação que sustente a sua

concordância»15.

Também o Turismo de Portugal se posicionou contra a ampliação da mina do Barroso, assegurando que o

projeto tem impactos que entram em conflito com a atividade turística, de que a região também depende. Diz

ainda que importa garantir que este projeto não seja suscetível de colocar em risco o reconhecimento, pela

UNESCO, da Reserva da Biosfera Transfronteiriça de Gerês/Xurés que integra a Rede Mundial de Reservas

da Biosfera da UNESCO e que tem por objetivo a conservação de paisagens, ecossistemas e espécies, e o

desenvolvimento sustentável a nível social, económico, cultural e ecológico.

A organização não governamental e ambiental Quercus chegou mesmo a apresentar uma denúncia à

UNESCO de «ameaça severa à integridade do sistema agro-silvo-pastoril da região do Barroso»16, pedindo

que esta entidade se pronuncie sobre a manutenção da classificação como Património Agrícola Mundial, caso

a instalação da mina venha a concretizar-se. Esta parece ser, de resto, a conclusão do TUA, que afirma que o

conjunto das afetações diretas e indiretas mencionadas, incluindo os impactos residuais, juntamente com os

potenciais impactos cumulativos decorrentes da elevada pressão de projetos sobre a área de estudo, pode

comprometer a classificação de Património Agrícola Mundial atribuída ao Barroso pela FAO17. Além disso,

considera que não há compatibilidade ou possibilidade significativa de integração paisagística deste projeto no

território, especialmente considerando a sua classificação como sítio GIAHS18.

A população tem-se desdobrado em esforços para deixar claro que estes projetos não têm a necessária

licença social. A mina do Barroso é alvo de quatro processos judiciais e a empresa detentora dos direitos de

prospeção, a britânica Savannah Resources, não tem acesso a mais de 70 % da área de concessão porque os

compartes dos baldios unanimemente lhe recusam a entrada. A pressão, sob as mais variadas formas, que

tem sido exercida por esta empresa e seus representantes sobre as populações, incluindo as ações que tem

movido em tribunal, as ameaças de expropriações e a usurpação de áreas aos terrenos baldios são apenas

exemplos da violação do direito à autodeterminação do povo do Barroso, cuja luta é tão paradigmática que

chegou ao Festival de Cannes este ano, com a estreia do filme A Savana e a Montanha19.

O relatório do Relator Especial das Nações Unidas para os Direitos Humanos e Ambiente, David R. Boyd,

publicado no início de 2023, é uma peça fundamental neste assunto e vale realmente a pena relembrá-lo. Ao

longo de quase dez pontos dedicados à sua passagem por Covas do Barroso, o relator refere que «Portugal

merece crédito por liderar o mundo no reconhecimento do direito a um ambiente saudável, acabando com o

uso do carvão, acelerando rapidamente a produção de energia renovável e rejeitando, por lei, o

desenvolvimento de petróleo e gás offshore em todo o País, incluindo perto do Algarve. Seria difícil conciliar

esse histórico de liderança com a aprovação de uma enorme mina a céu aberto numa comunidade que é um

exemplo globalmente reconhecido de desenvolvimento sustentável»20.

O relator prossegue dizendo que os defensores da mina tentam justificar o projeto argumentando que o lítio

europeu é essencial para a transição energética verde na Europa. Embora isso possa ter alguma validade,

grandes projetos de extração de recursos que violam os direitos humanos em nome da transição verde são

diametralmente opostos aos princípios do desenvolvimento sustentável. Conclui reforçando que, embora

Portugal tenha reforçado os seus padrões para a indústria de mineração nos últimos anos, a estrutura

regulatória atual pode não ser suficiente para garantir a proteção de áreas únicas como o Barroso.

A realidade é que a transição ecológica, de que urgentemente necessitamos, não pode ser feita à custa do

sacrifício de modos de vida sustentáveis e que sempre se harmonizaram com a natureza. A crise climática não

pode ser combatida aumentando a degradação de florestas, montanhas, solo fértil, água e os mais

elementares direitos humanos, de ocupação do território e de autodeterminação.

A transição para um modelo assente em energias renováveis requer, entre outras coisas, uma aposta em

baterias e em dispositivos de armazenamento. Por isso, a área da inovação em baterias e equipamentos

elétricos encerra sem dúvida um enorme potencial. No entanto, a taxa de reciclagem de baterias de lítio em

15 Relatório de consulta pública – Avaliação de impacte ambiental n.º 3353 – Ampliação da mina do Barroso, pág. 63.16 https://www.dn.pt/lusa/quercus-denuncia-a-unesco-ameaca-severa-no-barroso-por-causa-do-litio-11007280.html/. 17 Título Único Ambiental do projeto de ampliação da mina do Barroso, pág. 15. 18 Globally Important Agricultural Heritage Systems. 19 https://www.rtp.pt/noticias/cultura/a-luta-de-covas-do-barroso-chega-a-cannes-num-filme-de-paulo-carneiro_n1570910. 20 https://documents.un.org/symbol-explorer?s=A/HRC/52/33/ADD.1&i=A/HRC/52/33/ADD.1_3667359, pág. 16.