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II SÉRIE-B — NÚMERO 42

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a reconstruir, para avançarmos, mas não tivemos nenhum caso»195. O resultado foi a não abertura sequer de

candidaturas por parte do município.

A Lei n.º 114/2017, a Lei do Orçamento do Estado para 2018, acaba por tratar de forma desigual os cidadãos

que foram lesados da mesma maneira. «Aí é que penso que o Estado falhou, porque entendo que o cidadão de

Castanheira de Pêra, que foi prejudicado e que tem uma segunda habitação, deveria ter o mesmo direito a ser

apoiado na mesma medida em que o é o cidadão de Pedrógão, o da Pampilhosa da Serra, o de Figueiró dos

Vinhos e por aí além. Aí é que existe um acentuar de desigualdades, com as quais não concordo»196, defende

Fernando Lopes, ex-Presidente da Câmara de Castanheira de Pêra. Para o autarca, resulta claro que não

deviam ser as autarquias a suportar o apoio às segundas habitações.

O desconforto em relação aos apoios à reconstrução das segundas habitações é um dos pontos dominantes

das audições de autarcas, cidadãos e representantes de associações de vítimas.

Outra abordagem que acabou por se fazer, de forma recorrente, nas diferentes audições, passou pela

averiguação de até que ponto existe, na população afetada pelos incêndios, uma perceção de estigmatização

negativa da sociedade, causado pela cobertura mediática pejorativa associada a alguns processos de

reconstrução de habitações que ainda estão a ser tratados em foro judicial. Acusações de burlas, fraudes e más

condutas de alguns casos que poderão ter manchado a reputação das vítimas dos incêndios, associando-as a

comportamentos abusivos ou oportunistas.

É, aliás, fundamental, que resulte clara a noção de que deste relatório não resultarão avaliações ou

recomendações relativas a comportamentos individuais ou coletivos, que não os assumidos pelo Estado. Por

isso, a relevância desta abordagem de perceção circunscreve-se apenas ao apuramento factual do

desenvolvimento dos trabalhos. E, pela sua preponderância nas sucessivas audições, não poderia deixar de ser

referida.

Assim, compreendemos, pelos testemunhos dos depoentes associados ao município de Pedrógão Grande,

que existe a perceção de que há um olhar negativamente enviesado em relação ao caráter dos pedroguenses197,

que obviamente não foi nem se pretendeu nunca que fosse comprovado, nem sobre ele foi tecido qualquer juízo

de valor.

Não podemos concluir, contudo, que essa seja uma perceção generalizada, na medida em que os depoentes

dos outros municípios ouvido em comissão não corroboram essa visão198. Pelo contrário, apelam a que não se

deixe de falar na tragédia, para que o território não seja esquecido. «Temos esperança de que muitas das

promessas venham a ser cumpridas e que não haja um efetivo esquecimento daquelas populações, porque, na

realidade, nós não somos muitos, mas queremos continuar a viver lá»199.

Sublinhe-se que não cabe, neste relatório, qualquer referência a eventuais situações fraudulentas, que

tenham sido ou estejam a ser objeto de investigação.

Relativamente ao processo de identificação e seleção das casas a intervencionar, em todos os casos,

registou um grande envolvimento das autarquias que, após validação, remetiam os processos de candidatura

para a CCDR Centro. A intervenção autárquica nesse processo deu-se, contudo, apenas ao nível dos

presidentes de câmara ou representantes por eles designados, não se tendo verificado o envolvimento dos

presidentes das juntas de freguesia ou união de freguesias, ou de elementos da sociedade civil.

4.4 Fiscalização

Segundo o Artigo 36.º do Regulamento do Fundo REVITA, cabe à comissão técnica garantir a uniformidade

e equidade na atribuição dos apoios, em conformidade com o disposto no Decreto-Lei n.º 81-A/2017, de 7 de

195 Audição a 21 de julho de 2020 – Transcrição 10R, p. 30. 196 Audição a 14 de julho de 2020 – Transcrição 7R, p. 43. 197 Nádia Piazza, em audição a 16 de setembro de 2020 – Transcrição 19R, p. 32 – «Foi preciso instalar-se um sentimento de crescente revolta, a par e passo com a edificação e conclusão de obras de duvidoso enquadramento enquanto primeiras habitações, no seio da comunidade, para que vozes houvesse e investigações à revelia se fizessem ao terreno. É do senso comum que, nos meios pequenos, as pessoas sentem-se tolhidas nas suas manifestações públicas de descontentamento receosas de represálias». (...) «Para todos nós que cá residimos e demos publicamente a cara por esta região, a vergonha é enorme!» 198 Dina Duarte em audição a 9 de setembro de 2020 – Transcrição 16R, p. 16 e 17 – «“Eu acho que no pós 17 de junho estávamos todos a aprender como é que se poderia ajudar nesta ou naquela situação e como é que a solidariedade dos portugueses poderia ser gerida da melhor forma. Portanto, creio que a melhor homenagem que podemos prestar às 66 vítimas mortais e aos mais de 200 feridos é, efetivamente, isto». 199 Ibidem, p.22.