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24 DE ABRIL DE 1993

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realidade social, económica e política do País e uma ampla base de referências relativas ao seu posicionamento no contexto internacional, bem como sobre a realidade política, económica e social dos seus parceiros no concerto das nações.

A necessidade desse conhecimento implica, necessariamente, alguma margem de penetração nas estruturas e grupos sociais para correcta percepção do senüdo das respectivas movimentações.

E é, fundamentalmente, neste domínio que maior sensibilidade assume o confronto entre a necessidade de informação (para defesa de interesses que se prendem com a sobrevivência e prestígio do Estado e com a defesa das instituições democráticas) e a esfera de liberdade e privacidade asseguradas pela Constituição e pela lei ordinária aos cidadãos e às estruturas associativas por estes legalmente constituídas.

Em nosso entender, os limites terão de ser estabelecidos, desde logo, por referência às atribuições dos serviços, tal como oportunamente se apontou.

Neste contexto, estar-lhes-á vedada a prática de acções que transcendam os fins que lhes estão legalmente apontados.

Numa segunda linha e em conexão com a primeira limitação, é possível configurar limites decorrentes da natureza de serviço público que lhes é inerente, aliada à especificidade da actividade que desenvolvem.

Esta segunda limitação impõe a definição de critérios de actuação que tenham por referencial a necessidade, adequação e pertinência dos dados a recolher relativamente aos objectivos de informação visados.

Finalmente aponta-se um terceiro limite que tem de ser estabelecido por referência à esfera da privacidade que o legislador constitucional e ordinário entenderam dever salvaguardar 19.

A Constituição consagra, no artigo 26.° e no capítulo dos direitos fundamentais, o direito à reserva da intimidade da vida particular e estabelece, no artigo 35.°, o quadro de base de protecção, face à informática, de dados referentes à vida privada.

São conhecidas as dificuldades na definição do conteúdo do conceito de intimidade da vida privada, bem com o a insuficiência da elaboração doutrinária e jurisprudencial sobre o assunto produzida.

O Código Civil tem funcionado como precioso auxiliar na delimitação daquele conceito, apontando critérios a atender na determinação da respectiva extensão — n.° 2 do artigo 80.° do diploma citado.

Tais critérios apontam para a ponderação das circunstâncias do caso e da qualidade do titular do direito, como factores relevantes na definição da esfera de protecção. É, assim, unanimemente admitida uma redução da esfera de intimidade das figuras públicas, em nome do reconhecimento de um legítimo interesse colectivo no conhecimento de factos que, em circunstâncias normais, caberiam no domínio da privacidade tutelada; é igualmente

í9 O reconhecimento de que a intimidade da vida privada era uma das áreas mais susceptíveis de ameaça pela actividade dos serviços de informações determinou que à proposta de lei n." 55/111, na qual teve origem a Lei n.° 30/84, fosse aditada uma disposição prevendo o agravamento da pena dos funcionários ou agentes dos serviços de informações que venham a ser condenados pela prática de crime contra reserva da vida privada ou contra a honra. Mais tarde, viria a ser aditada à honra e à vida privada a liberdade. — Cf. n.°2 do anigo 30° da Lei n.° 30/84.

admitida uma redução da esfera da intimidade relativamente a ocorrências públicas e a factos que tenham lugar em locais públicos20-21.

Da primeira das delimitações estabelecidas não pode, contudo, resultar a possibilidade de invasão de todos os domínios da vida das figuras públicas.

A garantia constitucional de respeito pela vida privada e familiar aplica-se à generalidade dos cidadãos, embora com limites distintos.

O que traçará, aqui, a fronteira entre a intromissão permitida e a proibida será a natureza e relevância do interesse que lhe subjaz.

O Código Penal estatui a aplicação de penas de prisão para quem, com a intenção ou o propósito de devassar a intimidade da vida de outrem:

Divulgar factos ou circunstâncias a esta pertinentes, designadamente relativos à intimidade da vida familiar ou sexual ou a doenças graves — artigo 178°, n.° 1;

Interceptar, escutar, registar, utilizar, transmitir ou divulgar, sem o consentimento de quem nela participe, qualquer conversa ou comunicação particular— artigo 180.°,n.° 1, alínea a);

Observar às ocultas as pessoas que se encontrem em lugar privado — artigo 180.°, n.° 1, alínea c).

Independentemente do âmbito da esfera de intimidade, a lei penal prevê e pune vários outros comportamentos reputados como lesivos do direito à intimidade da vida privada.

O Código Penal, no capítulo vi e sob a epígrafe «Dos crimes contra a reserva da vida privada», elenca aqueles e todo um conjunto de comportamentos, tipificados como criminosos, por atentarem contra aquele direito.

Relativamente a alguns desses tipos, o legislador penal mais não fez do que dar execução a normas constitucionais que lhe impunham a adopção de medidas penais de protecção de direitos fundamentais.

De facto, o artigo 26.° da Constituição, depois de, no n.° 1, a todos reconhecer o direito ao bom nome e reputação, à imagem, à palavra e à reserva da intimidade da vida privada e familiar, proclama, no n.° 2, que:

A lei estabelecerá garantias efectivas contra a utilização abusiva, ou contrária à dignidade humana de informações relativas às pessoas e famílias.

A existência dos tipos legais acima indicados, bem como dos artigos 176.°, 177.°, 179.°, 181.° e 182.°, que contêm a descrição dos ilícitos de introdução em lugar vedado ao público, gravações e fotografias ilícitas, devassas por meio de informática e violação do segredo de correspondência e telecomunicação, traduz a concretização de medidas de protecção de intimidade da vida privada; impõe, por outro lado, à generalidade dos cidadãos, uma atitude de abstenção relativamente aos comportamentos neles descritos.

20 Rita Amaral Cabral, O Direito à Intimidade da Vida Privada, separata dos Estudos em Memória do Pmf. Doutor Paulo Cunha, Lisboa, 1988.

J1 Sobre esta matéria, cf. também o parecer n.° 121/80 do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República, in Boletim do Ministério da Justiça, n." 309, p 149.